PERDÃO & MAIS

PERDÃO [para Tristan Riet]

Durante a missa o padre, no sermão,

a voz ergueu para a congregação:

"Quantos praticam em sua vida diária

essa divina arte do perdão...?"

A maioria foi levantando a mão...

Ele indagou outra vez e cada irmão

a mão ergueu (sinceridade vária),

só uma velhinha respondeu que não.

"Mas por que então, Dona Terezinha,

a senhora não perdoa os inimigos?"

"Eu não tenho nenhum," disse a velhinha.

"Explique então para nossos amigos!..."

"Estou com 98,” disse com bons modos:

“esses cretinos já morreram todos!..."

OS DEZ MANDAMENTOS I [30-4-2010]

Jeová foi aos fenícios e ofereceu um mandamento.

"Qual será, grande Deus, o mandamento novo?"

"Não roubarás!" disse Deus e respondeu o povo:

"Não nos serve, Senhor, atrapalha o movimento,

nós somos comerciantes, o nosso sentimento

é a busca do lucro, vendemos por renovo

o velho e o estragado..." "Eu não vou louvo,"

respondeu Jeová, em seu ressentimento.

Os fenícios deixou entregues à sua sorte,

durante séculos os maiores comerciantes;

em busca de mercados e de mercadorias

enfrentaram aventuras, sem o temor da morte.

Dizem mesmo que alguns, em naves triunfantes,

chegaram ao Brasil, por suas secretas vias.

OS DEZ MANDAMENTOS II

Jeová foi aos egípcios, no mesmo sentimento

e àquela gente mórbida ordenou: "Não matarás!"

Murmuram os egípcios: "Mas este Deus nos traz

a derrota em batalha de nosso regimento!...

Somos povo guerreiro. Lutamos sob o vento,

no sol e nas areias, com tática veraz.

Guerrearmos sem matar? Mas isso não se faz...

Não queremos, Senhor, seu novo mandamento!"

Jeová resignou-se e essa gente deixou

entregue a seus combates, enquanto o Nilo enchia,

cuidando de suas múmias na estranha devoção

que estátuas e sarcófagos também a nós legou.

Um povo que vivia na atroz melancolia

de colocar na morte o ideal do coração!...

OS DEZ MANDAMENTOS III

O Senhor, desapontado, esqueceu dos orgulhosos.

Os fenícios pelos gregos acabaram enganados.

Os exércitos egípcios tombaram, dizimados.

Só restam as ruínas dos templos portentosos.

Jeová foi ao judeus, julgando mais piedosos

seriam os excluídos, assim escravizados.

A Moisés seduziu com sonhos encantados:

ele voltou ao Egito e obrou maravilhosos

milagres, conseguindo aos escravos libertar.

Junto ao Sinai reunidos, a Jeová escutaram,

depois de abandonarem as suas perdidas fés.

Ofereceu-lhes o Altíssimo um mandamento dar.

"Quanto custa, Senhor?" Os judeus perguntaram

"É de graça, meu povo!" "Então, queremos Dez!"

VERIFICAÇÃO [30/4/2008]

Os melhores já entregaram. Para casa

ou para os bares foram descansar:

somente fiquei eu a esperar

pelos restantes, em amargura rosa...

Já excedi o tempo que me apraza

o meu regulamento. Mas ficar

a mim mesmo comando, até chegar

a derradeira prova que me atrasa.

Eles amarram. Ficam perguntando

as mais simples das coisas. E parecem

nunca ter visto um texto de informática.

Fico no aguardo. A noite vai passando,

hora por hora, enquanto eles se esquecem,

abusando da vontade mais simpática...

INADMISSÍVEL! (1º/5/2010)

(Muchas gracias, Tristan!...)

Um casal foi por alguém fotografado

no alto de uma ponte de cimento,

amor fazendo com desprendimento,

sem temor de ser por outros espiado.

Era largo esse arco e, bem ao lado,

haviam pousado, sem pressentimento,

duas garrafas, em seu contentamento,

para beberem após o amor alado!...

Uma de Chivas Regal, uísque nobre,

que só para abastados é possível,

pelo perfume que dele se envola.

Refrigerante o outro e até bem pobre...

Mas que pecado! Porque é inadmissível

Tomar uísque escocês com coca-cola!...

VIAGRA

Na farmácia chegou uma mulher

e encomendou um frasco de viagra,

esse remédio que a ciência nos consagra,

para aumentar a potência que se quer...

