Pirita

Como anda desocupada, Pirita. Não quer mais saber de colher néctar, nem ajudar suas imãs a cuidar da colmeia. A vida de Pirita é ficar o dia todinho dando fé da vida alheia. Os moradores do jardim estão que não aquentam mais a tagarelice de Pirita.

Certo dia, Pirita já vesga de tanto olhar pra tonte. Resolveu dar uma “passadinha” na casa de Dona Aranha:

– Bom dia, Dona Aranha, ficou sabendo das novas? Você sabia que o percevejo está de caso com a libélula! E que a borboleta...

– Sinto muito, Pirita – atalhou Dona Aranha, mas tenho que terminar de tecer este pijama do meu netinho.

Pirita deu de ombros e saiu resmungando:

– Até parece que só tenho essa costureirinha sem pra conversar, Hun hun!

Pirita foi então à casa da Maria de Bonde:

– Bom dia Dona, Maria de Bonde, você sabe o que eu fiquei sabendo? – falou Pirita com a mão na boca. – Pois é quem diria que o caracol iria se casar com a lesma. Os dois estão numa gosma só. Dizem que...

– Sinto muito, Pirita, mas meu bolo de amora está queimando, até mais.

Pirita arrebitou o nariz e foi à casa de Dona Formiga:

– Bom dia, Dona Formiga. Sabe da maior? Fiquei sabendo que a mariposa se separou do rola-bosta. E sabe por que? Bzzzz Bzzzz – zuniu Pirita no ouvido da formiga. – E o pior! Além de não tomar banho ele...

– Desculpe, Pirita, más tenho que terminar de tricotar este xale da minha filhinha.

Pirita foi embora arremedando:

– Tricotá o xale da minha filhinha... da minha filhinha... Blá! Sem graça.

Então Pirita foi conversar com seu amigo Zé Camaleão, que vivi trepado em um pé de algodão. Ele era o único que gostava de ouvir as histórias de Pirita.

– Pois é, amigo Zé Camaleão, nesta floresta fico sabendo de cada uma...

– Como... o quê... Pirita?

– Você se lembra do finado joão-de-barro? Que era amigado com a Dona cobra?

– Me lembro... Era meu... amigo...

Pois é, todos diziam que ele morreu de infarto. Más, a morte dele não foi morte morrida, foi morte matada.

– E é! – exclamou o camaleão que de tão surpreso chegou a mudar de cor.

– Ela o matou, só pra ficar com a casa!

– Pobre coitado!...

– Bem que eu dizia que àquela mulher era uma víbora. Bem, já vou indo. Vou dar uma "passadinha" lá no jardim pra ver o baile das flores. Até logo, amigo camaleão.

– Até logo, Pirita.

Chegando lá, as flores já ressabiadas falaram:

– Lá vem aquela fofoqueira da Pirita.

Pirita percebendo a desfeita foi até uma bela flor-de-hibisco ali ao lado. Pousou em sua delicada pétala e começou a tagarelar. Depois de muito Zumzum pra cá e Zumzum pra lá. Pirita exclamou:

– Ai, estou morta de fome. Ando tão ocupada que esqueço até de comer.

– Sirva-se à vontade - completou a flor-de-hibisco –,estou com um estoque fresquinho de néctar.

– Ah, que bom! – Exclamou Pirita lambendo os beiços.

– Aproveita e leve um pouco para a sua colmeia. – completou a flor.

– O quê! – Esbravejou Pirita. – Eu voltar pra àquele lugar. Onde não se pode brincar, nem conversar. Aquela gente só pensa em trabalhar... trabalhar!...

– Mas, Pirita a colmeia é a sua casa seu lar.

– Pois eu é que não piso mais lá!

– Agindo assim, Pirita vai acabar te acontecendo o mesmo que seu com a cigarra...

– A cigarra? E o que foi que a danadinha andou aprontando desta vez, hein?

– Não é isso, Pirita ela simplesmente levava uma vida desregrada. Só querendo saber de cantar... e cantar... Não querendo saber de mais nada. As formigas bem que tentaram ajudar mas em vão. Pois a cigarra não ouvia ninguém. Aí, quando chegou o inverno, todos tinha o que comer, porém a cigarra passou frio e fome.

Pirita fez chacota e foi embora dizendo: – Azar da cigarra por ser tão boba!

Enquanto passava por sobre a lagoa. Pirita notou uma pequena joaninha debaixo de um cogumelo. Ela Estava triste e chorosa. Pirita se aproximou:

– O que foi, pequena joaninha, porque está chorando?

A joaninha enxugou os olhos, assoou o nariz e respondeu:

– Estava eu voltando pra casa com minha mãe e minhas irmãs. Aí fiquei entretido brincando com alguns amiguinhos na floresta. Quando dei por mim, tinha me perdido de minha família. Agora não sei mais voltar pra casa. BU Á Á Á!

– Não chore, amiguinho. Vou te ajudar a encontrar a sua casa. Você sabe o endereço?

