Friozinho de outono - Um haicai e uma mensagem aos colegas do Recanto das Letras.

Friozinho de outono - Um haicai e uma mensagem aos colegas do Recanto das Letras.

friozinho do outono --

procuro por um bom haicai

café já no fogo

Ontem foi publicado no link de haicais um texto (que em minha modesta opinião não pode ser chamado de elaboração, porque não tem as características próprias), chamado "Ânus rompido".

Evidentemente que o tal texto pode ser poético. Mas, creio que foi publicado na sessão errada, porque ele destoa muito do que se entende por haicai, seja de que escola for.

Como boa parte dos frequentadores do Recanto, sou mero iniciante na aventura de escrever e, de elaborar haicas. Todavia, a partir da publicação em questão, não posso me furtar de escrever aos colegas sobre um assunto que me incomoda, no momento.

Lendo as elaborações publicadas, notei que o nível das publicações vem caindo, de uns meses para cá. Muita coisa sem o espírito a noção, a técnica e objetivo do haicai.

Como disse, poderiam ser publicados no Recanto das Letras, em outros links - no poetrix, por exemplo!

Que seja tradicional, guilhermino, leminskiano, milorino (é assim que se escreve?), ou de outra natureza. Mas, entendo que no link de haicais, devemos publicar haicai.

Frases divididas em três versos - espertas, filosóficas ou nem tanto, suspiros poéticos, saudades e sentimentalismos, viajens diárias ao redor do próprio umbigo, orações panteistas à natureza - tudo isso tem poesia, mas não tem a aura, o espírito do haicai.

O haicai é o fazer poético cuja pedra fundamental é a observação da natureza e seus ritmos. Ponto.

Talvez fosse o caso dos haicaistas começarem a falar a respeito, nem que seja em notas ao rodapé das elaborações publicadas, dando dicas e sugestões, para que todos os colegas possam evoluir e, se enriquecer.

Um colega nosso, grande haijin, está fazendo um esforço danado nesse sentido, negritando o kigô, em cada trabalho, dando um toque aos colegas.

Muitos bons haijins deixaram de publicar suas elaborações por aqui, recentemente. Me pergunto se isto não tem há ver com o ambiente pouco estimulante, onde parece haver pouca dedicação à técnica e à evolução na arte de elaborar haicais.

Agora, reflitamos: a página de haicais do Recanto das Letras é a mais vistosa vitrine da Internet. Que oportunidade para multiplicar os leitores de haicai!

Por isso mesmo, acho que a arte da elaboração de haicais merece mais apreço, estudo, pesquisa, dedicação e carinho.

Tenho certeza de que muitos dos colegas que publicam haicais não sabem o que ele é, na verdade, quanto ao seu objeto e objetivo, a técnica envolvida, a métrica aplicada e outras características.

Não há mal algum nisso. Mas, se alguém se propõe a elaborar haicais, tem que produzir haicais, e não outra coisa.

Antes de partir para a elaboração do haicai, porém, a leitura dos velhos mestres e haijins é imprescindível. Do contrário, não se chega a um entendimento do que ele é - ou não é.

Nesse sentido, gostaria de recomendar a todos os que quiserem conhecer mais a história e a técnica do haicai que visitem o site do Kakinet, jornal Nippon Brasil, Sumaúma Haicai - onde vão encontrar os admiráveis e encatadores haicais dos mestres orientais, além dos sites de Teruko Oda, Alice Ruiz, Carlos Seabra (do "Caixa de Hai Cai"), etc, e, aproveitem para baixar gratuitamente um precioso livro de Paulo Franquetti, Haicai - Antologia e História (num link autorizado por ele), o preciso livro que escreveu falando do haicai brasileiro.*

E não se pode deixar de fazer referência aos livros de Guilherme de Almeida e do mestre Masuda Goga, do Grêmio Haicai Ipê, que foi um grande haijin e disseminador da cultura do haicai de inspiração oriental no Brasil, em especial o indispensável livro Natureza - Berço do Haicai (escrito em parceria com Teruko Oda), do qual consta uma preciosa lista de kigôs brasileiros e ainda, uma fantástica antologia de haicais brasileiros.

De Goga, também podem ser encontrados dois vídeos de entrevistas no Youtube, onde se pode ver toda a sua profissão de fé e prazer de fazer e falar de haicai.

Os livros destes autores, cujas edições estão esgotadas, estão à venda, de vez em quando, no site www.estantevirtual.com.br.

Os que quiserem conhecer o tanka, ancestral do haicai, podem ler um grande mestre moderno, Ishikawa Takuboku, que teve um livro publicado no Brasil, Tankas, que também pode ser encontrado no site Estante Virtual.

É ter paciência e procurar.

...E fico imaginando o quanto os colegas serão capazes de fazer, depois de adquirirem a cultura própria do haicai...

O haicai não é um poema vulgar. Ele tem um espírito, um engenho e, um encanto muito próprio.

Acho que o haicai, pela sua preciosidade, não admite certas vulgaridades. Mas, a recompensa de uma correta elaboração é compensadora, para o haicaista e para quem tem o prazer de lê-lo.

Um abraço a todos!

* o link para baixar o livro do Franchetti e este:

http://www.unicamp.br/~franchet/