CAUSOS DO MEU AVÔ: A TRAGÉDIA DO MOISÉS

Quando eu era criança, não tinha TV nem rádio, muitas noites a gente se reunia ao redor de uma fogueira e ia escutar os causos do meu avô materno. Com sua voz mansa, no idioma "caipirês", ele prendia a atenção. Ele contava muitas vezes a pedidos, um causo em verso, chamado "O causo do Moisés" onde o personagem perdia um a um seus onze filhos. Não era comédia, era tragédia. Me lembro apenas do primeiro verso, afinal foi ha mais de 50 anos. O restante dos versos foram feitos por mim, mas o mote é o mesmo.

Eu vô contá proceis,

O causo do Moiseis,

Ele tinha onzi fio,

Morreu um, ficô só deis

Dos deis qui ficaro, Foro andá de artomove, Morreu um, num disastre, Dos deis, ficô só nove

Dos nove qui ficaro,

tava um com a vizinha no coito,

Chegô o marido armado, atirô,

Dos nove, ficô só oito

Os oito que ficaro, da puliça, Apanharo de cassetete, Das pancada, morreu um, Dos oito... ficô só sete

Dos sete que ficaro,

Na zona, brigaro outra veis,

Isfaquiado, morreu um,

Dos sete, ficô só seis

Os seis qui ficaro, Trabaiavam com afinco, Um cortô o pé, cum a inxada, Azangô... morreu, ficô só cinco

Os cinco, que ficaro,

Foro caçá no mato,

uma bala perdida achô um,

Dos cinco ficô só quato

Os quato que ficaro, Foro marcá umas reis, Um nelore pegô um deles, Dos quato, ficô só treis

Os treis que ficaro,

Foro coiê arrois,

Cascavel mordeu um deles,

Dos treis ficô só dois

Os dois que ficaro,

Foro caçá articum, Um lobo pegô um deles,

Dos dois, ficô só um

O Um, que ficô,

Era mitido a pião,

Morreu pisutiado,

Nos casco dum alazão

A véia, quando sobe, Ficô muito revortada, Meteu os peito no rio, E morreu afogada

O véio, quando sobe,

Quais qui morre de paxão

Pulô dibaxo dum trem,

E acabô, a geração.

* * *

HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 29/07/2008
Reeditado em 31/07/2008
Código do texto: T1102357