Um dia...

Um dia você me perguntou: devo ousar?

Era grande o risco: outros mares, outras culturas, a distância física, a falta do aconchego materno, colos.

Um dia eu te disse: vá!

Voa alto, encontre-se, arrisca tudo o que puder.

Valerá a pena a ousadia do voo.

Estarei aqui a te esperar.

Terá seus colos, minhas preces, meu amor eterno.

Um dia você foi...

Lágrimas, despedidas, promessas, cuidados.

Não foi fácil a adaptação, não é filha?

Sempre fomos tão companheiras!

Nossa cumplicidade continuou à distância.

Tantas noites mal dormidas eu tive!

Tantas você as teve também...

Tanta saudade de você, seu jeitinho meigo, seus olhos verdinhos e brilhantes...

Você...

Ah, você minha cria querida!

Quantos desafios teve de enfrentar!

Discriminação, preconceito, desafetos, solidão.

A sobrevivência tornou-se prioridade.

De um dia para o outro você ficou por sua conta, num país estranho, sem seus amores por perto.

É...

Da nossa casinha tão alegre mudou-se para quartos compartilhados.

Foi desrespeitada e até humilhada à vezes.

Teve que encarar o trabalho braçal, limpar banheiros desconhecidos.

Mas passou, não é filha?

Hoje, essa mesma sociedade que te recebeu como imigrante brasileira, te reconhece e premia.

É o reconhecimento, a justiça divina intervindo no seu caminho.

Parabéns, meu amor!

A bolsa de doutorado é sua e o mérito é todo seu!

Deus te abençoe pela alegria de ter sido escolhida lá no alto para ser sua mãe.

Agora é hora de colher os frutos do voo arriscado.

Valeu a pena...valeu!

(para paulinha, minha filha, meu amor maior)