* Conforme vocês podem perceber, os meus textos gramaticais jamais apresentam o “certo” ou condenam o “errado”.
Eu tenho um texto específico no qual vocês podem conferir o que penso sobre isso (Basta clicar no link).

http://www.recantodasletras.com.br/gramatica/3445990

Nessa segunda-feira, aplicando um exercício na sala de aula, eu dizia a um aluno:
“Nada de dizer certo ou errado! Vamos apenas tentar descobrir o que a Gramática recomenda.”
 
Estudando Português, além dessa mania de condenar ou absorver que muitos carregam, percebo também que o orgulho atrapalha um bocado.
 
Quantas vezes o professor, repetindo uma proposta de aula, vai descobrir a fala ideal exatamente num comentário efetuado pelos alunos?
Há pouco estava dando uma aula, comentando as possibilidades semânticas de alguns verbos.
Citando o verbo aspirar, explicava que o mesmo pode significar respirar ou desejar muito algo.
Nesse segundo sentido, surgiu a idéia de tentar experimentar a expressão “correr atrás”.
Utilizei, gostei, aproveitei nas outras aulas, repeti e não pretendo largar mais.
Fui perceber, então, que essa expressão, tão fácil de ser assimilada pelos alunos, sempre esteve no ar, porém só a descobri agora.
 
* Outra coisa muito importante é abandonar o pensamento de infalibilidade que alguns tolos professores alimentam.
 
Certa vez eu percebi que andava fazendo uma tremenda confusão com a diferença entre uma oração subordinada adverbial causal e a oração coordenada sindética explicativa.
 
Essa compreensão só foi desenvolvida alguns anos depois de eu começar a lecionar.
Provavelmente devo ter apresentado exemplos equivocados, nas minhas aulas citando o assunto, antes de entender bem tal diferença.
Hoje evito isso. Se não tenho a segurança ideal para desenvolver um conteúdo, ele jamais será apresentado aos alunos.
 
São os amadurecimentos que a vida faculta, que a experiência proporciona, porém somente possíveis se evitamos o sentimento de orgulho.
Se eu vivesse sempre iludido, pensando que já sei o que tinha de saber, que sou infalível, que nada devo atualizar, correria o forte risco de ainda estar preso à confusão citada.
 
* Meus queridos amigos, apesar de eu ser bastante sério, adoro abusar e gozar numa boa as pessoas.
 
Há uns seis anos, passeando bastante pelo orkut, criei um falso perfil, um fake, o Revisor, que visitava as comunidades e, lendo a página principal delas, fazia "correções" no campo gramatical.
Percebam que, nesse período, eu andava preocupado com essa coisa de errar, acertar e corrigir, porém não me acusem de nada, porque o grande vilão dessa história é o nosso querido Revisor.
 
Duas situações desejo dividir com os senhores.
 
Há uma comunidade no orkut intitulada "Amo andar na praia".
 
Entre outras coisas, o autor ou a autora (o nome não esclarece bem o sexo) diz o seguinte:
“Andar na praia é tudo de bom... Faz bem pro corpo e pra alma, da pra relaxar, conversar, paquerar, conhecer lugares novos, e meu...”
 
O Revisor destacou a frase “da pra relaxar” e pediu a quem comanda a comunidade que colocasse o acento no primeiro verbo.
Assim a frase ficaria “Dá pra relaxar”.
 
O Revisor recebeu a seguinte resposta:
 
<<< Olá, REVISOR!
Que tal criar uma comunidade com aulas da lingua portuguesa,
principalmente agora que a ortografia está mudando?
Aposto que muitos interessados irão aderir.
Esta, foi criada para quem ama andar na praia, não para quem
ama estudar a língua portuguesa.
Quanto a escrever corretamente, se dependesse disso, nenhuma
comunidade do Orkut existiria! E acredito que, a maioria dos
participantes, escrevem muito bem! Mas, aqui, é um lugar de
descontração e não uma sala de aula onde um "revisor", nem um
pouco humilde, se mete a revisar textos sem ser convidado para tal.
 
Bons estudos!>>>
 
Vou apresentar a vocês um pedacinho da resposta que o Revisor escreveu.
 
<<< É tão complicado assim efetuar revisões básicas de textos mal construídos?
Por que não podemos estar num lugar de descontração sem agredir nosso idioma?
Colocar o acento agudo no verbo tira a descontração desse lugar?
Quem está sendo pouco humilde não aceitando minha correção? >>>
 
Claro que a discussão é boba, porém percebam que a frase polêmica “da pra relaxar” precisa ser modificada.
A retificação solicitada pelo Revisor não foi uma tolice.
O dono ou a dona da comunidade preferiu, porém, contestar, elaborar um texto condenando a revisão proposta, jamais considerando a hipótese de que é necessário alterar a frase.
 
