O Corno de volta ao Templo da Embriaguez

Ontem, após o trabalho, no Bar do João, tive que ouvir o desabafo de um senhor que entrou com a intenção, segundo ele, de apenas tomar uma cachacinha, pois saíra, tão somente, para comprar dois pãezinhos para asua esposa – bem na hora da janta.

_ Não estou aguentando mais a minha mulher ! Agora,ela deu para implicar com tudo; só porque deixei o copo do liquidificador virado escorrendo, ela já foi logo esbravejando:

_ Quem foi que usou o liquificador, aqui?

_ Fui eu que enchi o filtro, pois o jarro estava com suco, na geladeira e então, aproveitei o copo dele. Mas você está muito enjoada, Margarida ! Que antojo você está! Cruz credo em cruz ! Dessa forma irei para a casa de minha filha no interior!

_ Vá! Vá de uma vez para o Templo da Embriaguez, vá !

Depois de arrumar as malas, não achei a mochila de mão e a perguntei:

_ Ôh, Márcia, você viu a minha mochila?

_ Não ! Por quê? Acha que eu sumi com ela, também? Tudo que acontece aqui, de errado, sou a culpada ! Tudo eu …

_ E ela disparou a reclamar, coitadinha. Tenho pena dela. No fundo é boa companheira. Organizou minha vida, pois a mãe dos meus filhos, ah! Esta não valia nada. Tive que me separar dela, antes que ela me arruinasse!

_ Sou aviador aposentado, fiz cinco cursos de especialização nos Estados Unidos, e tenho milhas e milhas de vôo !

O moço continuava a falar sem deixar que pelo menos me apresentasse. Fiquei a ouvi-lo, pois julguei que o que ele queria mesmo, era ser ouvido.

_ Tenho quatro filhos e já passei vários bens em nome deles para que a jubiraca da minha primeira mulher, não ficasse com nada além do que a justiça ordenasse. Êta mulherzinha, danada!

Nisso, observei ao redor, algumas pessoas balançando as cabeças, outras faziam o gesto de chifres e outrens abanavam com as mãos. Comecei a entender.

Um brincalhão disse assim:

_ Calazans! Otacílio é doido com essa mulher !

_ Sou doido com ela, sim ! Quando nos casamos, ela tinha 15 anos. Hoje, tenho 68 e ela, 32. Ela é linda !

O riso tomou conta do salão !

Para completar, ele emendou:

_ Para evitar complicações para ela, caso eu morra, deixei apenas um carro em meu nome; os outros dois, mais a camionete já estão em seu nome. Até nossa casa, coloquei-a, de papel passado, também no nome dela!

Olha ! Pode até parecer fruto de minha criatividade, mas isso aconteceu ontem, num happy hour. É uma crônica do cotidiano. Temos que ter a sorte de estar presente quando ela acontece !