O PICADINHO DO ONOFRE

Autor: Jorge Gibbon

Onofre gostava de cozinhar. Morava sozinho e tinha a culinária como hobby, inventava pratos e convidava os amigos para experimentá-los. Não era um mau cozinheiro, e como todo mundo gosta de uma boca livre, sempre choviam elogios dos convidados. Então Onofre ficava feliz, muito feliz ! E para retribuir os elogios dos amigos, criava novos pratos, convidava novamente os amigos e o ciclo se repetia. Onofre era o cara, o cozinheiro da turma, todos gostavam dele. Em contrapartida, Onofre gostava da sua turma, e tudo corria às mil maravilhas.

Certo dia, porém, a turma resolveu fazer uma surpresa. Chegaram em grupo na casa de Onofre, cerca de dez pessoas.

- E aí, Véio ! Sai um rango aí ? Trouxemos umas coisinhas...

Além de muita cerveja, tinham levado alguma carne e temperos. Onofre olhou, pensou, e não encontrou muita alternativa. Abriu a geladeira, pensou um pouco e por fim resolveu fazer um picadinho para alimentar o bando de visitantes. Enquanto bebericava um conhaque, colocou a carne para cozinhar junto com alguns temperos. Alguns amigos se acotovelavam na cozinha, em animada conversa. Só pra impressionar, Onofre jogou o resto de seu conhaque na gororoba e tacou fogo.

- Oooohhhhh, todos disseram.

Por fim, misturou um pouco de mostarda, catchup e creme de leite que sobrara de uma receita da véspera. Só “pra render”, afinal tinha muita gente e a carne era pouca. Serviu o picadinho com arroz e salada, e como de costume, todos elogiaram. Rasparam o fundo da panela, não sobrou nada ! Onofre, comovido, agradeceu. E a cervejada correu solta, como de costume também.

No dia seguinte, estavam todos reunidos no bar da esquina, comentando sobre o picadinho na casa do Onofre, quando de repente chega o próprio: mal, cara de defunto, ligeiramente verde. Ninguém entendeu nada.

- Quequifoi, Onofre. Tu tá te sentindo mal ?

- Não ... Sim ! Acho que aquele picadinho me estragou, tô meio mal. Ô Filomeu, me traz uma água com gás.

Filomeu, o garçon, custou a entender a ordem, não era normal. Nunca tinha visto Onofre pedir água, mas obedeceu.

O tempo foi passando, a turma não esqueceu do picadinho e lá pelas tantas estava novamente todo mundo na casa do Onofre. E tudo se repetiu, Onofre fez o picadinho, todos comeram e aplaudiram, estava excelente. E novamente ele comeu e ficou mal. Se estragou, conforme suas próprias palavras.

No dia seguinte, ao encontrar a turma no bar, foi logo decretando:

- Acabou. De hoje em diante não tem mais picadinho lá em casa. Peçam o que quiserem, mas picadinho não !

- OOOOOhhhhhhhhhh !, respondeu a turma.

- Picadinho não !!!!!

- OOOOOhhhhhhhhhh !

- Ok. Picadinho sim, mas eu não como !

Onofre fez ainda muitos picadinhos depois desse entrevero, e comeu algumas vezes pra acompanhar o pessoal. E sempre passava mal, “se estragava”, como costumava dizer. A turma costumava chamar o prato de “o picadinho que estraga o Onofre”, no começo. Depois, virou o “estraga Onofre”. Até que, por uma corruptela da linguagem, o nome mudou, e passou a ter o nome pelo qual é conhecido hoje: Strogonoff , aquele que “estraga o Onofre !”