Como a mente funciona - trechos escolhidos

PINKLER, Steve. Como a mente funciona. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

Meus destaques pessoais durante a leitura dessa obra:

1. EQUIPAMENTO PADRÃO

Projetar um robô é uma espécie de tomada de consciência. (p.29)

Só quando os pesquisadores da inteligência artificial tentaram duplicar o bom senso em computadores, a suprema tábula rasa, o enigma veio à tona. (p.25)

A idéia fundamental deste livro é que a mente é um sistema de órgãos de computação, projetados pela seleção natural para resolver os tipos de problemas que nossos ancestrais enfrentavam em sua vida de coletores de alimentos, em especial entender e superar em estratégia os objetos, animais, plantas e outras pessoas. (p.32)

As pessoas acalentam muitas crenças que contradizem suas experiências, mas foram verdadeiras no meio em que se desenvolveram, e se empenham por objetivos que subvertem seu próprio bem-estar, mas foram adaptativos naquele ambiente. (p.43)

A cultura é uma entidade autônoma que concretiza um desejo de perpetuar a si mesma criando expectativas e atribuindo papéis, os quais podem variar arbitrariamente de sociedade para sociedade. (p.56)

"Não existem muitos empregos que verdadeiramente exijam um pênis ou uma vagina, e todas as demais ocupações devem estar ao alcance de qualquer pessoa". (Gloria Steinem) (p.61)

Falácia naturalista: o que acontece na natureza é certo. :-P (p.61)

Assim como muitas espécies, o Homo sapiens é um coisa-ruim. (p.62)

Todas as grandes religiões observam que a vida mental é muitas vezes uma luta entre desejo e consciência. (p.62)

Nossa vida mental é um ruidoso parlamento de facções adversárias. (p.69)

O jogo da ética trata as pessoas (idealizadamente) como agentes equivalentes, sencientes, racionais, e detentores de livre-arbítrio, e suas regras são o cálculo que atribui valor moral ao comportamento por meio da natureza inerente do comportamento ou suas consequencias. (p.66)

O argumento contra a perseguição dos homossexuais não deve ser exposto em termos do "gene gay" ou do "cérebro gay", mas sim em termos do direito das pessoas de praticar atos consensuais sem serem discriminadas ou importunadas. (p.67) ... pois: e se derrubarem a tese do "gene gay", a perseguição será considerada aceitável?

2. MÁQUINAS PENSANTES

Sentenças em língua falada destinam-se à comunicação entre seres sociais impacientes e inteligentes. Eles conseguem a brevidade deixando de fora qualquer informação que o ouvinte possa preencher mentalmente com base no contexto. (p.81)

A computação finalmente desmitificou os termos mentalistas. Crenças são inscrições na memória; desejos são inscrições de objetivos; pensar é computação; percepções são inscrições acionadas por sensores; tentar é executar operações acionadas por um objetivo. (p.91)

A teoria computacional da mente também reabilita de uma vez por todas o infame homúnculo. [...] "sua estação de trabalho certamente contém hordas de gnomozinhos". Falar em homúnculos é indispensável na ciência da computação. Estruturas de dados são lidas, interpretadas, examinadas, reconhecidas e revistas o tempo todo, e as sub-rotinas que fazem isso são descaradamente chamadas "agentes", "demons", "supervisores", "monitores", "intérpretes" e "executivos". (p.91)

Existe uma família de piadas cuja graça depende de o ouvinte entender a diferença [da quantificação de indivíduos]. "A cada 45 segundos, uma pessoa nos EUA sofre uma lesão na cabeça. ... Deus do céu! Pobre sujeito!" :-) [...] Os lógicos apreendem essas distinções com variáveis e quantificadores. [...] Compare, por exemplo, "A cada 45 segundos [existe um x [que sofre uma lesão]]" com "Existe um x [que a cada 45 segundos [sofre uma lesão]]". (p.134-135)