– Fica bem longe daqui, lá no Vale das Margaridas. Na Rua do Jenipapo. Embaixo do pé de sabugueiro.

E lá foram dois voando por sobre por o jardim. Pirita queria pedir ajuda, mas todos ao vê-la a olhava de rabo-de-olho, começavam a caçoar dela:

– Lá vem a Pirita, a abelhinha abelhuda! – Lá vem a Pirita, a abelhinha abelhuda, Buuuuuu!...

Pirita continuou voando até chegar em um descampado. E lá embaixo viu uma caliandra-do-cerrado. Com seu belo vermelho-rubro, destacando-se entre o cerrado.

– Bom dia, bela flor. Sabe onde fica o vale das margaridas.

– Desculpe, amiga abelhinha, mas não sei onde fica. Por que não pergunta ao velho Girassol, ele é muito sábio, talvez possa te ajudar.

Pirita e a Joaninha foram falar com o velho girassol:

– Olá, amigo girassol.

– O quê! O quê foi?...

– Aqui, embaixo! – acenaram Pirita e a joaninha.

– Ah, aí estão vocês! Desculpe não tê-los vistos. Já estou até com torcicolo de tanto acompanhar o sol. Mas em que posso ajudá-las?

– Estamos procurando o Vale das Margaridas.

– Ah, sei. O Vale das Margaridas. Bem, é só ir por aqui! Pelas sombras dos eucaliptos.

Bem, depois de muitas voadas e paradas para descanso Pirita resfolegou: – Puf Puf! Será que ainda falta muito pra chegarmos?

Nisso pairou ali perto um distinto colibri, usando óculos, camisa, gravata e tudo! Pirita se aproximou e perguntou:

– Olá, seu Colibri. Estamos procurando o Vale das Margaridas. O senhor sabe onde fica? O colibri por ser muito culto e informado, respondeu:

– Pois conheço muito bem, minha cara. É mais ao Norte. Aliás, irei passar por lá agora. Siga-me vou levá-las até lá.

Não demoram muito, e chegaram em uma serra que ficava defronte ao Vale das Margaridas.

– Lá está o vale das margaridas – disse o colibri.

– Obrigada Seu Colibri! – agradeceram.

– Por nada. – respondeu o colibri batendo as asas e sumindo ao longe.

Voaram por sobre a serra, e chegaram ao Vale das Margaridas. Viram um grilo cricrilando sobre um cupinzeiro.

– Olá, amigo grilo. Sabe onde fica A Rua do Jenipapo?

O grilo cricrilou:

– É bem ali... Cri Cri Cri!... É bem ali Cri Cri Cri!...

Chegando à Rua do Jenipapo viram ali, se espichando em um graveto uma lagarta mede-palmo.

– Olá, amiga, lagarta, sabe onde fica a casa de Dona Joaninha?

– A que mora lá embaixo do pé de sabugueiro? – completou a lagarta-mede-palmo. – Pois é bem ali, à distância de uns cem palmos.

Foram até a casa bateram na porta, porém ninguém atendeu. A porta estava trancava à chave. Entraram pela janela, mas para a surpresa de ambos. Não tinha ninguém.

– BU Á Á Á! – pôs-se a chorar a joaninha. – Decerto se mudaram! – BU Á Á Á!

– Não chore, amiguinha, iremos encontrá-los.

Um curiango que estava ali só curiando falou:

– Acaso vocês estão procurando a Dona Joaninha?

– Sim, Senhor Curiango, você sabe onde ela está?

– A última vez que a vi, ela estava a caminho da cidade com suas filhas. Depois disso não voltaram mais. Correm uns boatos por aí, que foi por causa do sumiço de uma de suas filhinhas que se perdeu na floresta. Desde então a coitada anda por este mundo afora procurando.

– Está vendo, amiguinha, elas não se mudaram! Estão na floresta a sua procura. Só temos que voltar e... Ah, não! A floresta é tão grande! Como iremos encontrá-la... Desculpe, pequena joaninha por tudo isso.

– Não precisa se desculpar não, Pirita. Estou muito feliz que você esteja aqui comigo. E também não ligo pro que falam de você não.

Pirita sentiu-se tão bem consigo mesma. Nunca havia recebido um elogio antes. Enquanto voltavam olha só quem apareceu? O Seu colibri que lhes havia ajudado antes.

– Olá, minhas caras. Como estão vocês?

– Pois nem lhe conto, Seu Colibri. Não havia ninguém em casa. Agora estamos aqui. Sem mel e nem cabaça!

– Pois eu acabo de ver Dona Joaninha e suas filhas.

– Onde, Seu Colibri? – perguntou Pirita exaltada.

– No campo das madressilvas. Embaixo do pé do grande carvalho.

– Não tem como nos levar até lá, Seu, Colibri? – indagou Pirita.

