PARADOXO DE UM TOLO VII & MAIS

PARADOXO DE UM TOLO VII

Porém se eu te disser que nunca brinco,

que falo a sério em todos os momentos,

então, quando eu mentir, teus pensamentos

me tomarão por mentiroso, com afinco;

mesmo que eu seja verdadeiro nesse vinco,

serei julgado por falsos sentimentos,

pois mentirei nos teus pressentimentos

e serei falso em tudo em que me finco;

se te contasse que apenas eu brincava,

ao dizer que sempre uso seriedade,

talvez bem mais profundo condenasses;

pois cada vez que eu falasse, maliciava,

brincando seriamente com a verdade

e de todo o meu amor tu desconfiasses...

PARADOXO DE UM TOLO VIII

Quando se pensa falar só a verdade,

é então que mentimos totalmente:

mentimos a nós mesmos, na indecente

certeza de não darmos a inverdade,

pois todos nós, tão só pretensidade

somos o tempo todo, intensamente:

enganamos ao redor, diariamente

e bajulamos nossos poços de vaidade.

Se nem sequer comigo eu sou sincero,

porém pretendo ser o que não sou

e escondo de mim mesmo minhas razões,

o que direi daqueles em que espero

gerar confiança em mim, bem onde estou:

nessa dança de ardis dos corações.

PARADOXO DE UM TOLO IX

Eu te direi então, que dissimulo;

que amor escondi, pela mentira;

que desamor cantei, pela minha lira;

que a dor desta mentira, à pena engulo;

e que a verdade, por amor, anulo:

queimo a mentira na lenha de minha pira;

vejo a verdade que, a debater-se, estira;

cada palavra é sangue em que me açulo.

E se eu mentir, querendo demonstrar

que só a verdade na minha alma dura,

mais me dura a verdade na mentira...

Que a verdade é cata-vento a revoar,

ao passo que a mentira de alma pura

volta no vento, enquanto o vento gira...

PARADOXO DE UM TOLO X

Dissimulada assim, essa mentira

ainda mais dissimula que a verdade:

por mais contada com sinceridade,

toda verdade sua verdade estira...

Mas, pelo vento, tal mentira gira,

enquanto que a verdade, em falsidade,

por mais que creia na própria veleidade,

crava raízes na terra em que se fira...

E busca em vão amor ser verdadeiro,

pois, ou esconde o egoísmo derradeiro

ou dissimula a verdadeira fome,

na verdade em que a mentira transcorreu,

ao dar-se amor, talvez amor se tome,

muito mais do que o amor que a gente deu.

PARADOXO DE UM TOLO XI

Mentira então, é o que uma mente tira

de dentro de si mesma e o olhar esconde;

e nem sequer a mente sabe donde

se retirava a tiragem da mentira...

Porque mentira é o que toca cada lira,

enquanto bota para fora de seu onde

o que ainda esconde sem saber aonde,

quando a verdade tal mentira vira...

E, se mentira é quanto a mente tira

e se é, portanto, o quanto a mente bota,

eu não te conto mentira, mas "membota".

E, se no fundo, teu bem minha mente mira,

bem mais verdade existe na mentira,

que na verdade que eu pingo gota a gota...

PARADOXO DE UM TOLO XII

Assim eu minto, se digo que te quero

com um amor de amigo ou até de pai;

eu dissimulo -- e em tal mentira vai

toda a tristeza de meu amor sincero...

E quando eu minto que não mais espero

por tal amor por que minha alma esvai,

em tal mentira novamente cai

toda a verdade de meu desespero...

As minhas mentiras são assim constantes,

nessas verdades feitas de jamais

de que a mentira mais verdade tira...

Porque te quero, sim, mais do que antes,

por esse muito não te querer mais

e essa é toda a verdade em minha mentira.

A FILHA DE APOLO XX

Mulher estranha essa que encontrei,

tão diferente de minha geração,

aberta ao sexo, mas sem o coração

entregar, do mesmo modo que lhe dei.

