DONA SIDÔNIA, O CHEIRO DO SABOR

Trata-se de um fato ocorrido comigo no ano de 1972 em Araguaína no norte de Goiás, hoje é Tocantins, naquele ano morava com minha mãe e irmãos e próximo da nossa casa havia uma senhora negra por nome SIDÔNIA que fazia um cuscuz de arroz que dava água na boca de qualquer um que já tivesse experimentado tal iguaria, Dona Sidônia, como todos chamavam, preparava o cuscuz com azeite de babaçu (côco de uma palmeira que exala um cheiro muito agradável e também é usado para fins culinários), na verdade o azeite é só das azeitonas o do côco é óleo mesmo, mas, como era de costume do povo chamávamos de “azeite de babaçu”.

Logo pela manhã minha mãe dizia:

-Neto, vai comprar o cuscuz.

-Ainda não mãe, não está pronto.

-Como tu sabe menino?

-Eu não tô sentido o cheiro!

-E tu sente o cheiro daqui?

-Sinto, a senhora não?

-Claro que não!

Então pensei que só eu sentia aquele perfume inebriante que exalava do cuscuz da D. Sidônia logo pela manhã quando ela o aprontava.

Depois de 29 anos mais ou menos, mais precisamente no ano de 2001, aqui onde hoje moro (Macapá-AP) tive o prazer de sentir novamente tal cheiro, que num segundo me remeteu àquele ano (1972), pois minha mãe ganhou de uma vizinha que é nordestina e trouxe para ela do Piauí uma garrafa de azeite (óleo) de babaçu e ao chegar à casa de minha mãe senti novamente aquele cheiro e disse:

-Haaaaaaaa, o cheirinho do cuscuz da Dona Sidônia, falei antes mesmo de saber que na verdade se tratava de um ovo que minha mãe estava fritando no tal óleo de babaçu, neste dia, meu irmão que já não morava mais no Amapá estava passando uns dias com minha mãe e quando ele ouviu o que eu havia dito caiu na gargalhada e perguntou:

- você ainda se lembra do nome da velha que fazia cuscuz?

- claro, se tem uma coisa que me faz recordar a minha infância é o cheiro do cuscuz de Dona Sidônia.

- pois eu já não lembrava mais nem mesmo de ter comido cuscuz de arroz em Araguaína, alvará o nome da velha que fazia.

Caros leitores quero esclarecer que nesta época eu tinha apenas oito anos de idade, mas o cheiro do cuscuz, assim como outros cheiros, as vezes agradável, as vezes nem tanto, me fazem recordar tantos bons momentos como momentos que gostaria de esquecer e também que o local onde era feito o cuscuz ficava a mais ou menos uns oitenta metros da minha casa, mas eu sentia aquele cheiro como se estivesse lá, lá onde era feito pela Dona Sidônia, uma preta velha muito respeitada e amada pela comunidade que a cercava.

Bert Noleto – Macapá-AP

Novembro de 2010.

Bert Noleto
Enviado por Bert Noleto em 05/11/2010
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