– Não posso, pois tenho que levar um recado urgente à fada primavera. Mas é só seguir rumo ao sul, por trás dos arvoredos não tem como errar.

Mesmo estando exausta, Pirita não quis deixar a pequena joaninha em casa sozinha. Temia que algo lhe acontecesse. Foi uma viagem de uma hora até chegarem ao grande carvalho. E ao chegarem no grande carvalho lá estava eles, Dona Joaninha e suas filhinhas. Que encontro feliz! Pirita se emocionou ao ver a pequena joaninha contente nos braços de sua amada família novamente. Dona Joaninha agradeceu muito a bondade de Pirita, pois já estava perdendo as esperanças de encontrar sua querida filhinha. Pois pensara que sua querida filhinha podia ter sido devorada por uma sapo ou outro bicho qualquer. Pirita se despediu e foi embora, satisfeita por ter cumprido tão nobre missão. Atrás de si seguiam os acenos de toda a família joaninha.

Diante disso, Pirita agora estava mudada. Sentia saudades de sua família agora. E não via a hora de voltar para casa também. Pirita ia ter que fazer todo o trajeto de volta sozinha. Más enquanto seguia um imprevisto aconteceu. O céu começara a escurecer, grandes nuvens cinzas se formaram, e uma tempestade começou a cair.

Pirita voava com muito esforço afim de achar um local onde pudesse se abrigar. Até que avistou um buraco em um pé de Guabiraba e entrou ali.

Pirita além de assustada, também ficara meia variada. Aos poucos o dia ia embora, e a noite ia assumindo o lugar. Pirita começou a pensar que nunca mais veria sua família novamente. "Decerto é castigo, por tê-los abandonados." E pôs-se a chorar...

Depois de certo tempo a tempestade por fim cessou. Pirita porém estava tão deprimida que não conseguia nem se mexer. Nisso, passou por ali o Vaga-lume Tem Tem, e ao ver Pirita perguntou:

– Olá, abelhinha, o que faz aqui no escuro chorando?

Pirita com muito esforço respondeu:

– Estou perdida, e agora não consigo voltar para minha casa que fica lá no pé de jequitibá- rosa.

– Pois não precisa mais chorar, amiguinha! Exclamou o Vaga-lume Tem Tem. – Vou te ajudar a chegar em sua casa.

– Então você pode me ajudar? – perguntou Pirita mais animada.

– Claro que posso! – continuou o Vaga-lume Tem Tem. – E não é a primeira vez que ajudo alguém perdido na floresta não. Já ouviu falar na história da cigarra que cantou tanto... tanto... Que não viu à noite chegar. E com isso acabou por ficar perdida na floresta?

– Se conheço! – suspirou Pirita.

– Pois é! Foi eu que a ajudei a chegar em sua casa lá tronco de Ipê.

– Então o que eu tenho que fazer? – perguntou Pirita.

– É só seguir minha luzinha, ué! Que eu a levarei até sua casa.

E lá foi Pirita, seguindo o Vaga-lume Tem Tem que abria caminho por entre a escuridão da noite. Ao passarem por sobre as florestas e montes. Pirita observava as imagens que se descortinava a sua frente: Olhos gigantescos que apareciam e desapareciam. Sons misteriosos ecoando na escuridão.

Como era assustador a floresta à noite!

Bem, não se sabe quanto tempo voaram sob o manto da noite. Até que por fim, avistaram o pé de jequitibá-rosa lá embaixo. Pirita não cabia em si de contente. E que encontro maravilhoso.

– Pirita!!!! – exclamaram todos juntos ao vê-la – Que bom que você voltou!

Pirita pôs-se a abraçar suas irmãzinhas com sorrisos e lágrimas.

– Desde que você desapareceu não se fala em outra coisa aqui na colmeia. Todos querendo saber de você. Principalmente a rainha.

– Oh, minhas queridas, irmãzinhas! – exclamou Pirita emocionada. – Desculpe tê-las causado tanto sofrimento.

Pirita tomou banho de alfazema. Passou baton de própolis, e se apresentou perante a rainha. Pirita contou-lhes tudo que lhe havia acontecido. E todos acabaram chorando inclusive a rainha. Devido a tudo que passara, e por toda a mudança e superação. Pirita foi promovida a abelha campeira, ou seja. Seria responsável pela supervisão dos campos e jardins. Descobrindo novas fontes de néctar e pólen para a colmeia.

Pirita passou a ser vista de outra forma por todos os moradores da floresta. Não era mais uma abelhinha abelhuda e fofoqueira não. Era agora, uma abelha útil e trabalhadeira. As flores quando a via cantavam:

“ Lá vem a Pirita, a abelhinha muito amiga.

Lá vem a Pirita, a abelhinha muito amiga.”

Pirita ia ter também à oportunidade de rever seus amiguinhos. Como a pequena joaninha, o velho girassol, Seu Colibri e muitos outros.

Fim

O melhor de nós, encontra-se dentro de nós. É só deixar desabrochar.