O farmacêutico trouxe e ela pediu:

“Me corte em quatro cada um, senhor.”

“Mas o quê?...” surpreendeu-se o atendedor,

quando um pedido tão estranho ouviu.

“É para meu marido...” explicou ela.

O farmacêutico atendeu-a com carinho.

“A senhora não quer que faça caso

de qualquer outra mulher que seja bela...”

“Não, eu quero que levante só um pouquinho,

pra não fazer chichi fora do vaso!...”

AOS FILISTEUS DE GOTHA

(Arthur Schopenhauer, 1807, Trad WL, 2010)

Eles espiam e acorrem bem depressa

Para ver qualquer coisa que aconteça,

O que outro faz e tudo que alguém peça,

Tudo o que falam, nunca o povo cessa,

Qualquer coisinha já lhes interessa...

Seus rostos aparecem nas janelas:

Cada porta tem ouvidos atrás delas,

Contemplam tudo, assim como as estrelas;

Se os gatos usam os tetos como selas,

Tudo é assunto para homens e donzelas...

Mas essas coisas que têm maior valor,

Inteligência, pensamento ou ardor,

Em nada lhes despertam seu amor,

Apenas se este é rico ou tem favor,

Ou se é apreciado por algum comendador...

Querem saber quem é mais respeitado,

Quem deverá primeiro ser saudado,

Se é nobre ou conselheiro respeitado,

Se é Luterano ou serve ainda ao Papado,

Se é solteiro ou se já está casado...

Se mora em casa grande ou veste roupa fina,

Tudo eles pesam, a tudo isso se atina,

Mas aquilo a que esse povo mais se afina

É se uma vantagem, mesmo pequenina,

Podem tirar em favor da própria sina...

E uns dos outros ficam indagando

O que de nós se pensa ou está falando,

Ao Fulano e ao Sicrano perguntando,

Enquanto as opiniões vão sopesando

E os rostos vão, com cuidado, examinando!...

MEU GRANDE PROFESSOR

(Arthur Schopenhauer, 1807 -- Trad WL, 2010)

Ornamento da tribuna e da cátedra a alegria,

O cronista da cidade, mas ator de fancaria,

Ele é o mais perfeito dentre todos os cristãos,

Louvado pelos judeus, renomado entre pagãos,

Durante toda a manhã, montes de livros carrega,

Ao abano de seu leque a tarde toda se entrega;

Das sete artes liberais é o fiel dominador,

Que sabe tudo e até pode de tudo ser professor,

Enfim, a flor e coroa da mais bela inteligência,

Pois tem um milhar de amigos e os menciona com frequência...

TEMORES I

Chegou um campônio na delegacia,

com o braço na tipóia e engessado.

Pediu logo para falar com o delegado

que estava bem disposto nesse dia

e já lhe foi indagando o que queria.

"Seu doutor, eu fui atropelado,

é por isso que meu braço está quebrado."

E o registro da ocorrência até existia.

Depois que a parte, de ponta a ponta, leu,

respondeu, com paciência, o delegado:

"Sinto muito, o problema não é meu,

você vai ter de contratar um advogado,

nem sei porque me procurou, também:

aqui diz que o senhor estava bem..."

TEMORES II

"Seu delegado, é que foi uma viatura

da polícia, a que me atropelou..."

"Eu já sei, a ocorrência registrou,

mas não consta daqui qualquer fratura."

"Vou-lhe contar a minha verdade pura,"

falou o campônio e logo relatou:

"É que essa viatura me atirou,

pra longe do cavalo, em pedra dura.

Eu fui rolando pela ribanceira

e meu cavalo rolou para o outro lado,

pobre do bicho, ficou todo quebrado!..."

O delegado foi até a terceira

página do depoimento registrado.

"Ah, está aqui, um cavalo atropelado..."

TEMORES III

"Mas, e daí? A parte diz também

que o senhor ficou completamente ileso,

que até saiu andando, muito teso,

não quis carona, afirmou que estava bem..."

"Pois é, doutor, é que o polícia vem

para o meu lado, largando todo o peso

em cada passo, pra ver se eu tava leso,

mas um revólver na mão ainda tem...

Aí me disse que tinha sacrificado

o meu cavalo, por estar quebrado:

três tiros tinha dado na montada...

Quando falou se eu tava machucado,

o senhor vê, respondi meio assustado:

Não, seu guarda, tô bom, não tenho nada!..."

William Lagos
Enviado por William Lagos em 18/03/2011
Código do texto: T2854916
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