Angelus

O fato transformou o sagrado em hora.

A hora tinha pesos e medidas exatas;

ângulo e luz própria.

Nessa procissão não há andor,

só os anjos permanecem inteiros, enfileirados,

aguardando com precisão o dado momento da benção.

(Muitas cabeças, ungidas com quê, meu Deus?

Que tipo de luz viria anunciar a boa nova aos errantes tão distraídos?)

O ato, ficcional ou não, virou destaque extra-sensorial.

Aguçaram-se os sentimentos mais diversos e,

a maioria deles tendia ao caos.

(Já que dele fomos criados,

não havia, então, motivo para maiores preocupações.)

É chegado o instante!

Harpas enunciam:

sim! Agora é o momento!

De repente, um querubim maluco,

apaixonado pelo dom que recebera,

perpassou ousadamente às ordens superiores -

estava feito o milagre.

O milagre de não haver mais momento de curvar-se,

adorar e dividir.

- Na ordem que preferir, disse ele!

- Ordem? Mas, acabaste de de dizer...

- Não disse-lhes, nobres corajosos; incentivei-os!

Desde então, tudo é Angelus.