Como é que um livro intitulado "Como a mente funciona" esquiva-se da responsabilidade de explicar de onde vem a sensibilidade? Eu poderia, suponho, invocar a doutrina do positivismo lógico, segundo a qual: se uma afirmação não pode ser comprovada, ela não tem sentido algum. (p.159) [...] O conceito de sensibilidade fundamenta nossa certeza de que a tortura é errada e de que, ao passo que inutilizar um robô é destruição de propriedade, inutilizar uma pessoa é assassinato. (p.161)

3. A VINGANÇA DOS "NERDS"

Uma simulação em computador mostrou a formação do olho, a cada

nível trazendo um nível maior de benefício. :-) (p.177-178)

As atuais asas dos insetos cresceram e se desenvolveram pq ajudavam a controlar o calor, gradualmente conforme o seu tamanho. Em um tamanho médio-grande, serviram também como planadores, e, sendo batidas, serviram como asas! (p.181)

Muitos teóricos perguntam-se o que os analfabetos dos povos coletores de alimentos fazem com sua capacidade para a inteligência abstrata.

Os coletores de alimentos teriam mais razões para fazer a mesma

pergunta com relação aos sedentários modernos. (p.203)

O inferno são os outros, disse Jean-Paul Sartre. Toda criatura social

vive o dilema de auferir os benefícios e arcar com os custos da vida em grupo. Isso cria uma pressão para permanecer com o saldo positivo

tornando-se mais inteligente. (p.207)

Nada na biologia tem sentido se não for à luz da evolução, foi a célebre frase do geneticista Theodosius Dobzhansky. Podemos acrescentar que nada na cultura tem sentido exceto à luz da psicologia. A evolução criou a psicologia, e é assim que ela explica a cultura. A mais importante relígquia dos primeiros humanos é a mente moderna. (p.226)

4. O OLHO DA MENTE

Os autoestereogramas exploram descobertas sobre como enganar o olho. (p.231)

Por que diabos uma incompatibilidade entre visão e gravidade ou entre visão e inércia provocaria, entre todas as coisas, justamente a náusea? [...] Os animais vomitam para expelir toxinas que ingeriram, antes que elas causem mais danos. Muitas toxinas encontradas na natureza atuam sobre o sistema nervoso. [...] "Como você sabe quando foi envenenado?" [...] A gravidade, obviamente, é a mais estável e previsível característica do mundo. [...] A regra seria: se você acha que a gravidade está atuando para cima, você foi envenenado; expulse o resto do veneno, já! (p.283)

Nossa indecisão quanto a esquerda e direita requer uma explicação,

pois um geômetra diria que elas não são diferentes de em-cima/embaixo e na-frente/atrás. A explicação é que as confusões com as imagens no espelho são naturais para um animal bilateralmente simétrico. Uma criatura com simetria perfeita é logicamente incapaz de distinguir entre esquerda e direita. (p.296) UFA! =)

Claramente, uma imagem é diferente de uma experiência da coisa real. [...] Em 1910, uma psicóloga tentou demonstrar que as imagens eram como experiências "muito tênues". [...] Os métodos mais avançados confirmaram o hoje denominado efeito Perky: ter uma imagem mental interfere na visão de detalhes visuais tênues e sutis. [...] Quando as pessoas vêem algumas formas e imaginam outras, às vezes têm dificuldade para lembrar depois quais foram vistas e quais foram imaginadas. (p.307) risco de confundir imaginação com realidade. (p.308)

As imagens são ambíguas, mas os pensamentos, praticamente por definição, não podem ser ambíguos. [...] Se uma imagem mental é usada para representar um pensamento, precisa ser acompanhada por uma legenda, um conjunto de instruções sobre como interpretá-la. (A ambiguidade das imagens passou despercebida aos criadores de interfaces gráficas de computadores. [...] Juro que não consigo lembrar o que supostamente fazem os minúsculos binóculos, conta-gotas e discos de prata. (p.316)

Uma imagem vale mais do que mil palavras, mas isso nem sempre é bom. Em algum ponto entre contemplar e pensar, as imagens precisam dar lugar às ideias. (p.317)

5. BOAS IDÉIAS

O paradoxo de Wallace, a aparente inutilidade evolutiva da inteligência humana, é um problema central da psicologia, da biologia e da visão de mundo científica. (p.319) Prosperar como coletor de alimentos é um problema mais difícil do que fazer cálculos ou jogar xadrez. (p.320)

