E foi assim que "aconteceu entre a gente............."

Um dia sentado em algum lugar, em alguma cidade, sem nada para fazer enquanto aguardava ser atendido pela atendente, displicentemente comecei a folhear uma revista. Tenho o vício de nunca ficar aguardando sem ler nada, sem aprender alguma coisa, neuroticamente aprender algo todos os dias, mesmo que a notícia seja ruim e sem muita importância. Naquele dia sem saber de nada aprenderia o amor, aprenderia a encontrar uma das pessoas mais lindas e generosas que tive o prazer de conhecer e depois “ser obrigado” a esquecer. É claro, nunca se esquece alguém especial dessa maneira, fingimos que a esquecemos, enganamos a nós mesmos para não sofrermos muito!

Ela, com um jeitinho simples e em poucas palavras, solicitava correspondentes no Brasil nas últimas folhas da revista. Eu sempre amei conhecer pessoas diferentes de outros lugares através de cartas, de postais, ver as suas letras, conhecer as suas estórias, seus problemas e seus sonhos. Já tive em torno de 100 correspondentes de todas as partes do mundo, incluindo, é claro, o Brasil. Anotei o nome dela F.R. (aqui abreviado para não a comprometer, sabe como é a vida!) o lugar, com o CEP e o nome da rua dela. Fui embora e guardei o papel na carteira. Era uma sexta feira e no sábado eu comecei a escrever para ela, sem muita coisa, somente testando para ver se uma pequena ou grande amizade nasceria daquela pessoa. Escrevi somente uma folha com informações que achei seria relevante para o começo de uma amizade. Passaram alguns dias e recebi a sua resposta, letras grandes demais (eu achei). Ela era engraçada (ainda é) e escrevia no lado de fora do envelope também, escrevia para o carteiro, mandava um alô para ele, caso a carta não pudesse ser entregue. Ri muito, achei-a totalmente louca. Mas respondi assim mesmo, depois de alguns dias.

Quando a amizade se tornou mais animada e viramos amigos mais íntimos, nos despedíamos por brincadeira com “beijos molhadinhos”, o que de certa forma começou a aguçar a nossa curiosidade. Muitos anos se passaram e a correspondência sempre firme, fotos para cá, fotos para lá, nos ligávamos às vezes, achava o sotaque dela um pouco engraçado, mas os beijos molhadinhos sempre no final das cartinhas.

Bem, sabíamos que um dia iriamos “ter” que nos encontrar para darmos o tal do “beijo molhadinho” ao vivo e a cores. Mas parecia que esse tempo não chegava nunca, talvez para fazer do momento algo único, para realmente fazer os nossos corações bater loucamente, para deixar o nosso desejo cada vez mais sedento do “beijo molhado”, era uma espera que de certa forma nos deixava até irritados porque o coração e o corpo não sabem esperar, são inimigos declarados da razão!

Entre umas cartas e outras, ela anunciou que estava vindo para São Paulo e queria me ver, viria fazer um curso e me deu o endereço de onde seria o curso..........Um arrepio intenso percorreu não só o corpo, mas também a alma, mas foi uma alegria imensa saber que eu teria de “enfrentar” o momento quando eu finalmente teria o gosto do beijo dela. Amo desafios de todos os tipos, culturais, provas, testes, provar para mim mesmo algo ou tudo, provar para mim mesmo nada, provar o beijo molhadinho dela, dessa vez! Ela tinha/tem um rosto normal, boca normal, corpo normal, tudo normal menos o carisma, o carinho, a sensualidade, o amor com que falava e me olhava, nada normal na generosidade daquela criatura a princípio tímida depois “nem tanto”. Notei que a “F” tinha uma mania de entreabrir os lábios o tempo todo quando nos encontramos e tomei isso como sendo o desejo de trocarmos de uma vez por todas aquele beijo tão sonhado de talvez mais de 10 anos de correspondência, quanta espera!

