O Atentado a Granja do Torto

“Meu nome é Tatankawanka Roberto Ali Ipa Adbul, mas, sou conhecido por meus irmão como TRAIA. Na verdade meu nome é João da Silva Santos de Cristo, mas, quando me filiei ao La Queda, recebi um novo nome para iniciar uma nova vida!

Desde muito novo eu já sabia que vim ao mundo para realizar feitos grandiosos, observava o mundo e sempre chegava a mesma conclusão de que simplesmente com atos de boa vontade não iria conseguir corrigir as pessoas, nem mudar o mundo de qualquer maneira. Aos dezesseis anos comecei a procurar grupos de pessoas como eu e encontrei vários, que eram assim chamados de terroristas pelos jornais. Confesso que primeiro desejei me filiar ao Al Qaeda, pela grandiosidade de suas obras, mas, eles não me aceitaram por motivos religiosos. Nasci em uma família pobre, meu pai era católico, minha mãe era espírita, minha tia frequenta a Universal, o marido dela é Umbandista e meus tios são todos ateus. Com essa salada mística no histórico, minha única opção era me filiar ao La Queda, que entre todos os grupos radicais disponíveis, era o único Ecumênico Radical do qual já se ouviu falar. Após alguns testes de caráter e inteligencia, recebi meu novo nome e tornei-me o primeiro Mórmon Radical a fazer parte do grupo.

Admito que o treinamento inicial me deixou bastante decepcionado, passamos semanas treinando formas de colocar purgante em bombas de chocolate em coquetéis, o relógio do Mickey que ganhamos na admissão gastava muito rápido suas pilhas e fazia com que todos ficassem perdidos no espaço e no tempo. Nosso líder Nakama Dilado, um budista radical, praticamente nunca aparecia para nos orientar, tentávamos ligar para o celular secreto dele, mas, nunca tínhamos crédito.

Um dia nosso líder visitou nossa célula. Ficou muito feliz com os pequenos atentados que fazíamos diariamente no transito de São Paulo, mas, tinha planos muito mais grandiosos para nosso talento. “Vocês estão sendo convocados por mim, Deus, Ala, Oxalá, Krishna, Shiva, Buda, Odin, Zeus, Ellen White e Joseph Smith para realizar uma grande afronta ao governo brasileiro” - Ele era realmente um grande líder e podia conhecer a vontade dos grandes espíritos. “Vocês farão um passeio pela Granja do Torto”, ele selecionou a dedo alguns de meus irmão e eu, o êxtase tomou conta de meu ser. “Venham comigo meu filhos e mezefios, até a sala de reuniões para discutir os detalhes.”

O grande Nakama nos explicou o significado grandioso por trás de nosso relógio do Mickey sem pilha, entendemos naquele momento que pareceríamos inofensivos à todos e duraríamos pouco, mas, como o Mickey, seriamos eternos! Ele nos contou que nossos celulares não possuíam créditos para que nos tornássemos independentes de líderes, familiares e amigos e que agora era hora de dar Adeus silenciosamente a todos eles, pois em nossa missão poderíamos morrer pela causa.

Nakama deu a cada um de nós uma tarefa preciosa esboçando seu plano com perfeição de detalhes, mas, o irmão Adventista Radical que recebeu a tarefa mais perigosa de todas a recusou por que o atentado seria realizado na sexta-feira após o por do sol e sua religião não permitiria.

Com sabedoria nosso Líder alterou o plano, conferiu a mim a missão mais perigosa e ao irmão Adventista, a tarefa de colocar laxante e diurético no grande coquetel presidencial no qual a presidenta da republica estaria. Não era tão simples quanto parecia, os assessores da presidenta sempre confirmam a presença em três ou quatro locais simultaneamente e no último instante decidem por sorteio qual evento efetivamente será agraciado. A missão de meus irmãos era infiltrar-se em todos os eventos marcados para sexta-feira e armar todos os petiscos e bebidas, assim como bloquear todos os banheiros. Minha missão, seria a de me infiltrar na própria Granja do Torto, residencia presidencial oficial, colocar pó de mico em todas as roupas do varal e guarda-roupas, trancar todas as portas de acesso aos sanitários e filmar o desespero de nossa governante para colocar em todo lugar na Internet e provar que o poder político não nos tira a humanidade! Lembraríamos a todos, que ela é como nós, apenas humana.

