* Atualmente corto o cabelo numa barbearia localizada no meu antigo bairro. Sento na cadeira e não preciso dizer nada.

O cabeleireiro já conhece bem os detalhes do corte.
 
Esse cidadão é cunhado de outro rapaz, que era o cabeleireiro original, o meu preferido.
 
Cortei com ele durante oito a nove anos.
 
Ele, paralelamente à barbearia, ficava responsável por uma rifa a qual oferecia carros.
Nunca me interessei pela rifa.
 
* Após o correr dos anos, a ocupação com a rifa ganhou ênfase.
 
Ele mal parava na barbearia.
 
Algumas vezes liguei perguntando se ele estaria na barbearia.
Corria para aproveitar a chance se ele pretendia aparecer.
 
Recordo que, numa das últimas vezes, ele parou, com bastante pressa, somente para cortar o meu cabelo.
 
* Percebendo que cortar com ele já não seria mais possível, comecei a experimentar o corte do cunhado dele, permaneci até hoje.
 
Sobre o cabeleireiro que preferiu as rifas e resolveu ofertar todo o tempo a essa atividade, tive a oportunidade de questionar se valia a pena a dedicação às rifas.
 
Considerando o numero grande de clientes os quais optavam pelo seu corte, por que não dar ênfase somente à barbearia?
 
* Várias vezes eu brinquei:
 
“Você corta o cabelo de todos, mas não quer que ninguém corte o seu!”
 
Dizia isso, pois ele deixou o cabelo crescer bastante.
Fez questão de se transformar no cabeleireiro cabeludo.
 
Depois de abandonar definitivamente a barbearia, duas ou três vezes, ele, muito cortês, parou o carro perguntando se eu queria carona.
 
* No último sábado, o cabeleireiro cabeludo foi assassinado.
 
Comentaram que o crime foi motivado por dívidas excessivas.
 
Parece que, quando eu questionava as rifas, estava prevendo a grande tragédia a qual ocorreria.
 
A notícia me abalou demais.
 
* Paradoxalmente, nós, eternos devedores, os quais tanto necessitamos eliminar as dívidas adquiridas durante a jornada terrena, beneficiando assim os nossos credores, Deus e a existência muito desprezada com bobagens ou coisas inúteis, não sabemos perdoar as dívidas alheias.
 
Nós não conseguimos esquecer os débitos humanos, os altos valores, também os pequenos débitos.
Nada!
Nem sequer centavos nós podemos dispensar.
 
Não! Se não pagou, pague já!
 
Caso a dívida permaneça, restará fazer o devedor pagar com a vida.
 
* Eis a triste sorte do cabeleireiro cabeludo, um cara legal que, na sua antiga barbearia, costumava deixar exposto o diploma referente à escola de cabeleireiros a qual o preparou.
 
O meu cabelo ficou acostumado com o seu corte especial.
 
Quando eu comecei a cortar com ele, enquanto a rifa era apenas uma atividade extra, ele ainda não era um cabeludo, porém sempre foi um ótimo cabeleireiro.
 
Várias vezes o colega de barbearia ficava esquecido e solitário, pois a maioria dos clientes optava por cortar com o futuro cabeludo.

Todos preferiam cortar com ele! 
Infelizmente ele preferiu as rifas!
 
Um abraço!
 
Ilmar
Enviado por Ilmar em 14/11/2013
Reeditado em 14/11/2013
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