É sempre uma festa, quando reunimos a família.
Mas não lembro, quando foi possível reunir à todos.

E nunca havia percebido o valor de uma família, até o dia que ela me foi tirada
Os longos anos de divórcio, já tornavam normal a ausência
dos pais daqueles meninos, nestes raros momentos de união.
Mas no último encontro, eu estava por perto.
 
Enquanto anoitecia, olhávam para o céu, pensando... que magnífico, que espetáculo este universo.
Milhões e milhões de estrelas! De onde veio tudo isso?
Parecemos imortais, diante de tudo isso!
 
Pois é assim, maior parte de nossas vidas,
parecemos imortais, diante deste universo
cercado de tantas belezas.
 
Esta imensidão, costuma nos tirar o foco,
de tantas coisas pequenas, mas não menos essenciais,
presentes em cada momento de nossas vidas.
Mas simplesmente, parecemos não perceber.
 
Envolvidos por aquele encontro familiar e caminhando na direção dos meus filhos, de longe ouvi, que alguém perguntou,
questionando a dolorosa cirurgia que dias antes,
eu havia me submetido.
Diante de tanta beleza assim, porquê acontece coisas ruins com gente boa?
Observei, que a pergunta ecoou e não teve resposta.
 
Outro completou perguntando, se lembravam das ultimas palavras
que disseram á mim, nos raros encontros e nas poucas ligações para saber notícias.
Houve quem dissesse; “Ah! Mas o pai vive na promessa de me visitar.
O seu neto já está grande, e ele ainda nem sabe direito seu nome!”
Parece que sempre tem outras coisas mais importantes para fazer.
“Sabíamos que ele estava doente, mas ele não liga para nos dizer se precisa de algo!”
 
Enquanto me aproximava, descobria aos poucos, que a vida também esconde pequenos universos desconhecidos.
Naquele momento, recordei da doença e da morte prematura da minha mãe, os tempos difíceis de uma vida dura, de muito trabalho e poucas recompensas. A partida de meus irmãos, alguns já velhos. E eu!!! Onde estava?
 
Aquela conversa, as lembranças, as complicações da cirurgia...
Faziam com que o sofrimento que vinha passando, resgatasse uma história que pensei ter esquecido, mas que ainda estava presente em cada gesto meu, que contribuíam para enrijecer ainda mais minhas palavras e meus sentimentos.
 
Na linguagem rude que limitadamente dominava, tentei dizer aos meus filhos o quanto os amava.
Mas parecia, que a sabedoria dos livros modernos, não era suficiente,
para que meus filhos decifrassem a agonia dos meus gestos,
ou compreendessem, o apelo que havia em minhas palavras. 
 
Sabia que estava perto demais do outro lado, e temia
que algo de ruim me acontecesse. Sabia que muitas vezes fora intolerante, mas do meu jeito, também sabia amar.
Queria que as pessoas que eu amava, estivessem
naquele momento, do meu lado, tomando conta de mim.
 
Descobri, que a dor e o sofrimento que vinha sentindo, pelo freqüente uso de aparelhos que me garantiam as funções normais do meu organismo, não eram comparadas
à mágoa que carregava, naquele momento tão crucial dos meus setenta e poucos anos.
 
Descobri, que por parecermos imortais,
não percebemos as frações do tempo.
Não percebemos, que as pessoas envelhecem, e que para estas pessoas, um aniversário não lembrado, é também,
um ano á menos do pouco que ainda nos resta para juntos vivermos.
Um momento não vivido, pode nunca mais ser possível!
 
Por parecermos imortais, esquecemos algumas coisas, ignoramos outras, ou dizemos que não tivemos tempo para ligar, ou para dar um abraço. E assim, vamos levando a vida, achando que somos imortais,
E que sempre haverá o amanhã,
para fazermos, o que hoje não deu para fazer.
 
A dor maior, era de levar comigo,
a mesma intolerância, as mesmas palavras ásperas que
muitas vezes, tive de dizer aos meus filhos, e
ás pessoas que um dia também amei.
 
Por parecer imortal, não compreendia,
que já estava do outro lado,
e sem que meus filhos ainda soubessem da notícia,
tentava me aproximar e fazer,
com que minha ausência não fosse percebida.
 
Era tarde, para dizer á eles, que sabemos pouco ou nada
sobre o outro lado.
Mas que sabemos muito menos deste lado da vida!

 

Juan de Marco
Enviado por Juan de Marco em 23/09/2009
Reeditado em 09/11/2013
Código do texto: T1826465
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