Meu velho coração, que mais queria

o romantismo de uma nova fé

do que fazer amor... queria até

preencher nela a falta que sentia

de alguém em quem confiar inteiramente:

mas tal confiança morreu no nascedouro

pois só em pleno amor podia confiar...

recebi-a em meus braços, tão freqüente,

mas morro de sentir, em meu desdouro,

que faz amor, mas sem querer me amar...

A FILHA DE APOLO XXI

Não sei para onde foi o amor romântico

que ria em meus romances e poesias,

aquele amor das mais sinceras vias,

de idolatrar a mulher num pedestal...

Busquei na vida o sempiterno cântico

de alguém que amasse idênticos ideais,

mas tal alguém não encontrei jamais,

por mais amores guarde em meu bornal...

Umas faceiras, outras possessivas,

inteligentes outras, ou lascivas,

mas nenhuma que amasse o quanto amei.

E busco ainda a companheira idônea,

pois cada ligação mostrou-se errônea,

querendo apenas o pouco que lhes dei...

A FILHA DE APOLLO XXII

Eu cruzo a vida assim, ainda perplexo;

não sei se vou um dia encontrar nexo

nesta busca constante pelo sexo,

no compartir do arcano paradoxo...

Quero é o amor da alma da mulher;

quero encontrar, sem procurar sequer

demonstrar interesse num qualquer

raciocínio de sabor mais ortodoxo.

Quando eu amei um corpo, foi sem alma,

quando lhe amei a alma, foi sem corpo,

ou tive ambos, mas nunca concordamos.

Pois quem me deu o corpo em plena calma,

negou-me a alma no amplexo do corpo

e vejo assim que nunca nos amamos.

COLEÓPTEROS I

eu vou tomar um punhado de besouros

e fazer com todos eles batalhão:

na singeleza de meu coração

serão soldados negros Perfilados...

e vou tomar alguns desses tesouros,

fazer com eles contas de um colar:

vou perfurá-los e a meninas dar

esses colares de contas Quitinados...

tais como esses cascudos, eu conservo,

no mais secreto de minha alma pura,

milhares de besouros a Marchar...

sou general e sou também seu servo:

em sonhos negros a ilusão perdura

de que minha vida possa Melhorar...

COLEÓPTEROS II

Não sei como falecem os besouros

quando lançam os corpos tão redondos

contra o calor das lâmpadas, estrondos

tão leves quanto a perda de tesouros.

Estalam nos ouvidos, negros ouros,

pequenos seres de aspecto irreal,

criaturas de plástico, afinal,

cor-de-petróleo todos, bons agouros...

Posso entender que sintam atração

pelo fulgor da luz, que então os mata:

não é, afinal, o que fazemos nós...?

Porém suas capas forte proteção

lhes deveriam dar, na estranha data

em que se jogam à cor e morrem sós...

CASCUDINHOS

SÃO PALAVRAS BEM VÃS AS QUE HOJE CRIO,

SOB INFLUÊNCIA DOS CASCUDOS MORTOS:

SINTO DIREITO DE TOMAR NOVOS DESPORTOS

NOVOS SENTIDOS, EM QUE AFINAL ME ALIO.

ASSIM "ALMOR", NOVA PALAVRA AVIO,

QUE PASSAGEM EXPRIME A OUTROS PORTOS

COALESCIDOS EM NÍTIDOS IMPOSTOS,

EM QUE A MENTE DESPERTA E NALMA EU RIO

DESSE INVASOR QUE A DESTRUIR ME EDUCA:

DE MIM EU JÁ ABRI MÃO E NEM SOU DONO

DESTE CORPO A VIVER SONHOS MESQUINHOS

E SAIO A PROCURAR PELA MINHA NUCA

O BURACO EM QUE ENTRAM CASCUDINHOS

QUANDO DEVORAM DO CÉREBRO MEU SONO.

William Lagos
Enviado por William Lagos em 16/10/2011
Código do texto: T3280419
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