LEMBRANÇAS DE MINHA TERRA

No sertão é tudo muito mais original e a vida tem um gostinho especial. Entendemos que parece rima barata, mas que é verdade, isso é. Apesar, da paisagem rude os homens e mulheres possuem um coração mais aberto, sem excesso de preocupações com a hora, exceto se estiver em risco algum compromisso inadiável.

A bravura do sertanejo do Nordeste não é coisa de ficção cinematográfica: sai do peito e da raça. As vezes costumamos enfatizar que: “fulano é um cabra macho; macho pra encardir... O fundo da calça...”.

Falando sobre a bravura do sertanejo, conta-se que nos idos da década cinqüenta ou sessenta, o cine Salgueiro apresentava mais um faroeste. O mocinho, cujo revolver com apenas seis balas não se esvazia nunca, estava numa grande enrascada por que: surgira um bandido por trás de umas pedras e ia atirar no herói. Foi quando, da platéia, um conterrâneo resolveu dar uma mãozinha: “Seu Durango Kid olha o cara atrás das pedras”.

Com se ouvisse aquilo o Durango dá um giro nos próprios calcanhares e crava uma balinha entre os lindos olhos do bandido. Que sufoco, hein?! Ainda bem que o “piolho de cinema” estava atento...

Cinema e futebol não podiam faltar, nas tardes de domingo. Primeiro, o “matinê”, no Cine Salgueiro, depois o “grande clássico” no Estádio Salgueirão, onde só não valia uma coisa: o time de casa sair perdendo.

Especialmente aquele domingo, após assistir a película “Tarzan, o Vencedor”, a Seleção Estudantil, não conseguia passar do empate. Já estávamos no segundo tempo de um jogo irônico em que tanto o nosso time jogava mal, como o time de fora jogava bem. Novo ataque dos adversários com um dos laterais passando por tudo quanto era gente, velozmente invade a grande área, dribla o goleiro e tão certo quanto dois e dois não são cinco, levaríamos o gol da derrota, o juiz apita alguma coisa.

Confusão danada pra cima do árbitro, que a essa altura já esta sendo chamado de viado, filho dessa e daquela outra e outros adjetivozinhos mais e, finalmente os devidos esclarecimentos do árbitro: “Invasão de área com excesso de velocidade!”

Bom mesmo é recordar as coisas da terrinha da gente.

Modéstia à parte, lá em minha terra existe estórias mais engraçadas do que as estórias da “terrona” de muita gente; Afinal de contas, dificilmente encontraríamos por aí, políticos com força de elefante.

O cidadão era iletrado embora populista e isso o tornara “bom de urnas”. Não era de muitas palavras e seu estilo político era o cochicho de pé-de-orelha (se é que orelha tenha pé).

Como até mesmo “araruta tem seu dia de mingau”, o camarada resolveu fazer o uso do microfone para um discurso: “brasileiros e brasileiras... (tanto falava como coçava o bigode). Eu que subo nesse palanque com a força de um elefante...”

Foi quando um gaiato de plantão gritou: “Cadê a tromba?”.

“Quando eu descer respondo no “pezinho da oreia” – completou.

Diziam também que, numa cidadezinha próxima, o prefeito resolveu viajar para capital.

Segundo informou, pra uma conversinha com sua excelência (o Governador do Estado).

Fazendo o desjejum, colocava adoçante no café quando o garçom curioso pergunta: “O senhor é diabético?”

“Não meu filho, sou o prefeito de Vila Formosa”.

Dizem que é vivendo que se aprende, e a verdade é que após a conversa no “pé da oreia”, mostrando onde estava a “tromba do elefante”, o nosso conterrâneo virou piolho de microfone, pegava o dito–cujo e prometia: “Brasileiros e brasileiras: se for eleito... vou dar sombrinha as muié e capa aos zomem; seu for eleito educo branco, educo negro...”. Perdeu as eleições porque o eleitorado teve medo dele cumprir a primeira promessa.

Nos anos dourados, em minha querida terra tinha até um sujeito que virava garapa (mistura de água com açúcar).

Morava longe e trabalhava pra lá de onde o vento faz a curva. Quando passava pela rua a rapaziada por trás da esquina ensaiava um corinho: “Água... açúcar...” E ele fulo da vida: “Mistura fio da mãe, mistura fio da mãe”...

Final de ano, a época mais esperada, o pessoal da roça “invadia” as ruas pra olhar as festas. Pessoal muito simples desconhecia coisas como banheiro bem equipado.

Passando diante da porta do banheiro, um parente apontando pro bidé perguntou pro outro: “Que danado será isso?”; “Sei lá” – responde o outro. “Deve ser um lavador de pratos!”.

Parodiando o saudoso Patativa do Assaré: “Conte de lá, que eu conto de cá”...

Chagas dhu Sertão
Enviado por Chagas dhu Sertão em 26/12/2008
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