O coelho de cada um.

Não me conformo com o sentido grotesco da "morte" que para mim finaliza e acaba com tudo. Depois da "morte", para mim, só a "morte" mesmo. Nada dessa estória de que há vida depois da "morte".

- Alguém conhece um "morto" que tenha voltado e dito como é lá?

A "morte" é, portanto, a coisa mais sem graça e sem sentido que espera pelo homem desde sua concepção.

Nascemos, uns normais e outros deficientes; estudamos durante nossa infância, adolescência, idade adulta e, porque não, até o fim de nossos dias; trabalhamos a vida inteira na busca de nossa satisfação pessoal, reconhecimento profissional e, como consequência, ganhar dinheiro para realizarmos nossos desejos materiais; enfim, nos aprimoramos desde que nascemos para enfrentar essa vida dura, desigual, cheia de surpresas e, para tanto ainda, temos que renuncir aos melhores prazeres e confortos que o mundo moderno poderia nos proporcionar porque isso não foi feito para os mortais comuns como nós.

Nunca estão ou estarão ao nosso alcance.

Portanto, qual é a graça da vida? Pagar imposto de renda, impostos de todos tipos, financiamento de uma casa por trinta anos, lutar para conseguir fazer um plano de saúde que pode nos custar cinquenta por cento do que ganharemos em um ano de trabalho, tudo só para nos sentirmos inseridos no contexto social que nos é, diuturnamente, imposto por medíocres convenções?

Na verdade, se pensarmos friamente, nada na vida é interessante porque, certamente irá acabar com a nossa "morte".

Que sacanagem. Morrer depois de tanta luta desigual; essa é nossa única certeza!

Eu, de maneira totalmente subjetiva, acho que seria muito mais interessante se a coisa, lá no fim, se resolvesse assim:

Nasceríamos e no mesmo dia, juntamente com o nosso nascimento, do nada, ao lado do nosso berço lá na maternidade ainda, aparareceria um "filhote de coelho" que nos acompanharia até o fim dos nossos dias devidamente programado a proceder da seguinte forma.

Como ele estaria sempre ao nosso lado, à medida que os anos fossem passando o coelho iria crescendo à medida que nós iríamos diminuindo, logicamente, resguardadas as devidas proporções para que pudéssemos chegar até onde estaria traçado para nós chegarmos.

Assim, quando estivéssemos próximo de deixar de existir, o "nosso coelho", forte e crescido ao longo dos anos, sairia em disparada sem que nada pudesse vir a detê-lo e assim, quanto mais o bicho se distanciasse de nós, menores iríamos ficando até desaparecermos totalmente.

Nossos familiares chegariam em nosso "leito de morte" e ao invés de nos encontrarem moribundos ou mortos encontrariam apenas e tão somente, o nosso pijama, o nosso chinelo ao lado da cama, o resto de nossa água no copo ou comida no prato deixados alí por nós, para sempre.

Nada que uma boa faxina não resolvesse de vez.

Não existiria, enterro, defunto, choro, flores, reza, hipocrisia, enfim, nada mais que os fizessem lembrar de como éramos, além também, de se livrarem de vez e para sempre do "nosso coelho" que sumiria no mundo gastanto sua energia acumulada ao longo dos anos ao nosso lado, até gastar tudo de uma só vez.

A morte é a maior sacanagem da vida.

Me sinto frustrado ao pensar nela como é, o fim de tudo, após anos e anos de lutas e desejos não alcançados, além de frustações constantes que se perenizam durante toda a nossa existência.

Abaixo à "morte".

Ágora Atheniense
Enviado por Ágora Atheniense em 05/09/2006
Reeditado em 06/09/2006
Código do texto: T233502