A vaca do dono do sacolão

Minha rua acordou mudada. Os vizinhos não se conformam com o presente deixado pelas vacas do dono do sacolão. Que absurdo, que ultraje! Diziam todos aqueles que se sentiam indignados com os estrumes fedorentos espalhados pela rua, com distancias quase milimétricas...

O que fazer aquela altura? As vacas já haviam passado e feito o que fizeram. Eram quase quinze representantes daquela espécime, a maioria malhada. Eram gordas, sim, mas não tinham onde pastar, pois viviam em local público, de ruas asfaltadas. Para piorar, irritavam todos os moradores quando, ainda bem cedo, vagavam pelas ruas puxando as latas de lixo que ficavam a espera do lixeiro que só chegava ás sete da manhã naquela rua.

O sacoleiro, dono do sacolão Esquinão, era um sujeito que se parecia muito com sua cria. Gordo, alto, olhos estufados e quando dizia algo , parecia ruminar mais do que falar.

As bichinhas, tadinhas, estavam sempre a vagar pelas ruas da pequena cidade, de lata em lata, em busca de algo para comer.

Como ainda não chamaram a prefeitura para resolver o problema? Questionavam alguns. Mas este sujeito tem de ser punido e indenizar todos os moradores pela sujeira que as danadinhas fazem. Afirmavam outros.

O fato é que já cansado daquela velha história, seu Jandir, morador da rua Dez, voltava para casa quando uma destas danadinhas atravessou na frente de sua bicicleta sem marcha. Pronto, foi ação e reação ao mesmo tempo! Seu Jandir de um lado, a vaca, berrando muito, do outro. A bichinha ficou no chão, sem conseguir se levantar. “ Não é possível! Já não basta aparecer todo dia, ainda vai me dar prejuízo!” Falava nervoso seu Jandir. Foi direto para a delegacia, comunicar o fato, para ver se o delegado ajudava a tirar a vaca da rua e levar para a pequena prefeitura localizada no centro da cidade.

-Seu delegado, o senhor precisa dar um jeito. Foi logo dizendo seu Jandir, todo irritado.

-Mas o que houve, moço?

- Ora, atropelei a vaca do dono do sacolão !

- Peraí, mais respeito com o dono do sacolão, seu Jandir!

- Como mais respeito? Ela entrou bem na minha frente, de repente. Além de empenar minha bicicleta com aquele corpo gordo, ainda me dá trabalho, me fazendo vir aqui pedir ajuda.

- Onde ela está?

- Lá no asfalto, estatelada, berrando feito uma louca, sem conseguir se levantar.

- Quer dizer que a coisa foi grave?

- Não sei, parece que sim.

- E o dono do sacolão?

- Eu é que sei? Ele que cuidasse melhor do que é dele, sem deixar solta por aí...

- Mas ela não tem culpa.

- Nem eu...O que vamos fazer?

- Vou chamar a ambulância imediatamente.

- Ambulância? E vaca anda de ambulância? Perguntou espantado seu Jandir.

- Peraí, seu Jandir. A quem o senhor está chamando de vaca?

- Ora, a vaca do dono do sacolão.

- Então, porque o espanto?

- Porque eu achava que só gente podia andar de ambulância...

- ?!