FIM DE CASO

FIM DE CASO

Eu não tenho o direito de interferir na privacidade das pessoas e sei que não devo fazer comentários sobre as particularidades da vida de ninguém. Se um amigo confiou em mim, não devo ficar tecendo comentários para que tirem conclusões precipitadas. Se não fosse segredo, todos saberiam.

Você já teve um amigo ou amiga? Pense bem antes de responder. Amigo mesmo! Não colega de sacanagem, de bebedeira, de farras. Nem colega de trabalho para falar mal dos outros e reclamar do salário, do ônibus lotado, dos atrasos, dos chefes, do fim de semana fracassado, da exaustão. Enfim, falar da falta de sorte, de ter nascido pobre...

Amigo, para mim, é aquele que a gente pode contar todas as horas. Nos momentos alegres, tristes. Se abrir sem receio e se sentir protegido. Rir abertamente, chorar no ombro sem medo de se sentir ferido, se sentir menor, discriminado. Ser delicado sem frescura e sem pudor e saber que pode contar com esta pessoa em tudo: sem cobrança, sem responsabilidade e totalmente despreocupado. Falar abertamente das frustrações, impotências, dissabores desilusões...

Você sabe quantos amigos a gente pode ter durante toda a vida? Pouquíssimos! Talvez um ou dois em cada faixa etária.

Na adolescência onde se desconfia de tudo e de todos com as descobertas, as constantes transformações do corpo. Pelos surgindo por todo lado, mamilos que começam a surgir e crescem rapidamente por mais que tente esconder, voz que vai alternando com graves e agudos, sensações, emoções, a descoberta do sexo oposto, sonhos eróticos, masturbação, a desconfiança, a dúvida da aceitação pelos outros, auto-estima em baixa, o isolamento...

Todos já passamos por isso! Lembro-me muito bem o quanto à gente sofre por antecipação. Muitos entram até em depressão.

O resultado dessa adolescência conturbada quando chega à fase adulta, enfrenta novamente vários problemas. O que vai fazer, que profissão seguir, a pressão dos pais, o confronto com o novo – o sexo, as drogas, bebidas, o conhecimento e aceitação do outro, as brigas, as incertezas, a busca, as rejeições, as anulações para poder conviver. Ciúmes, brigas, amores, noivado, casamento e enfim os filhos. Haja vida!

Na fase da melhor idade, ou seja, na velhice mesmo, temos que enfrentar muitas situações já vivenciadas antes, porém, descobre-se que já não temos tanta resistência para enfrentá-las. E além de tudo, temos que passar por outras situações que na maioria das vezes são bem desconfortáveis.

As doenças surgem com facilidade, o corpo já não obedece mais o comando e surge a rejeição, a discriminação, a exclusão...

Pois eu sei o que é ter um amigo. Um amigo sem interesse, sem cobrança, sem dúvidas, sem medo. Um amigo não se consegue em um piscar de olhos. É preciso tempo para se conhecer a pessoa, aceitar suas limitações, seus temores, seus medos, suas angustias e vice-versa. É todo um processo demorado e angustiante até que um dia se descobre que não temos mais receio de falar abertamente, que se pode abraçar e sentir o seu peito sem sentir atração sexual, sem sentir tesão, sem dor e sem pecado. Não há maldade em nada. Tudo é belo e agradável.

E agora você vem com toda essa naturalidade pedindo que eu traia a confiança do meu amigo? Você não sabe o que é uma amizade! Talvez não tenha passado por essa emoção de ter um amigo. Perdoe-me, mas você bateu na porta errada. E mesmo que eu soubesse de todas as respostas para suas perguntas, eu jamais trairia meu amigo nem no leito de sua morte. Nem que eu soubesse que isto lhe traria a vida de volta. Eu traria sua vida de volta, mas a nossa amizade morreria ali mesmo. Eu não teria coragem de encará-lo novamente, portanto, eu detonaria nossa amizade que foi cultivada sem promessas, sem compromisso, sem juras. Mas na mais plena verdade que nasce no peito, na alma.

Você é como o vento: acaricia a pele macia, mas é capaz de derrubar árvores, destruir telhados e causar tempestades. É angelical como uma criança, mas tem atitudes de um carrasco.

Você para mim é como uma mulher qualquer. Eu não sinto vontade de tocá-la, de beijá-la, de fazer amor. Posso te usar para satisfazer as necessidades de um homem, mas jamais te amarei. Posso fazer amor com você como faço com qualquer prostituta que pago, mas depois vou tomar um banho para tirar seu cheiro e sinto nojo em saber que ela é de todos os homens e vai para a cama por dinheiro.

Não te amo e jamais te amaria. Todas as vezes que eu te tocasse pensaria nas sujeiras, na podridão e artimanhas que fez para ficar comigo.

Jamais me importarei se for para a cama com outros homens. É um peso a menos que terei de carregar sabendo que és possuída, que se entrega. Mas nunca, jamais me sentirei culpado por te fazer infeliz.

E se você insistir em me prejudicar serei capaz de te matar com todos os requintes de perversidade, mas cultivo a minha amizade.

Josa Pinheiro
Enviado por Josa Pinheiro em 13/02/2009
Reeditado em 13/02/2009
Código do texto: T1437057
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