Um anjo na noite paulistana

Conheço um anjo. Um anjo pronto para a presença solidária nos momentos de maior solidão, de mais absurda angústia, da soma de todas as perdas. Um anjo presente na vida de quem não tem mais a quem falar, abraçar ou sorrir, mas que tem muito a temer.

Esse anjo apareceu na minha vida repentino, sorrateiro, exalando o bom perfume de uma primavera que jamais vivi. Anjo da guarda com nome.

Há tempos a minha Cris se perdeu no mundo, na esquizofrenia que lhe inundou a alma por ocasião do falecimento da mãe. A mãe paraplégica que foi cuidada pela filha com o amor macio, presente, sorridente. A mãe morreu. A filha se perdeu no meio de São Paulo.

Houve o tempo do tratamento, da internação, tempo do hospital-dia. Do viver em pensão.

E o anjo cuidava e não reclamava. Era amiga da minha Cris nos tempos de juventude. Imagino que passaram bons momentos juntas, alguma festinha, quem sabe, ao som do Roberto Carlos e da Wanderléia. Tudo acompanhado de guaraná com bolo de chocolate. Mas eu sei que o anjo se cansava, mas sempre presente .

Num final de ano, como em vários outros momentos, eu visitei a minha Cris, levando recursos, abraços, presença, saudade e esperança. Era véspera de natal. E o anjo chegou, ainda às pressas, de calças jeans um tanto surradas, carregando junto mais um abraço, interesse pelas melhoras e uma torta de frango para que a minha Cris passasse aquela noite.

Depois, a minha prima Cris sumiu de novo, pelas ruas de uma cidade-mãe, mas muitas vezes madrasta. O anjo foi às ruas, no frio cortante, com um cobertor e algum dinheiro e andou e andou. Isso porque soube que a minha Cris estava nas proximidades do Centro Cultural. Andou horas no frio e no vento, olhando para todos os lados. Encontrou e ofereceu ajuda, pela milionésima vez.

Esse anjo continua fazendo a maior de todas as diferenças na vida de quem já não é. Esse anjo tem nome: Silvana. Dona da mais profunda beleza de alma, da mais fiel e encantada leitura do Evangelho, uma das pessoas mais banhadas de luz que me passou pela vida. Silvana, fique sabendo: Você só é menor que Deus! E eu tenho certeza de que o Pai Eterno te olha e te abençoa quente e sossegado, sorrindo confiante, te mandando beijos amorosos de quem criou para isso: amar e servir. Porque você é uma extensão daquele amor que abre os braços e o sorriso para quem tem fome e sede de esperança.

Obrigada, Silvana. Eternamente, muito obrigada!

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 01/07/2011
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