Dia d@ Professor@

Wilson Correia*

"É necessário que um mestre ponha seus

discípulos na defensiva com relação a

ele, isso faz parte da sua

humanidade" (Nietzsche, 'Aurora').

"O ensino de filosofia não pode restringir-se

a uma questão didática, como poderia ocorrer

com o ensino de uma ciência. A razão principal

é que a filosofia não se constitui de um conjunto

de conhecimentos sistemáticos, e o saber filosófico

não se distribui como se transmite um conhecimento

técnico" (Risieri Frondizi, 'Ensaios filosóficos').

Eu era calouro de Filosofia. Fiz o primeiro trabalho na disciplina de História da Filosofia sobre os Pré-Socráticos, o qual rendeu leitura de fragmentos dele a toda a turma por parte do professor, de quem, generosamente, recebi os “Meus parabéns!”

Aquele sucesso do trabalho inicial animou-me sobremaneira e me cuidei ainda mais de caprichar quando o segundo trabalho nos fora proposto pelo mesmo professor. O estrondo se repetiu, dessa vez com minha explanação sobre Sócrates, de quem falei ser o pai da maiêutica, método que mostrava o falso saber dos interlocutores de Sócrates e que, num segundo momento, buscava o saber conceitual. Se me lembro bem, registrei as razões pelas quais Sócrates fora considerado o homem mais sábio do mundo (porque sabia que não sabia, ao passo que os que pensavam que sabiam não sabiam que não sabiam - lição que eu não aprendi de pronto, como você verá mais adiante); os motivos pelos quais ele chegou a ser condenado à morte, entre outras e várias informações relevantes. Isso tudo foi ressaltado pelo professor, que não titubeou em me atribuir o segundo “Dez!”.

Quase lá pelo final do semestre, antes do exame conclusivo a que todos tinham de se submeter, o terceiro estudo nos foi proposto. O tema: “A Alegoria da Caverna em Platão”. Aí, embalado pelas notas máximas anteriores, dei de descuidar. Lá me meti a discorrer sobre mundo sensível e mundo inteligível; idéias fixas, eternas e imutáveis; teorias da reminiscência e metempsicose, do diálogo da alma consigo mesma, da formação pedagógica e política daquele sábio que só após 50 anos estaria pronto para se inserir na cidade e poder atuar como professor e como político. Foi aí que minha desgraça se fez completa. Quase tudo no meu texto se amarrava ao termo “sofocracia”, o governo dos sábios, daqueles que chegariam à iluminação epistemológica pela prática da dialética ascensional filosófica. Ocorre que, em lugar de escrever “sofocracia”, a palavra “sufocracia” foi a que grafei, lapso não perdoado pelo professor. Ele disse desconhecer o termo (governo dos sufocados? – teria se indagado) e me deu nota... esqueça! As palmas da turma que eu havia recebido nos dois primeiros trabalhos foram substituídas por uma gargalhada de sarro fenomenal. No eco do riso de meus colegas vi (aí, sim!) “sufocado” o meu sucesso filosófico com aquele mestre.

No Dia do Professor e da Professora deste ano, homenageio um e outra compartilhando essa lembrança, registrando que desse professor aí eu nunca me esqueço: ele me corrigiu e me mostrou que o zelo e o cuidado, o rigor e a fidelidade são valores importantes em nossa prática de aprender e de ensinar. Por isso, com a lembrança daquele professor, o qual, realmente, interessava-se por mim, dou meus parabéns a todos os professores e a todas as professores. Eu sei que o nosso quefazer é essencial. Muitas alegrias, professor e professora, com a suada arte de ensinar.

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*Wilson Correia é filósofo, psicopedagogo e doutor em Educação pela Unicamp e Adjunto em Filosofia da Educação na Universidade Federal do Tocantins. É autor de ‘TCC não é um bicho-de-sete-cabeças’. Rio de Janeiro: Ciência Moderna: 2009.