CARTA PARA MINHA QUERIDA MÃE.

Querida mãe, na madrugada do dia dezesseis de março de dois mil e vinte e um, uma saudade invadiu meu coração. Estou convicto, que isso acontece por saber que não terei mais seu abraço na medida certa de aconchego e carinho. Demorou, mas hoje eu tenho convicção que não nos veremos mais neste plano terrestre. Quando a senhora se foi, um vazio se abriu dentro do meu coração e sinto que ele permanecerá até a minha partida também. É uma dor inexplicável! É como se eu tivesse voltado a ser criança, no estado de gestação dentro do seu útero e vendo alguém sem rosto cortando o condão umbilical e dizendo para o meu coração: Agora você se tornou homem de verdade, pois seu anjo protetor neste mundo precisou voltar para onde todos os espíritos retornam um dia. A senhora se foi, como aquela estrela cadente que em milésimos de segundos surge em nossa frente, causa tanta emoção misturado a um rastro de amor e depois desaparece. Um filme passou pela minha mente, onde o enredo era você e eu. Nunca passou pela minha cabeça que a sua partida ia doer tanto! Sabe mãezinha, eu sempre soube que a passagem do tempo havia me tornado um ser humano mais intrínseco e fechado. Tento entender como isso ocorreu, mas acredito que foi pelas duras lutas que travei com a vida para chegar onde me encontro. Quantas vezes fechei os meus olhos e o coração, aos que me apedrejavam sem nenhum motivo aparente. Isso me deixou menos emotivo na arte de expressar os meus sentimentos a qualquer pessoa. Mãe, aonde você estiver quero que ouça essas palavras: por mais que não demostrasse todo aquele carinho de criança, eu sempre te amei! Em nenhum momento eu desconsiderei a minha identidade de filho da mulher mais guerreira e sensível que conheci neste plano terrestre. Eu sei que o fato da senhora não poder oferecer uma vida material mais abastarda aos seus filhos lhe incomodava. Mas isso, não foi o suficiente para eu deixar de amá-la de maneira imensurável! O seu amor por mim e pelos meus irmãos superou as nossas dificuldades financeiras. Isso é tão verdade mãezinha, que seus filhos estão todos criados! Graças a sua luta. Minha rainha, eu nunca esquecerei o dia em comemoração as mães, quando lhe presenteei com uma bela poesia, e você com os olhos cheios de lágrimas me deu um abraço apertado e me agradeceu. Ainda teve tempo de me confidenciar que o seu maior sonho de menina adolescente, era ser escritora. Hoje, isso ficou mais vivo em mim pois deixastes cartas endereçadas aos seus filhos aconselhando-os e demostrando todo o afeto que tinhas por mim e por eles. Entretanto, sei que as circunstâncias da menina pobre que precisou trabalhar cedo e cuidar do primeiro filho, ainda adolescente não permitiu você realizasse esse sonho. É uma pena, pois tenho total convicção que seria uma excelente escritora porque a senhora tinha a essência que todo bom escritor deve ter: a sensibilidade de ouvir o coração primeiro e depois a razão. Nada neste mundo supera um coração puro! Mãe, eu precisei ir na sua casa procurar documentos para agilizar o seu velório, e muitas lembranças começaram a manifestar-se em minha mente. Primeiro porque havia esquecido o quanto eras organizada em tudo que fazias. Os documentos estavam ali, organizados em pastas cada qual no seu devido lugar com seus respectivos nomes. Aí mãe, lembrei das vezes que você me levava para o seu trabalho, quando não tinha ninguém para ficar comigo em casa. Recordo me de você sentada junto a sua mesa organizando os documentos públicos e os despachando para os respectivos departamentos. Aquela letra tão linda, sempre brincando com os colegas de trabalho com aquele sorriso que hoje me faz tanta falta. Quando abrir as pastas de documentos em sua casa, me deparei com a folha de papel em que eu havia escrito uma poesia exatamente em comemoração ao dia das mães. Confesso que não segurei as lágrimas, chorei copiosamente! Afinal, já faziam décadas que eu havia escrito tal poesia e você guardou com todo o carinho. Sabe minha linda, não está sendo fácil viver sem a sua presença física. Aqui e acolá as lembranças invadem a minha cabeça, começo a sentir o seu cheiro, ouvi a sua voz quando me chamava. Talvez a senhora não quisesse me ouvir dizendo estas palavras, mas um pedaço mim foi junto com você. É como se a vida tivesse perdido um pouco mais o sentido. Hoje, eu me sinto na idade de oito ou nove anos, me sentindo um ser desprotegido lembrando os dias em que precisavas viajar e não podia me levar. Eu ficava com muito medo, inseguro e desprotegido. Uma dor que não passa e nem com a presença dos meus filhos que tanto os amo, não conseguem suprir essa falta. Aliás, sobre meus filhos havia um segredo que por covardia ou medo eu não pude compartilhar com você em vida, e isso tem doído muito no meu coração. Mas tenho a certeza que com o seu jeito sábio e coerente irias me mostrar o melhor caminho para conduzir essa situação. Eu espero mãe, que onde você esteja, seja um lugar de paz e descanso porque a vida aqui nesta terra para você não foi fácil, mas com muita garra e determinação de uma autentica mulher do Norte, você conseguiu o lugar neste espaço de tantas injustiças. Não se preocupe porque sempre estarás no coração e na memória dos seus filhos, dos netos e bis netos como uma mulher que em vida sobe cumprir com toda a sabedoria o papel de ser mãe e avó. Vai em paz Dina Melindre, e nunca se esqueça que teus filhos te amam e continuarão te amando para toda à vida. (MJ)