Somos todos físicos, biólogos, engenheiros, psicólogos e matemáticos intuitivos. (p.321) Desde que o psicólogo suíço Jean Piaget comparou as crianças a pequenos cientistas [...] Essa analogia é razoável até certo ponto. Tanto os cientistas como as crianças precisam entender o mundo, e as crianças são investigadoras curiosas que se empenham em transformar suas observações em generalizações válidas. (p.321)

Fora da escola, obviamente, não tem sentido você desconsiderar o que sabe. [...] O conhecimento que resolve um tipo de problema bem conhecido muitas vezes é irrelevante para qualquer outro problema. [...] Tooby e Cosmides denominam "racionalidade ecológica" a inteligência específica por assunto encontrada em nossa espécie. (p.323)

Nossos cérebros foram moldados para a aptidão, e não para a verdade. Às vezes a verdade é adaptativa, mas às vezes não é. Os conflitos de interesse são inerentes à condição humana, e tendemos a desejar que prevaleça a NOSSA versão da verdade, e não a própria verdade. (p.324) Nenhuma das sociedades de castas hereditárias havia desenvolvido uma tradição de escrever descrições acuradas do passado; em vez de histórias, elas tinham mitos e lendas. (p.325)

Por que o impulso de classificar? (p.325) A mente tem a vantagem da INFERÊNCIA na formação de categorias. (p.326) Seu poder de previsão reside na semelhança: se A compartilha algumas características com B, provavelmente compartilha outras. (p.328) O linguista australiano George Lakoff afirma que categorias puras são ficções, produtos do mau hábito de procurar definições, que herdamos de Aristóteles e do qual agora precisamos nos livrar. Lakoff desafia seus leitores a encontrar uma categoria bem definida no mundo! (p.331) Muitos psicólogos sociais e cognitivos dizem que o amor pelos estereótipos é um BUG em nosso software cognitivo. [...] Suposição de que as pessoas são racistas quando suas redes neurais funcionam mal, ou são privadas de bons exemplos que as treinem. (p.332)

Existem muitos modos de explicar um evento, e uns são melhores do que outros. Mesmo que um dia os neurocientistas decodifiquem todo o diagrama das conexões cerebrais, o comportamento humano é mais bem compreendido quando explicado em termos de crenças e desejos, não em termos de volts e gramas. (p.334)

Aprender envolve mais do que registrar experiências; requer expressar os registros da experiência de modo que eles façam generalizações de maneiras úteis. [...] Objetivos e valores compõem um dos vocabulários nos quais expressamos mentalmente nossas experiências. (p.335) O linguista Leonard Talmy, assim como a maioria dos cientistas cognitivos, acredita que as concepções governam a linguagem, e não vice-versa. (p.340)

Somos todos psicólogos. Analisamos mentes não só para acompanhar as tramas das novelas na televisão, mas para entender as mais simples ações humanas. [...] Nossa mente explica o comportamento das outras pessoas segundo as crenças e desejos que elas têm, pois o comportamento das outras pessoas, de fato, é causado por suas crenças e desejos. (p.349) Os estados mentais são invisíveis e não têm peso. Os filósofos os definem como "uma relação entre uma pessoa e uma proposição". Essa relação é uma atitude como "acredita", "deseja", "espera", "tenciona". A proposição é o conteúdo da crença. (p.349)

Lógica, no sentido técnico, não se refere à racionalidade em geral, mas à inferência da verdade de uma afirmação a partir da verdade de outras afirmações com base apenas na FORMA destas, e não (tanto) no conteúdo. (p.354) A mente parece ter um detector de trapaceiros com uma lógica própria. Quando a lógica clássica e a lógica de detectar trapaceiros coincidem, as pessoas agem como lógicos; quando não coincidem, as pessoas ainda procuram os trapaceiros. (p.357)

