Cego

Um cego, esmola pedia,

No correr: as pessoas.

Pede em vão, Alegria,

E a voz chorosa, ecoa.

Mais tarde, aí agonia,

Gasto salivas, à-toa.

Pra casa, pote vazio.

Filho: o pão reclama!

Ganho é ínfimo é vil.

Pobre, nem tem cama.

E dorme quase ao rio,

Mas sabe. Deus o ama.

Assim esperar é Vida.

Luta se inova ao dia.

Doença é toda lida.

Lazer reclama orgia.

No erro: Paz dormida.

No seguir: Vida fria.

Filha perece de fome,

Nem nada de remédio,

Perto da que consome.

Clima unido em tédio.

Esperança vem e some,

Morte reocupa o meio.

A Mãe lágrimas joga!

Triste! A cena magoa!

Graças, cada um roga:

A Vida que venha boa,

Que morte assim afoga,

É pena que só destoa.

Paira nos ares, é dita!

Qual um acordo reatado.

De grau e grau, a fita,

Ponteada em cada estado,

Que vendo... Não evita,

O tão carente afavelado!

Brinquedo que não consola,

Põe criança, chorar à-toa.

Faz-de-conta e já descola,

Apenas um papel que voa,

Retirado da mingua escola,

Ao quedar na fétida lagoa.

Vira lata, parece amigo,

De fome e sede, pesteado,

Sorrindo a um pé de figo!

Único, em melhor estado!

Fazem-se acosto, abrigo,

Pro Cego, desrespeitado.

De destino em tudo não vê.

Mas dádiva, pelo presente!

Até pra nada existe um quê.

Só sabe o Coração que sente,

Que salva qual seu porque,

Nessa ordem, indiferente.

Amanhece e a Vida passa,

É a batalha dessa gente,

Espalhada... De toda raça,

A ceder: rogar inclemente!

Que Deus lhe encha a taça,

Pro bem, içar eternamente.

Vai levando, assim, o Cego,

No seu ponto, com seu pote,

Igual martelo em cada prego!

Pedindo! É o que ainda pode:

Dá-me esmola... Pobre Cego!

Pois da Vida: Seu único dote!...

José Corrêa Martins Filho
Enviado por José Corrêa Martins Filho em 24/07/2010
Reeditado em 26/05/2016
Código do texto: T2397067
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