EURÍPEDES II - O MEDO DA SILMARA LÚCIA

(Quem quiser detalhes sobre Eurípedes, leia EURÍPEDES)

Todas as crianças que conheciam o Eurípedes tinha medo dele. Silmara Lúcia,minha filha caçula, na época com seus seis anos, pelava de medo do Eurípedes, não que eu incentivasse este medo, muito pelo contrário, mas todas as crianças que ela conhecia tinha medo, por que ela não teria? Hoje, ela com vinte e dois anos, grávida do Pedro Henrique, que nascerá no início de outubro, fica lembrando e falando: "Que bobagem, ter medo do Eurípedes, só sendo coisa de criança mesmo."

Pois bem, um dia fomos, eu, Silmar, meu marido, e Silmara Lúcia ao armazém do Zé Vieira. Na minha cidade, naquela época ainda tinha armazéns, quem é da minha geração para trás sabe o que é, mas os jovens, como a Prisca do Rio de Janeiro, com seus quatorze anos, não deve saber bem o que é. É um comércio, um mercado, onde se vendia tudo o que imaginava se não fosse perecível. Os grãos ficavam condicionados numa tulha, que é um caixotão de madeira com tampa e os compartimentos separados, ali colocavam arroz, feijão, milho, café sem torrar e vendia aos quilos. Poderia comprar cem gramas de arroz, duzentos gramas de feijão, o quanto o freguês quisesse. O cliente hoje era o freguês do passado. Vendia utensílios de cozinha, panelas, copos, pratos, baldes (que eram de alumínio), balde de plástico, é coisa nova, penico (esmaltado), etc, o que podia pendurar, pendurava-se espalhado pelo armazém, quem era mais alto um pouco, saia batendo a cabeça em balde, penico, bacia o que tivesse pela frente. Vendia veneno pra rato, tudo ali misturado, e vendia também rapadura.

Entramos no armazém e quem estava lá comendo rapadura? O Eurípedes. O Silmar entrou na frente e eu atrás com a Silmara Lúcia segura pela mão que já foi se escondendo atrás de mim quando viu o rapaz.

Chegamos perto do balcão. O Eurípedes chegou perto da Silmara Lúcia, pois era uma pessoa indefesa e gostava das crianças, e disse: "Você quer uma rapadurinha?" Falou com sua voz arrastada e sílaba por sílaba. Eu comecei a rir e falei: "Aceita, Silmara Lúcia, a ra-pa-du-ri-nha." Esta menina quase desmaiou. De branca ficou transparente e balançando a cabeça negativamente. Aí eu disse para o Eurípedes que ela era boba e não queria e tratei de proteger minha filha senão ficava sem ela.

Todos nós, não perdemos oportunidade, quando temos rapadura em casa, oferecemos para Silmara Lúcia: "Vo-cê quer uma ra-pa-du-ri-nha?"

Maria Lúcia Flores do Espírito Santo Meireles
Enviado por Maria Lúcia Flores do Espírito Santo Meireles em 17/08/2006
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