Mal entendido
Paulo explicou como torcera o pulso da mão esquerda no banheiro: a toalha de banho estava no chão; acidentalmente, ele enroscara os pés nela, se desequilibrara e ao cair apoiara a mão de mau jeito na borda da privada. Todos duvidaram dele.
Seu irmão mais velho:
- Que conversa pra boi dormir! Por que você não fala logo que mandou ver com muita força?
Seu pai:
- Não sabia que a gíria hoje em dia era essa.
O médico que examinou o pulso:
- Ah, claro. Mas cá entre nós, vai devagar na próxima, rapaz! Lembre-se que você tem outra mão.
Seu melhor amigo:
- É triste ver quando as pessoas tentam omitir a violência dos seus atos.
O professor de educação física:
- Desculpa esfarrapada. É nisso que dá praticar certos esportes individuais.
E Paulo ainda teve que ouvir coisas do tipo:
- O negócio aí foi intenso, hein?
- Olha o que acontece quando a pessoa põe muita força na vontade?
- Aí está o cara que não descansa na hora de soltar pipa.
Logo procuraram arranjar-lhe um apelido. Ficaram entre "o feroz" e "o selvagem", mas no final das contas preferiram chamá-lo pelas duas coisas. Suas amigas passaram a olhá-lo de um jeito estranho, curioso. Até sua mãe começou a olhá-lo assim e ele sentiu que às vezes ela ficava vigiando-o.
Uma tremenda indignação tomava conta dele. Por que as pessoas eram tão maliciosas? Será que as coisas melhorariam se ele explicasse que, antes de mais nada, a toalha caíra no chão porque ele sentira o que pensara que fosse uma aranha passeando pelo seu corpo? Não. Era melhor ficar quieto quanto a isso. Se ele incluísse "aranha" na história, só Deus sabia onde aquilo tudo ia parar.