João Mineiro,
Ainda Ontem Choramos de Saudade.



Na manhã de domingo, 25 de março, o mundo da música sertaneja acordou outra vez consternado pela morte de mais um de seus ídolos.

Havia falecido aos 76 anos de idade, na noite de sábado, o cantor João Mineiro. Internado para tratamento hospitalar na cidade de Jundiaí - SP, submeteu-se à retirada de vesícula biliar e teve complicações que o levaram à morte.

Como fã, sempre sou pego de surpresa, quando morrem meus ídolos. A comoção é inevitável. O sentimento de perda é complexo nesta hora.  Embora consciente de que uma grande legião de pessoas esteja comovida, eu, por meu lado, sinto um instante de solidão.

A morte do João Mineiro encerra, em definitivo, a carreira musical da dupla sertaneja "João Mineiro e Marciano — os Inimitáveis". Põe pá de cal sobre o corpo do célebre integrante, sem qualquer possibilidade terrena de uma vez mais poder sua voz entoar-se com a do parceiro Marciano.

A dupla havia se desfeito desde a gravação do 17º disco ("Dois Apaixonados"), em 1992.  Até aí, João Mineiro e Marciano haviam trilhado uma carreira próspera, evolutiva, atraindo fãs de norte a sul do País. A música de João Mineiro e Marciano incorporou-se à vida e ao destino de muitos, preenchendo momentos vazios ou completando instantes plenos de felicidade. É justo afirmar que muitos momentos de cada fã foram profundamente marcados por toda canção de sucesso que a dupla embalou: "Esta Noite como Lembrança", "Viciado em Você", "Seu Amor Ainda é Tudo", "Se Eu Não Conseguir Te Esquecer", "Ainda Ontem Chorei de Saudade", etc.

João Mineiro e Marciano faziam coro com o público adepto da música romântica.     Falavam do trivial existente na relação homem-mulher: a trilogia amorosa, a separação, a paixão, o sentimento desencontrado. Canções melodiosas e mensagens passionais vinham nas vozes com tonalidades fortes, Marciano abrindo memoráveis solos, João Mineiro atenuando versos e notas, assim se constituindo num dos mais aprazíveis duetos que a música sertaneja pode arranjar. Emparelharam-se com Chitãozinho e Xororó, Matogrosso e Mathias, Milionário e José Rico, Trio Parada Dura, Duduca e Dalvan, Sérgio Reis. Conviveram com Gilberto e Gilmar, Cézar e Paulinho, Chrystian e Ralf, Carlos Cézar e Cristiano, Roberta Miranda. Alcançaram Zezé di Camargo e Luciano, Leandro e Leonardo, João Paulo e Daniel, Jayne.

Assim é que ocuparam espaço no competitivo e diverso mundo da música sertaneja, arrebatando jovens e adultos ao mesmo patamar das emoções, levando-os a vincular-se progressivamente coeso com a dupla de "Inimitáveis". Tudo parecia durar para sempre, a música, o sonho, o artista, o fã.

 O anúncio da separação arrasou o universo da música sertaneja. Muito se cogitou e se informou a respeito dos motivos da dissolução. Nada consolou o fã, naquele momento tomado de um sentimento de abandono e infidelidade da dupla para com ele. Outras duplas sertanejas contemporâneas também experimentavam a separação: Milionário e José Rico, Matograsso e Mathias, Ataíde e Alexandre, Trio Parada Dura, e outras da mesma relevância.

O fã de música sertaneja reconhece, separação de duplas famosas é corriqueiro no meio musical, remontando-se aos primórdios e dourados tempos. Por motivos particulares e nunca esclarecedores, desfizeram-se duplas Tião Carreiro e Pardinho, Belmonte e Amaraí, Biá e Dino Franco, Jacó e Jacozinho, Léo Canhoto e Robertinho, isso para ficar entre os notórios.

Nesse vai e vem, o fã acompanha os integrantes de duplas desfeitas partindo à procura de novos parceiros, às vezes com êxito. Raríssimas são as vezes em que o público assimila e acata novas duplas formadas a partir do desmanche de outras. Reservado, consciente ou não, o fã aguarda a reconsideração de seus ídolos separados. Tradicionalmente, as duplas se reconstituem, aparam arestas, revisam posturas e retomam o ponto onde pararam.