O modo de obter a competência matemática é semelhante ao modo de chegar ao Carnegie Hall: prática! (p.361) Os professores de cálculo queixam-se de que os alunos acham essa matéria difícil não porque derivadas e integrais sejam conceitos obscuros - elas não passam de taxa e acumulação -, mas porque [...] a maioria dos estudantes começa o curso sem ter aprendido a álgebra apropriadamente, precisando concentrar nela cada gota de sua energia mental. A matemática é IMPIEDOSAMENTE CUMULATIVA, a começar da contagem de um a dez. (p.362)

Galileu escreveu que "o livro da natureza está escrito na linguagem da matemática; sem a ajuda desta, é impossível compreender uma só palavra dele". [...] Nossa compreensão do mundo físico é mais refinada do que a das crianças porque mesclamos nossas intuições sobre os objetos com nossas intuições numéricas. (p.380)

6. DESVAIRADOS

O problema das emoções não é elas serem forças indomadas ou vestígios de nosso passado animal, e sim terem sido projetadas para propagar cópias dos genes que as constituíram em vez de promover felicidade, sabedoria ou valores morais. (p. 390)

Emoção não é só fugir correndo de um urso. Ela pode ser desencadeada pelo processamento de informações mais complexo de que a mente é capaz [...] Como escreveu Samuel Johnson: "Pode confiar, senhor, quando um homem sabe que será enforcado dentro de uma quinzena, isso concentra sua mente de um modo prodigioso." (p.392)

Lembre-se de que inteligência é o empenho para atingir objetivos em face de obstáculos. Sem objetivos, o próprio conceito de inteligência não tem sentido. [...] Mas de onde vem o objetivo supremo? Nos organismos, ele vem da seleção natural. O cérebro esforça-se para colocar seu dono em circunstâncias como as que levaram seus ancestrais a se reproduzir. [...] No topo da lista, constam objetivos como entender o meio e assegurar a cooperação de outros. (p.393)

O Eclesiastes diz que tudo tem seu tempo determinado e há tempo para todo propósito debaixo do céu. (p.393)

Sobre preferências humanas de habitat, soube-se via um levantamento da sabedoria profissional de jardineiros, fotógrafos e pintores, que as paisagens consideradas mais belas são sósias de uma savana ótima: espaço semi-aberto (não totalmente exposto, o que nos torna vulneráveis, nem com vegetação alta e cerrada demais, o que impede a visão e o movimento), cobertura regular do solo, visões do horizonte, árvores grandes, água, variação nas elevações e vários caminhos possibilitando a saída. (perspectiva e refúgio - ver sem ser visto) [...] O próprio terreno também deve ser legível. Qualquer um que já tenha perdido uma trilha na floresta densa ou assistido a filmes de dunas de areia ou montes de neve em todas as direções conhece o terror de um ambiente sem referencial. (p.397)

Aversões a alimentos são tenazes marcadores étnicos, persistindo muito tempo depois de outras tradições terem sido abandonadas. (p.399) Se as crianças de até dois anos tivessem que aprender o que evitar, então todos os animais seriam palatáveis exceto os poucos que são proibidos. (p.402) Plantas venenosas têm gosto amargo porque tanto a planta como quem quer comê-la têm interesse em que o comedor pare depois da primeira mordida. (p.403) Já os tabus alimentares servem para manter membros mais jovens impedidos de fazer alianças (comilanças) com outras tribos. A tática se perpetua por gerações. (p.406)

"Por que um bebê deixado sozinho em um quarto escuro berra desesperado?". No primeiro ano de vida, os bebês temem os estranhos e a separação, e isso é natural, já que um predador pode facilmente se apoderar de um bebê deixado sem atenção. [...] Com o tempo, as crianças vão dominando seus medos, um a um. Os que restam nos adultos são medos infantis que nunca se dissiparam (como medo de cobras em habitantes das cidades). (p.409)

"desconto míope" / "consumidor racional" / derrotar o nosso comportamento autoderrotador! [...] As pessoas às vezes se comportam como se possuíssem dois eus: um que deseja um corpo esbelto e outro que quer sobremesa. (p.417)