Para possibilitar minha missão, o mestre me entregou uma chave mestra, que abriria e trancaria todas as portas da grande mansão. “Matar é fácil” - diz nosso líder quando perguntei se não seria melhor explodir a mansão toda - “Nossa missão é educadora! Matamos ela e logo alguém assume. Novos ladrões assumirão independente de quantos matarmos. A filosofia Zen diz que devemos rir ao inimigo que chora mezefios irmãos, e é isso que estamos fazendo”.

Chegamos em Brasília na quinta-feira pela manhã, graças a Deus o Niemeyer colocou a locadora de veículos logo ao lado do aeroporto. Claro que ele também poderia ter feito ruas normais, possíveis de atravessar e dobrar, mas, não fez. A distancia entre o shopping em que almoçávamos e o hotel em que iriamos dormir era de 100 metros em linha reta, mas, devido ao posicionamento das ruas separadas por abismos, precisamos rodar cinco quilômetros para chegar do outro lado da rua. Brasília é o simbolo do governo brasileiro e esta dificuldade de se locomover ou fazer qualquer coisa, com certeza explica muita coisa sobre nosso país.

Tínhamos o dia para comprar tudo o que precisávamos. Visitamos muitos lugares e procurando o setor das farmácias conhecemos praticamente toda a cidade. Não queríamos chamar atenção, por isso, pretendíamos comprar apenas dois vidros em cada farmácia, mas, para nosso azar, as farmácias eram todas umas do lado das outras e seus donos e funcionários eram todos grandes amigos. Tornando impossível que alguém comprasse 100 potes de purgante e 100 de diurético sem despertar atenções desnecessárias.

Enquanto meus irmãos revesavam-se em comprar pequenas quantidades do que precisávamos, procurar farmácias isoladas nas centenas de shoppings e chamar os disk-remédios para o quarto de hotel, eu fui fazer o reconhecimento da Granja, onde realizaria minha parte da missão.

Passei pela centésima vez pelas grandes obras arquitetônicas, pelas centenas de shoppings e sex-shops, pelos ministérios e finalmente cheguei em frente a mansão presidencial, que como tudo o que é realmente grande em Brasília, é um ponto turístico cheio de pessoas tirando fotos, o que disfarçaria com eficiência minha atenção.

O calor e o clima seco estavam afetando-me violentamente, antes de sair do carro utilizei meio vidro de colírio, sem que isso fizesse a sensação de que haviam pequenas pedras nos cantos dos olhos desaparecer.

Caminhei até a fachada da mansão e me deparei com os primeiros problemas que eu deveria resolver. Havia um rio que passava em frente ao portão onde os turistas talvez para provar que gostam mesmo de perder dinheiro para os governantes, atiram suas moedas. O Rio dificultaria bastante a entrada de pessoas não convidadas e os dois quilômetros de gramado plano e bem aparados entre o portão e a entrada da mansão tornariam qualquer invasor um alvo muito fácil para os policiais sempre em guarda. A única maneira de entrar no terreno era por uma pequena ponte com sulcos cavados no cimento para que os pneus se encaixem e o motorista não possa fazer curvas, esta ponte, está sempre guardada por dois sentinelas fardados e condecorados. Em suma, impossível para um simples turista entrar.

Voltei deprimido para o carro, imaginando que falharia em minha missão e decepcionaria meu líder. Rodei por algumas horas sem destino, até que entrei em um shopping para tomar um cafezinho e fui agraciado pela sorte dívina que Deus concede aos justos. No café, encontrei um homem vestido de boiadeiro com quem fui falar:

---- Que gramado grande tem a casa do Torto né?

---- Granja - Respondeu o boiadeiro – E é verdade, é o maior gramado plano de Brasília!

---- Eu queria saber quem é que corta esse imenso gramado...

---- Sou eu quem corta – Me respondeu enquanto colocava uma moeda na jukebox.

---- Você? - Fingi outro tipo de interesse, mas, de maneira ecumênica agradecia a todos os Deuses pela grande sorte que tive – E quanto tempo você leva?

