TIA BETINHA



Tia Betinha foi uma das primeiras pessoas que veio me ver, assim que nasci. A mim, deu as boas vindas com muito entusiasmo e alegria. Naquela época, as pessoas tinham uma certa dificuldade em aceitar que uma mulher tivesse “filho sem pai”. Graças a Deus, os tempos “mudaram”!
As escolhas e a vida nos separaram. Viemos para o Planalto Central. Durante uns sete anos não houve contato. Até que um dia, por iniciativa de minha Tia Betinha, houve o reencontro intermediado por uma mensageira que, de Recife, viera visitar alguns parentes na cidade satélite de Sobradinho – recanto recluso de nossas vidas.
Não sei como (a não ser pela Divina Graça), de repente, estava eu de posse de um conjunto de postais – seria a primeira correspondência por mim recebida? – carinhosa e meticulosamente organizado com “tirinhas” amarelas de um papel de seda que de fundo servia para uma letra à caneta azul, muito bem desenhada. Na introdução, dirigia-me a palavra, fazendo referências à cidade onde nasci e esperava que, um dia, eu pudesse conhecê-la pessoalmente.
Tia Betinha é dessas pessoas que se ama ou se “desama” com a mesma intensidade. Não há meio termo. Embora possam se revezar os sentimentos, a concomitância de ambos é impossível. Mulher “porreta”, fala o que pensa e o que deixou de pensar. É impetuosa ao extravasar seus sentimentos. Ora erra, ora acerta, mas não deixa de se manifestar.
Na verdade, prima primeira de minha mãe, filha de Quitéria e sobrinha de Auta (minha avó materna). Suspeitar-se-ia que houve troca de filhas. Tal a proximidade temperamental entre tias e sobrinhas. Dir-se-ia que Beth-Anath e Auta não levariam desaforo para casa e que não teriam “papas na língua”. Diversas vezes, vi Auta em Beth e Quitéria em Maria. O que é muito comum entre parentes próximos.
Ao longo da vida, percebi que a minha Tia, assim como qualquer pessoa, tem muitos defeitos e muitas qualidades e me detive nas características que nela admiro. Desde a letra que vi pela primeira vez naqueles postais à forma de escrever, de falar; a altivez da personalidade à humildade de querer ser melhor a cada dia, reconhecendo-se como ser em processo. Mulher de energia, yoga, hidroginástica e tantas outras atividades – de fazer qualquer um perder o fôlego.
Apesar da distância, muitos foram os bons momentos em que estivemos juntos. De simples passeios a conversas intermináveis. Houve momentos difíceis, certamente. Nada que desmerecesse o respeito e a admiração.
Maria dizia que ela e Beth nasceram no mesmo dia do mês (28) e que as “meninas” (filhas de Beth) nasceram também no mesmo dia do mês (26) e delongava-se numa série de coincidências matemáticas das quais o tempo roubou-me as lembranças. Mas nada apagou da memória o que ela fazia questão de dizer, sempre, que amava Betinha como sua verdadeira irmã e que ficava muito triste quando sabia das desavenças familiares e “aperreios” que Betinha passava. Orava muito para que a harmonia fosse dominante entre mãe e filhos.
Tia Betinha aproxima-se de oito décadas de vida e a minha intenção era a de escrever um parágrafo em homenagem a ela. Entretanto, há material para um livro, “ou mais”, como diria meu primo Walter. Sendo assim, obrigo-me a encerrar este texto com as reticências do muito que ainda ocorrerá. Afinal, “o melhor de Deus ainda está por vir”...