O fã, cuja esperança é a última que morre, sempre acolheu e aplaudiu duplas que se refizeram.

Morto João Mineiro, antes e bem recente, morre-se agora a esperança de que Marciano retome a dupla no lugar onde parou há vinte anos.

Autor do primeiro sucesso da dupla, "Filha de Jesus", gravada em 1972, José Marciano partiu de Bauru - SP, deu algumas voltas musicais antes de conhecer João Santângelo, que havia deixado Andradas - MG, para atender também o sonho de tornar-se artista no meio sertanejo. Marciano sempre teve posição destacada na dupla que formou com João Mineiro, a partir da colocação da primeira voz, marca registrada do slogan "Os Inimitáveis". Entretanto, no decorrer da carreira artística, Marciano juntou-se ao compositor romântico Darci Rossi, com quem criou canções que impulsionariam sucesso e trariam mais evidência para "Os Inimitáveis". Canções como "Esta Noite como Lembrança", "O Último Café", "A Bailarina", "Telefone Mais", "Amor e Amizade", "Viciado em Você", e tantos outros sucessos, tudo nasceu da caneta e do violão da dupla Marciano e Darci Rossi. Este  sucesso se antecipou, é claro, ao grande estrondo que a dupla teria repaginando músicas do célebre Moacir Franco: "Seu Amor Ainda é Tudo", Se Eu Não Puder Te Esquecer", "Ainda Ontem Chorei de Saudade".

Marciano buscou sustentar-se na carreira solo, quando sua dupla se desfez. Acabou sendo substituído em definitivo por Mariano (Marciano), quem seguiu com João Mineiro, até o fim. Separados da dupla original, nem um, nem outro, ninguém reconquistou o lugar preferencial dos fãs.

Agora, nós os fãs, em nossa legião, tomamos consciência de que João Mineiro morreu neste dia 24 de março de 2012. Encerra-se um capítulo na música sertaneja, hoje tão maltratada e desvalida em meio a mega sucessos descartáveis, bizarros e adulterados. Junto com Marciano, na história que construíram e nas cançoes gravadas, João Mineiro será eterno, continuará vivo atrelado ao antigo parceiro, e cantarão juntos pelo resto de nossas vidas.

Aos familiares e amigos, concedo-lhes condolências. Com eles, junto-me em fervorosa missão de manter viva a memória do sertanejo que bem representou e melhor cultivou a música brasileira.

Por João Mineiro, ainda ontem choramos de saudade.
 



Discografia de João Mineiro e Marciano
 
Vol. 01 - “Filha de Jesus” (1972)
Vol. 02 - “A Procura da Paz ” (1973)
Vol. 03 - “Chorarei ao Amanhecer” (1974)
Vol. 04 - ”Os Inimitáveis” (1975)- já disponível em CD
Vol. 05 - “Os Inimitáveis - vol. 05 (1976)
Vol. 06 - “Filho de Jesus” - Vol. 06 (1977)
Vol. 07 - “Os Inimitáveis” - vol. 07 (1979)
Vol. 08 - ”Esta Noite Como Lembrança” (1980)
Vol. 09 - “Viciado em Você” (1983)
Vol. 10 - “Amor e Amizade - Dia Sim, Dia Não” (1984)
Vol. 11 - “Os Inimitáveis - Seu Amor Ainda é Tudo” (1986)
Vol. 12 - “Ainda Ontem Chorei de Saudade” (1988)
Vol. 13 - “Se Eu Não Puder Te Esquecer” (1989)
Vol. 14 - “Inesquecível” (1990)
Vol. 15 - “Tarde Demais Para Esquecer” (1990)
Vol. 16 - “Pra Não Pensar Em Você” (1991)
Vol. 17 - “Dois Apaixonados” (1992).
 
- Coletâneas:
“Raízes Sertanejas ” volume 1 e 2
“Disco de Ouro”; “Dois em Um - Dois LPs em Um CD”
“Seleção de Ouro - 20 Sucessos”
“Os Grandes Sucessos - Gravadora Copacabana”
“Bis - 2 CDs”.

Milton Moreira
Enviado por Milton Moreira em 27/03/2012
Reeditado em 27/03/2012
Código do texto: T3578849
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