"Negociação" (eu sei que ele sabe que eu só vou aceitar vender por mais do que 20 e que ele só vai comprar por menos que 25...) (431) / Terroristas, raptores, sequestradores de avião e ditadores de países pequenos têm interesse em parecer mentalmente desequilibrados. Ausência de interesse pessoal também é uma vantagem. É quase impossível deter bombardeiros suicidas. (p.433)

Nossas confabulações, não por coincidência, apresentam-nos sob a melhor luz. Centenas de experimentos em psicologia social afirmam isso. De fato, a maioria das pessoas alega ser acima da média em alguma característica positiva. Racionalizam a gabolice procurando um aspecto da característica no qual possam realmente ser bons. / De um modo mais geral, iludimos a nós mesmos com respeito ao quão benévolos e eficazes nós somos. (p.444)

"Redução da dissonância cognitiva": as pessoas inventam uma nova opinião para resolver uma contradição em sua mente. (p.444) A dissonância cognitiva é um sentimento desordenado que decorre da incoerência das próprias crenças da pessoa. [...] As pessoas falsificam suas crenças apenas para eliminar uma contradição com a proposição "Sou correto e estou no comando". [...] Quando é que um comentário negativo melindra, fere, magoa? Quando alguma parte de nós sabe que ele é verdadeiro. (p.445)

7. VALORES FAMILIARES

Existe um número reduzido de enredos na ficção e na produção dramática mundiais, e o estudioso Georges Polti afirma ter relacionado todos. Mais de 80% desses enredos são definidos por adversários (frequentemente assasssinos), por tragédias de família ou de amor ou ambas as coisas. No mundo real, nossas histórias de vida são, em grande parte, histórias de conflitos: os ressentimentos, culpas e rivalidades infligidos pelos pais, irmãos, filhos, cônjuges, amantes, amigos e rivais. (p.449)

Nada diz que a natureza tem de ser boazinha, e o que as pessoas querem fazer não necessariamente é o que elas devem fazer. (p.451)

As famílias são importantes em todas as sociedades, e seu núcleo é a mãe e seus filhos biológicos. Em todas as sociedades existe o casamento. Um homem e uma mulher firmam uma aliança publicamente reconhecida, cujo objetivo principal é ter filhos; o homem tem o "direito" de acesso sexual exclusivo à mulher, e ambos obrigam-se a investir nos filhos. (p.454)

A paternidade/maternidade é a única entre as relações humanas na sua unilateralidade. Os pais dão, os filhos recebem. Por óbvias razões evolutivas, as pessoas são projetadas para querer fazer tais sacrifícios pelos seus filhos, mas não por qualquer outra pessoa. E o pior, como veremos, é que as crianças são projetadas para requerer esses sacrifícios dos adultos incumbidos de cuidar delas, o que pode torná-las francamente incômodas para outras pessoas que não seus pais e parentes próximos. (p.456)

O amor paterno é causa do paradoxo fundamental da política: nenhuma sociedade pode ser simultaneamente justa, livre e equitativa. Se for justa, as pessoas que trabalham mais acumularão mais. Se for livre, as pessoas darão sua riqueza aos filhos. Mas neste caso ela não pode ser equitativa, pois algumas pessoas herdarão riqueza que não trabalharam para ganhar. Desde que Platão chamou a atenção para esses tradeoffs em A República, a maioria das ideologias políticas pode ser definida segundo a postura que adotam com respeito a qual desses ideais deve ser abandonado. (p.461)

A essência da teoria não é que os filhos querem receber e os pais não querem dar; é que os filhos desejam receber MAIS do que os pais tencionam dar. (p.465)

O conflito entre pais e filhos oferece uma explicação direta e clara, alternativa ao freudiano complexo de Édipo. O interesse de Papai por Mamãe desvia de mim a atenção dela - e, pior ainda, ameaça criar um irmãozinho ou irmãzinha. É bem possível que tenham evoluído nas crianças táticas para adiar esse triste dia diminuindo o interesse da mãe pelo sexo e mantendo o pai distante da mãe. (p.468-469)

