O RETRATO
— Tiro o retrato de sua filha, minha senhora, sem compromisso. Só fica com ele se gostar...
Tanto insistiu o retratista que a mulher acabou cedendo. Recolheu a menina, produziu-a com capricho da cabeça aos pés, depois ajudou o homem a escolher a pose.
Ele retornou, dias depois, exibindo o retrato numa atraente moldura de arabescos dourados.
— A menina não ficou uma graça? E veja só que moldura de primeira!... Isso tudo pela bagatela de 50 reais.
A mulher examinou a obra sob vários ângulos, com intenso brilho nos olhos, quase não conseguindo dissimular o interesse. Porém se conteve e regateou:
— Não quero não... É muito caro!
O retratista, tentando convencê-la de todos os modos, destacou o trabalho artesanal da moldura, realçou a qualidade do papel, elogiou o dom fotogênico da garota; por fim, reduziu para 35 reais. Tudo em vão. A mulher não amoleceu e ele escafedeu-se.
Na semana seguinte, lá estava de novo o retratista, com a mesma mercadoria debaixo do braço, mas com nova estratégia na cabeça.
— A senhora tem mesmo muita sorte! Entre mais de duzentas, a foto de sua filha foi uma das poucas selecionadas.
— Selecionadas pra quê? — quis saber a mulher.
— Para a promoção. Poderá agora adquirir o retrato pela metade do preço. Uma pechincha! No fim das contas, a senhora acaba pagando apenas a moldura.
Depois de refletir um pouco, ela propôs:
— Olha, moço, o senhor deixa o retrato comigo. Vou mostrar ao meu marido. Amanhã, quem sabe...
Na terceira visita, o retratista chegou animado, certo de que nessa queda de braço sairia vencedor. A dona da casa, entretanto, recebeu-o no portão com cara de poucos amigos, devolvendo-lhe de imediato a moldura.
— O que é isso, dona? Cadê a fotografia?
— O senhor não disse que eu pagaria só o preço da moldura? Pois então fique com ela. A mim interessa apenas o retrato!
* * *