Anotei o número do voo no Cumbica, o dia, a hora (acho que foi às 17h) e fui todo cheiroso, cortei o cabelo no mesmo lugar onde achei o nome dela na revista (sou fiel no comércio, quando gosto não saio de lá), comprei uma camisa nova (geralmente compro somente livros), peguei o meu carro e fui lá. Geralmente estaciono na vaga B4 (“before” em inglês para não esquecer) quando vou ao Cumbica. Com esta sigla eu não preciso memorizar e nem anotar em lugar nenhum por ser uma preposição que uso constantemente em minhas aulas. Raio, todos os B4s ocupados, tive que estacionar em outro lugar. Queria ainda chegar bem cedo, me esconder em algum lugar para ela achar que eu não tinha ido (coisa de criança apaixonada, é claro que ela sabia que eu estaria lá), queria tomar um café, comer um doce. É claro, escovar os dentes também, comprar todos os Halls Pretos do Cumbica (sou viciado neles) Um nervosismo horrível, um desejo louco de vê-la de uma vez, ver o seu sorriso, curioso de saber o que ela estaria vestindo, ela gostava de calças de panos leves, camisetinha, era magra, delicada, cabelos propositalmente descuidados (charme de mulher!), queria sentir o perfume dela, já que por carta não dava para saber, somente saber o nome! O tempo do voo foi se aproximando e eu tentando me acalmar falando comigo mesmo, cantando a nossa música, assoviando para o nada, disfarçando uma calma que eu estava longe de sentir, disfarçando uma alegria que poderia explodir a qualquer momento. Olhando para o painel do aeroporto o tempo todo (Terminal 2) até que o número do voo apareceu como “confirmado”. Meu Deus, e agora? Passaram mais alguns minutos para eu ler a mensagem “pousado” e daí quase precisei de um cardiologista porque sabia que dentro de alguns minutos o rostinho dela apareceria naquela porta maravilhosa que traz para a maioria das pessoas que vão ao Cumbica uma alegria imensa de rever entes queridos, voltando para a casa depois de longas viagens. Para mim seria muito mais do que um ente querido, seria uma espera de mais de 10 anos. Pousou e o pessoal começou a descer. Brinquei comigo mesmo dizendo que a Lei de Murphy me persegue (e é verdade!) porque mais de 70% das pessoas do voo saíram por aquela porta e a “F” não saia. Por que ela não saiu no meio das primeiras que saíram? Sempre aquela pessoa que esperamos não está no meio das pessoas que passam por nós. Por que será?

E lá ela apareceu, me viu de longe. Esqueci completamente de me esconder, para que? E abriu o sorriso mais lindo que já vi. Quando saiu pela porta, recebi o abraço mais lindo, mais gostoso, mais duradouro, mais perfumado que um homem pode receber de uma mulher. Simplesmente me falou: “Oi Edu, tudo bem? ” Não, eu não estava bem, o amor e a falta dele não me deixam bem, não me deixam felizes se eu não os tiver. O saguão de espera não seria o melhor lugar para o beijo tão esperado, pacientemente, como todo o professor paciente, esperei. Ajudei com as bagagens e fomos para o estacionamento. Dentro do carro então uFAaaa.... explodimos de paixão, de amor, de tesão, de sofrimento de tanta espera, de alegria. Queríamos eternizar aquele momento como em uma foto, escutamos a nossa música no carro e trocamos muitos, dezenas de beijos molhados de amor, de sede de amor...............Bem, é claro que tem mais, muito mais, bem mais do que imagina a minha vã imaginação. Muitas coisas não posso contar, foram omitidas a melhor parte de tudo isso, de tudo o que um homem apaixonado espera de uma mulher especial..............mas quero deixar aqui registrado que conheci a mulher mais linda e mais especial que um homem pode ter conhecido, e ela ainda existe e o mundo ao redor dela é mais bonito, as pessoas mais felizes ao redor pelo simples fato dela ainda existir. Ainda é linda, ainda é generosa, ainda é especial............ainda não é minha!

Beijos molhadinhos, querida amiga!

https://www.youtube.com/watch?v=9EHAo6rEuas

Paulo Eduardo Cardoso Pereira
Enviado por Paulo Eduardo Cardoso Pereira em 15/05/2015
Reeditado em 11/06/2015
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