As personalidades diferem pelo menos de cinco modos: se uma pessoa é sociável ou retraída (extroversão-introversão), se vive preocupada ou é calma e satisfeita consigo mesma (neuroticismo-estabilidade), se é cortês e confiada ou rude e desconfiada (concordância-antagonismo), se é cuidadosa ou descuidada (consciência-desnorteamento) e se é ousada ou acomodada (flexibilidade-inflexibilidade). (p.471)

As decisões sobre a criação dos filhos inerentemente dizem respeito ao modo de alocar um recurso escasso - o tempo e o esforço dos pais - ao qual várias partes têm direito. Neste caso, a criação dos filhos sempre será, em parte, uma questão de ética e política, e não apenas de psicologia e biologia. (p.474)

Como Salloway previu, os primogênitos são menos flexíveis (mais afeitos ao status quo, tradicionalistas e rigorosamente identificados com os pais), mais conscienciosos (mais responsáveis, orientados para as realizações, sérios e organizados), mais antagônicos (menos cordatos, acessíveis, populares e complacentes) e mais neuróticos (menos bem ajustados, mais ansiosos). Também são mais extrovertidos (mais propensos a fazer valer sua vontade e a liderar), embora as evidências sejam nebulosas porque eles são mais circunspectos, oq ue os faz parecer mais introvertidos. (p.477)

O sexo que investe mais, escolhe; o que investe menos, compete. (p.487)

O cristianismo em seus primórdios atraía os homens pobres em parte porque a promessa de monogamia mantinha-os no jogo do casamento e, em sociedades posteriores, o igualitarismo e a monogamia andam juntos tão naturalmente quanto o despotismo e a poliginia. (p.502)

Homens e mulheres de todas as partes atribuem o valor maior à inteligência, bondade e compreensão. (p.505)

A beleza não é uma conspiração masculina para transformar as mulheres em objeto e oprimi-las. [...] As mulheres nas sociedades liberais almejam a boa aparência porque ela confere uma vantagem na competição por maridos, status e atenção dos poderosos. [...] A aparência dos homens importa menos para as mulheres do que a das mulheres importa para os homens. [...] Uma dieta diária de pessoas virtuais de beleza anômala pode reajustar as escalas e fazer com que as pessoas reais, inclusive nós mesmos, pareçam feias. (p.511-512)

Obviamente, ninguém gosta de pensar em seu parceiro oferecendo sexo OU afeto a qualquer outra pessoa, mas mesmo neste caso as razões podem diferir: os homens podem preocupar-se com o afeto porque ele pode conduzir ao sexo; as mulheres podem preocupar-se com o sexo porque ele pode conduzir ao afeto. (p.513)

Por toda parte, as pessoas empenham-se pela obtenção de uma substância fantasmagórica chamada autoridade, importância, dignidade, predominância, eminência, estima, preponderância, posição, preeminência, prestígio, distinção, consideração, reputação, respeito, categoria, valor ou status. Passam fome, arriscam a vida e consomem a saúde para ganhar pedaços de fita ou metal. (p.517-518)

Sobre demonstrações de status via consumo ostensivo de supérfluos: a moda e seus ciclos se explicam pela regra "tente parecer-se com quem está acima de você; se estiver no topo, tente parecer diferente dos que estão abaixo". (p.526) ou, por outro lado, "Sou tão talentoso, rico, popular ou bem relacionado que posso dar-me ao luxo de escandalizar você". (p.526)

Axelrod e Hamilton repetiram a simulação do Dilema do Prisioneiro por muitas gerações e constataram que a estratégia simples toma-lá-dá-cá - cooperar no primeiro movimento e depois fazer o que seu parceiro fez no movimento anterior - derrotou 62 outras estratégias e dominou a população. A cooperação pode evoluir quando as partes interagem repetidamente, cada qual lembrando o comportamento da outra e retribuindo. (p.529) (equilíbrio de Nash) Os povos coletores de alimentos COMPARTILHAM comida, mas não porque têm um coração repleto de amor e bondade. Eles impõem a ética do compartilhamento com recordações obsessivamente minuciosas sobre quem ajudou, uma clara expectativa de retribuição e venenosas fofocas sobre quem não contribuiu com a sua parte. (p.531)