---- Só trabalho a noite, o gramado deve sempre estar bem aparado pela manhã. Estarei lá hoje as três da madrugada. É rápido, é só dirigir o cortador de grama! O que da trabalho é o gramado dos fundos...

O boiadeiro chutava a jukebox sem perceber que ela estava na verdade profetizando seu destino, a máquina havia pulado diretamente para o final da música que ele escolheu e ficava repetindo a palavra “Sofrer” diversas vezes.

Conversei mais um pouco com o sujeito, levei-o para perto do meu carro e o rendi usando uma arma de brinquedo que compramos pela manhã no shopping. Levei-o para o quarto de hotel onde o amarrei e amordacei fortemente com acessórios de sadomasoquismo que compramos após o almoço no sex-shop.

Saí do hotel vestindo as roupas do boiadeiro, usando seus documentos com as fotos trocadas e usei o sensor de alarme para identificar seu carro. Naquela noite eu cortaria os gramados da Granja do Torto!

Cheguei um pouco antes do horário, precisei ser um perfeito artista para convencer os guardas de que eu era o novo jardineiro, que o antigo boiadeiro foi visitar a sua filha e me deixou em seu lugar. Consegui e logo estava dirigindo o cortador de grama presidencial, indo e voltando, realizando sem perceber um excelente trabalho. Estava tão divertido guiar o carrinho sobre o gramado durante a madrugada que eu quase esqueci de meu objetivo naquele lugar. Quando o gramado inteiro estava bem aplainado, perguntei para um dos sentinelas se poderia utilizar o banheiro apontando para uma pequena casinha ao lado da mansão.

---- Idiota! Aquilo é uma capela! - Respondeu-me o guarda mau humorado – Mije ai mesmo – Falou apontando pro rio.

---- É que é o outro número... - Falei sem imaginar que por causa disto o guarda me forneceria informações tão valiosas.

---- Então, você ainda vai cortar a grama dos fundos não vai? Circule a casa com o cortador, vire a esquerda no gerador, ande quinhentos metros e verá uma portinha, é o banheiro. Depois já pode continuar o trabalho lá mesmo...

Parei alguns instantes para sentir um pouco de piedade, o guarda trabalhava a mais de dois mil e quinhentos metros do banheiro mais próximo e diferente de mim não estava motorizado. Subi no cortador de grama e dirigi em linha reta pelo estreito corredor a esquerda da mansão. Em meus pensamentos imaginava as coisas que os sentinelas faziam na guarita quando a situação apertava, o gerador de energia estava se aproximando e tive uma ideia que me daria todas as oportunidades que precisava!

---- Não está virando! Não esta freando!! - gritei chamando atenção de todos os vigias.

Instantes antes de atingir o pequeno poste que fornecia energia para a mansão, pulei do cortador e causei muito tumulto. Com uma única jogada cortei a energia, desviei a atenção dos sentinelas e desativei os sistemas de alarme e emergência.

Tudo escuro, corri para a porta do banheiro e a tranquei por fora usando minha chave mestra, entrei na mansão pelo grandioso portal dos fundos e tranquei por dentro. Demorou trinta minutos para que a energia elétrica voltasse, neste tempo consegui me esconder em uma dispensa onde permaneci até o dia seguinte, para realizar minhas tarefas. Escutei por algumas horas os vigias procurarem por mim, arrombarem a porta do banheiro até que enfim desistiram.

Dormi tranquilo entre panos embolorados e vassouras gastas, clamava a todos os Deuses e santos por mais sorte, nem mesmo imaginava como faria para driblar os sistemas de segurança, mas, tinha certeza que algum dos Deuses a quem invoquei iria acabar me ajudando.

