Clóvis e Aleph

Inspirada em Borges, no conto Aleph, homenageio nosso querido amigo Clóvis Molinari Junior.

Aleph é a primeira letra do alfabeto de idiomas semíticos, significa infinito.

Quando criança descia ao porão da minha avó, onde com medo aguardava o anoitecer. No escuro junto ao baú de roupas antigas, bonecas de louças, bicicletas quebradas percebia fantasmas da minha origem. Surgiam pessoas estranhas familiares, círculos, o planeta, florestas, oceanos, junto à prazerosa sensação do desconhecido infinito.

Na adolescência, ao entardecer caminhava até o rio buscando a grande pedra, onde sentada esperava a escuridão. O pio da coruja, o martelar dos sapos, o som das águas. Quantos seres ali habitavam?

Na juventude já não estava só. Na sala quadrada da André Cavalcanti curtíamos som e imagem. Clóvis apresentava seus achados preciosos – filmes antigos, desenhos animados, mímicas jamais vistas por mim. Ele generosamente explicava o que na pequena tela já impressionava.

A preocupação com estudar formar e trabalhar me impediam de ser inteira naqueles momentos verdadeiros. Era sempre à noite que o desconhecido permitia seu espaço.

Numa tarde de semana me concedi um lugar na sala quadrada. Encontrei Rosanna e Leo, desenhando com a ponta de um compasso um grande rolo de filme. Eles maravilhados descobriam como fazer um desenho animado...assim surgiu LISSERGIA.

Clóvis agradecemos dividir conosco sua sabedoria. Hoje sentimos sua falta nesta sala, mas pensamos sua permanência no infinito - o primeiro entre nós a desvelar o Aleph.