LEMBRANÇAS DO MEU PAI

Hoje, rememorando o passado, em busca de algo que aquietasse meu coração, tirei da estante o velho álbum de fotografias da família, olhei aquelas páginas com um profundo nó no peito, me vi pequenina, com meu vestido preferido de algodão ao lado de uma vitrola antiga repleta de discos e o sorriso ingênuo e alegre próprio da pureza da infância, ao meu lado uma imagem de alguém com um orgulho estufado no peito, sorriso alegre e uma vitalidade estampada no semblante, meu pai.

Rememorei aquele passo ligeiro, o sorriso alegre de um homem cheio de vida, um ar de sabedoria de quem muito já viveu. Lembrei da minha casinha no interior, cercada de amor, família grande e unida, da maravilha que era quando faltava luz e sentávamos todos em frente à casa, observando o brilho das estrelas e escutando as maravilhosas histórias contadas pelo meu pai, histórias de aventuras, não sabíamos se eram verdadeiras ou não, mas o brilho em nossos olhos era contagiante, assim como contagiante a satisfação do meu pai com a nossa felicidade. Para mim, meu pai era o meu herói, sempre corajoso, disposto a tudo para defender os filhos de qualquer armadilha do destino, sempre disposto a se sacrificar em prol dos seus, foram tantas às vezes em que o vi com seu caminhar ligeiro, seu sorriso alegre e espontâneo apontar na esquina e chegar para abraçar os filhos, ah! E como gostava de ajudar o próximo! Sempre nos ensinou a amar os nossos semelhantes como a nós mesmos, fazendo-nos lembrar os ensinamentos de Cristo. Recordo-me de como ele amava quando eu penteava o seu cabelo, passava horas penteando e o via cochilar quando minhas mãozinhas pequeninas acariciavam seu cabelo ainda vistoso com o "vigor" da juventude.

Coloquei novamente o álbum na estante ainda sorrindo com as maravilhosas lembranças dos tempos de outrora, e olhei meu pai reclinado em sua poltrona, não há mais o vigorar da juventude em seu semblante, não há mais o brilho nos olhos, o que eu vejo são vincos profundos na pele, os passos antes ligeiros, agora são lentos e vacilam ao encontro de algum obstáculo, o sorriso outrora contagiante, já não o vejo expressar, a alegria que era própria de uma personalidade marcante e dinâmica, deu lugar à tristeza, as lágrimas hoje derramadas, são preces ao Criador pedindo para nunca deixar desamparados os seus.

Hoje, olho um pai diferente daquele das minhas memórias infantis, pudera, o tempo é implacável, hoje vejo um pai sofrido, dilacerado pelas intempéries da vida e agradeço a Deus pelos vincos em sua pele, pelas suas mãos encarquilhadas e trêmulas, pelos seus passos vacilantes, pelo seu olhar cansado, pelo privilégio de vê-lo envelhecer e poder, no futuro, quiçá bem distante, sentar com os meus filhos em frente a minha casa, olhar as estrelas e contar as histórias da minha infância, as minhas lembranças, as maravilhosas lembranças do meu pai.