Amigos o cônjuges sentem0se como se estivessem em dívida um para como outro, mas as dívidas não são medidas, o prazo de crédito é longo, e a obrigação a saldar não é onerosa, e sim profundamente gratificante. (p.532) A cooperação benevolente não pode evoluir se quem concede os favores não detectar e punir os trapaceiros. (p.541)

Ninguém precisa de um cientista para calcular se os humanos são propensos à velhacaria. Essa questão já foi respondida nos livros de história, nos jornais, nos registros etnográficos e nas cartas às colunas de conselhos sentimentais. (p.542)

A tarefa da psicologia evolucionista é acrescentar o tipo satisfatório de insight que só a ciência pode dar: associar o que sabemos sobre a natureza humana ao resto de nossos conhecimentos sobre como o mundo funciona e demonstrar que grande parte de nossa psicologia social [...] pode ser deduzida a partir de algumas hipóteses sobre Seleção Familiar, Investimento Paterno, Altruísmo Recíproco, e Teoria Computacional da Mente. (p.543)

8. O SENTIDO DA VIDA

Moralidade indumentária [...] as pessoas veem dignidade nos sinais de uma existência honrosamente fútil, longe de todas as necessidades desprezíveis. (p.548)

Eu diria que a religião e a filosofia são, em parte, a aplicação de ferramentas mentais a problemas que não fomos projetados para desenvolver. (p.550)

Acompanhar as fraquezas das pessoas comuns virtuais em sua vida cotidiana pode acionar um botão de prazer, aquele denominado "bisbilhotice". Trata-se de um passatempo muito popular da humanidade, pois conhecimento é poder. Saber quem precisa de um favor e quem está em condições de concedê-lo, quem é confiável e quem é mentiroso, quem está disponível (ou em breve estará) e quem se encontra sob a proteção de um cônjuge ciumento ou da família - tudo isso fornece óbvias vantagens estratégicas nos jogos da vida. Isso se aplica especialmente quando a informação não é de conhecimento geral e o indivíduo pode ser o primeiro a explorar uma oportunidade. [...] Nos pequenos bandos em que nossa mente evoluiu, todo mundo conhecia todo mundo, por isso toda bisbilhotice era útil. Hoje em dia, quando perscrutamos a vida particular de personagens fictícios, estamos nos aplicando uma dose do mesmo tipo de prazer. (p.566)

Os três ingredientes do humor segundo Koestler - incongruência, resolução e indignidade - foram comprovados em muitos experimentos sobre o que torna uma piada engraçada. (p.576) ambiguidade, choque de referenciais, inesperado, sensato, insultante.

Dignidade e prestígio são balões furados do humor. [...] Muitos dos atributos de prestígio estão nos olhos de quem vê e se desintegrariam caso o sujeito que vê mudasse sua ponderação das forças e fraquezas cuja soma resulta no valor da pessoa em questão. Portanto, o humor pode ser uma arma antidominância. (p.576)

Nem todo humor é maldoso. Amigos gastam um bom tempo com pilhérias nas quais ninguém sai magoado; de fato, uma noite que passamos rindo com os amigos é um dos maiores prazeres da vida. Obviamente, uma grande parte do prazer vem de desancar pessoas ausentes do círculo, o que reforça a amizade mediante o princípio de que o inimigo de meu inimigo é meu amigo. Mas boa parte também é uma branda autodepreciação e uma caçoada inofensiva que todo mundo parece apreciar. (p.578)

As pessoas confortam-se com a ideia de um pastor benevolente, um plano universal ou uma vida após a morte. mas isso não explica nada. [...] Como escreveu Blaise Pascal: "Os homens nunca fazem o mal tão completamente e de bom grado como quando o fazem por convicção religiosa." [...] O que chamamos religião no Ocidente moderno é uma cultura alternativa de leis e costumes que sobreviveu paralelamente à nação-Estado graças a acidentes da história europeia. As religiões, como as outras culturas, produziram arte, filosofia e leis grandiosas, mas seus costumes, como os de outras culturas, muitas vezes servem aos interesses das pessoas que as promulgam. [...] vários exemplos [...] (p.580)