Acordei e esperei por um milagre, fui atendido. Como a presidenta estaria a noite em casa, a equipe de faxineiras e faxineiros foi ativada para fazer uma limpeza geral em toda a casa antes de sua chegada. Para que a equipe de limpeza pudesse trabalhar os alarmes foram todos desativados. Precisei apenas de um pouco de paciência para prender um dos funcionários na dispensa e trocar minhas roupas de boiadeiro jardineiro pelas de funcionário da manutenção. Assim vestido, pude não chamar muita atenção e ter pretextos para entrar em todos os quartos espalhar pó de mico nas roupas de cama e armários. Sempre que alguém terminava a limpeza de um dos banheiros eu aproveitava para trancá-lo por fora com minha chave mestra. Era difícil ficar indiferente ao ambiente extremamente bem decorado e repleto das mais grandiosas obras de arte nascidas no Brasil e no mundo, precisei usar toda minha força mental para ignorar quadros e esculturas que sempre desejei ver, mas, que nunca foram sequer emprestadas a um museu. Depois de muita busca encontrei o closet pessoal da presidenta, maior do que minha casa, repleto de roupas muito bem organizadas. Ali acabei com meu estoque de pó de mico. Questionei em meu intimo por que alguém com tantas roupas usa sempre as mesmas três combinações diante das câmeras, mas, percebi que isto era irrelevante para minha missão.

Ao fim do dia, com minha missão cumprida, saí juntamente com a equipe de limpeza , caminhei um pouco e roubei um carro, visto que o carro do boiadeiro estava cercado pelos seguranças desde que eu desapareci na noite anterior...

Usando o plano infinito de meu celular, consegui falar com meus irmãos e todos haviam sido igualmente bem sucedidos. Disseram-me para não retornar ao hotel pois o quarto estava cheio de pessoas amarradas.

Deixei o carro em um lugar discreto e sai caminhando a pé no sentido Asa Sul para encontrar meus irmãos. Vislumbrava as notícias do dia seguinte, contando para o mundo a grande afronta e humilhação que La Queda havia direcionado ao governo, ainda precisava comprar uma câmera telescópica para filmar as consequências de meu trabalho. Neste momento uma viatura policial surgiu com a sirene ligada atrás de mim, não pensei duas vezes e comecei a correr. Uma das maiores inconveniências em Brasília é percebida justamente quando se está fugindo de alguém, as opções são correr em linha reta para frente ou se atirar nos barrancos para baixo. Percebendo que a pé eu não tinha nenhuma chance contra a viatura, escorreguei em um pedaço inclinado do barranco, “ALAAAA, JERÔNIMOOO” gritei clamando por ajuda divina, continuei correndo, mas, no sentido oposto em que a viatura estava, logo percebi que outras viaturas vinham em outras direções me cercando por todos os lados. “ODIIIIN! TUPÃÃÃÃ!” Naquele momento nenhum deus de nenhum panteão parecia querer me ajudar, em alguns instantes eu estava no chão sento violentamente chutado pelos policiais que ficaram muito bravos de precisar cair no barranco para me capturar, enquanto era chutado ainda clamava “BUDA!!! BANZAI!! GUIODAI!!” mas nada adiantou...

Fui torturado por horas a fio e seguindo meu treinamento, fingi ser apenas um turista em busca de fotos e neguei qualquer fato de que fui acusado. Ouvi a voz de meus irmãos nas salas do lado sendo igualmente interrogados.

Deviam alertar nos sex-shop que as algemas tem uma chave de brinquedo e que elas são facilmente abertas através de um pino de segurança. Aparentemente os prisioneiros no quarto de hotel conseguiram se soltar, arrombar a porta e avisar a policia. Por causa disso, toda a operação fracassou.

Passei os últimos meses em uma prisão em Brasília, sem direito a um mísero colírio para pingar em meus olhos ressecados, escrevo essa carta para todos vocês meus ex-irmão do La Queda, para que se desmintam as lendas sobre nossa suposta morte e para informar que a partir de agora não sou mais um de vocês. O tempo na cadeia e a tortura diária me modificaram, agora sou ateu e não suporto mais pessoas radicais. Pretendo assim que sair da prisão fuzilar todos as pessoas radicais que encontrar pelo caminho, então é melhor que vocês saibam se esconder melhor de mim, que já os encontrei antes, do que da policia que nem imagina que vocês existem.”

=NuNuNO==

(Que sinceramente, acha que o Brasil nem precisa de terrorismo para entrar em pânico)

NuNuNO Griesbach
Enviado por NuNuNO Griesbach em 07/05/2011
Código do texto: T2954642
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