* Há um outro exemplo que evidencia um orgulho mais acentuado do que esse.
 
Existe uma comunidade destacando o CQC que possui, na sua página principal, o seguinte convite:
<<< Bem-vindo(a) a comunidade indicada por Marcelo Tas!>>>
 
Há uma dica básica, no estudo da crase, que orienta realizar a substituição do a pelo ao.
Caso essa substituição possa ser feita, a crase deve ser utilizada.
Na frase que permanece abrindo a comunidade poderia estar escrito “Bem vindo(a) ao clube indicado por Marcelo Tas!”.
 
Eis uma dica interessante, no entanto a ambigüidade, não usando a crase, é muito óbvia nessa frase.
Não existe dificuldade alguma em perceber a necessidade de utilizar a crase nesse exemplo.
 
Na ocasião, o Revisor foi lá, fez o alerta, esclareceu todos os porquês que estavam justificando a retificação solicitada.
O que fizeram? Ele foi expulso da comunidade.
O Revisor, muito persistente, tentou outras vezes, porém não alcançou êxito.
 
Eu disse que acho mais grave essa atitude, pois tal comunidade, além de um dono, possui sete moderadores e conta com mais de 225 mil membros.
 
* Parece que algumas pessoas não percebem que é completamente normal "escorregar" quando escrevemos uma frase ou palavra.
Eu desejo muito dizer a elas:
Podemos errar!
Que bom que nós erramos!
 
O que me entristece é o orgulho constatado de não retificar o que deve ser retificado.
Não aceitar a possibilidade de correção me parece uma calamidade.
Isso é terrível!
Adoramos apontar erros, discutir erros, falar em erros, porém esperamos que eles jamais pertençam a nós.
 
* Caso algum membro da comunidade citada leia este texto, talvez fique aborrecido com minhas ações do pretérito, porém eu penso que uma eventual correção gramatical nenhum mal faria à comunidade assim como não faz mal a ninguém.
 
Confesso aos senhores que evito adotar certas fotos que destacam frases ou expressões contrariando as recomendações gramaticais, os denominados erros segundo a concepção da maioria.
Por quê?
Primeiro noto que está existindo um descaso enorme com nossa língua portuguesa.
Quem escreve simplesmente não está nem aí.
 
A outra questão tem a ver com o compromisso que assumi com o ensino.
Não posso oferecer uma mensagem que fortaleça esse descaso e desinteresse que vem dominando o estudo da nossa desprezada língua portuguesa.
 
* Para encerrar, antes de iniciar este texto, fui conferir se as comunidades ainda existiam e se ainda apresentavam as frases que instigaram a ação do Revisor.
Entristecido verifiquei que tudo permanece da mesma forma.
 
Por que fico entristecido e abatido?
No mundo das relações, o orgulho tem destruído amizades, tem provocado discórdias que atormentam e maltratam o coração.
Ver o orgulho, porém, na área do aprendizado me preocupa demais.
 
O orkut hoje é uma praia deserta e esquecida, contudo aqueles que tanto participavam do orkut migraram para o Facebook e o Twitter.
 
As mesmas pessoas, com suas manias, seus gostos e com o mesmo orgulho acentuado que decide manter frases questionáveis, exatamente como elas um dia foram escritas, que não aceitam nunca que um Revisor, metido a besta, apareça indicando o que é ou o que não é.
 
O Revisor essas pessoas não voltarão a ver.
Ele me revelou que está aposentado.
 
Mas o futuro desse país que pede uma reforma educacional urgente me estimula uma grande inquietação.
O que estamos fazendo com os cidadãos do amanhã?
O que estamos ensinando a eles?
Estamos orientando, explicando, atualizando nossas crianças ou permanecemos com essa onda de apontar erros aqui ou acolá?
 
Será que os professores estão dispostos a renovar suas convicções, a modificar os seus métodos ultrapassados ou ainda pensam que são os sabichões, acima de todos os conhecimentos, incapazes de cometer qualquer espécie de deslize gramatical?
 
* Orgulho, o grande mal da humanidade, a chaga mais cruel, a causa de separações amorosas, brigas religiosas, disputas políticas, assassinatos e até de guerras mundiais!
Como podemos deixar esse veneno se meter também nos estudos gramaticais?
 
Conheci algumas pessoas que diriam: “Ilmar, é fim de mundo!”
Infelizmente eu acho que elas estariam certas afirmando isso.

Um abraço!



 
Peço que confiram o meu acróstico mais recente.
Cliquem sem orgulho nenhum!(a)>

http://www.recantodasletras.com.br/acrosticos/3901688
 
 
Ilmar
Enviado por Ilmar em 26/09/2012
Reeditado em 28/09/2012
Código do texto: T3901731
Classificação de conteúdo: seguro