Severino no Culto Evangélico

Achei um gato tão bunitin no mêi da rua. O bixin tava tão desmanzelado que parecia um rato de esgoto. Quando fui pegar ele, deu um pulo pra trás, amostrando os dente, bem afiado. Quando consegui pegar, me deu uma mordida na mão e me azunhou todo. Coitado do gato, devia estar na rua a muito tempo, pois tinha uma inhaca terrível. Levei ele pra casa. Quando piso drento de casa, ouço os grito de mãe.

– Bixiguento, que diabo de bicho é esse? Inhaca da mulésta!!

– É um gatin que achei na rua, mainha.

Mãe examinou o bicho mais de perto...e deu um safanão no coitadin.

– Arremaria, mainha. Porque que a senhora fez isso? Ôô que mulér ruim.

– Menino, tu num reparou que isso é um timbú? Sente essa inhaca.

– Deve ser por isso que ele me mordeu todo, ó.

– Menino, vai te arrumar que de noite nóis vamo no culto dos crente.

– Hein?

– A Maria dos Cachorro tem uma irmã que é dessas leis. Ela chamou a gente pra ir cum elas.

Depois de ter jantado os tradicionais flocos de milho vaporizados com entranhas suínas (cuscuiz com tripa de pôico, para os íntimos) fui me arrombar, digo me arrumar. Quando reparei na vestimenta que mainha escolheu, bateu logo aquela vontade de comprar uma caixa de suicídio. O autor do texto já encomendou a dele. Enfim, a roupa com a qual eu tinha de ir era horrivelmente terrível pra dizer a verdade. Era composta de uma camisa de manga comprida e cor azul com gravata verde, e uma calça social preta e surrada. Essa era a tendência do ano em termos de Pobre-Gospel.

Quando vesti, bateu aquele feels. A camisa era grande e a calça ficou folgada na cintura e apertada no mocotó. Vesti aquilo e fiquei parecendo um Judas de palitó. A única coisa que eu podia fazer era pentear o cabelo de um jeito marromêno. Terminada a sessão da beleza, fui pra sala. Logo, e não sei por que, pois já devia ter se acostumado, se assustei com os grito de mãe.

– Mas que desmantelo é esse? Venha cá pra eu le ajeitar. Muleque indemente.

Não deu outra, mãe ensacou a camisa e amarrou a gravata. Puxou a calça pra cima.

– Arrémaria, mainha. Não bote a calça na boca dostambo não.

Para minha infelicidade, ela puxou mais pra cima.

– E vai me enforcar com a calça, é?

Por fim, decidiu ajustar meu penteado aos padrões evanjegue evangélicos. Dividiu no meio.

– Pronto, agora sim tá parecendo um rapaizin.

Pense num cabelo malamanhado.

– Agora tu vai na frente pra guardar o meu lugar – disse ela.

O caminho era de mais ou menos um quilômetro até o culto. Por onde eu passava era o centro das atenções. No entanto, era os menino que ficava fazendo chacota de mim.

– Olha a roupinha dela! – dizia um.

Eu não falava nada. Tava só inchando feito sapo cururu.

– Eita, esse vai fazer exame de fezes – mangava outro.

– E vai votar, é? – arengava outro.

Os meninos já tinham passado. Pensei que o caminho era a pior parte. Apressei o passo. Quando cheguei, mãe já tava lá, pois tinha pegado carona de carroça de burro.

– Eita menino réi leso, tá chegando agora.

Quando entramos, o templo estava lotado de gente. Parecia a feira da sulanca. Igreja Ministério das Ostentação de God, era o nome da - empresa - igreja. Podemos entender como igreja evangélica o lugar onde cristãos em sua maioria semi-analfabetos, fudidos na vida e com o rabo entupido de dívidas, vão para louvar - Belzebu - Deus da sua maneira. Se existe uma coisa que se espalha fácil é epidemia de disenteria, e a segunda é igreja evangélica.

Só pra se ter uma idéia, em quase todo lugar do planeta tem uma igreja evangélica, incluindo lugares como o próprio inferno e o Acre. Aqui no nosso país, esses empreendimentos se concentram principalmente em - favelas - locais de baixa renda, obviamente existem exceções à regra.

Os fiéis lotavam a igreja. Temos de concordar que evangélicos são uma espécie a ser estudada. Podemos encontrar tais pessoas principalmente em locais frequentados por pobres de espírito, como ônibus lotado, trens lotados, peruas lotadas, combis lotadas, - delirando pregando em praças públicas, e não podemos (como?) esquecer de seu habitat natural, os (galpões sujos) templos (satânicos).

Falarei de modo rápido alguns ditados de crente.

“Isto está em Salmos 24:69” (nem sabe se essa passagem existe)

“Tá amarraduuuu!”

“Tô com uma fome danada, mais Dels é maior”

“É só um real, moço”

O pastor Vandecleiton se adiantou e começou a falar, em alto e mau som, é claro.

– Ermããããos!! Tô aqui pra recramar de alguns fiééis que não vou dizer o nome né Janeilson?, que não estão contribuindo de forma correta. Dá o cartão mas não a senha, né ermão Janeilson? Depois essas pessoas vem pedindo as bença e não recebe. Tem que fazer direito!!!

Depois de quase uma hora de choradeira, chegou a hora dos testemunhos. Quase que eu não escutava nada, devido aos gritos do pastor. O primeiro testemunho foi de Raimundin o - viadin - filho homossexual do dono da mercearia. Todo mundo sabia que ele não queimava a rosca, mas incendiava logo. Começou a falar com uma voz toda melosa.

– Minha gente, estou aqui para contar o meu tes-te-um-nho. Parei com aquela vida de sodomias, encontrei Cristo.

– Aleluia ermão – disseram os fiéis.

Fiquei pasmado. É difícil ver um crente falar de seu passado, principalmente se este é um dos “ex”. os que falam de seu próprio passado geralmente se se auto intitulam ex-ladrões, ex-raparigas, ex-políticos, e ex-gays (isso é sério??? EX-GAY? Hmmmmmmmmm). Raimundin, pelo visto se enquadrava na última categoria.

– Parei de me deitar com aqueles homens deliciosos, aqueles negões, aqueles gran dões, com aqueles paus, aiii. Vou até parar que já tá dando água na boca.

– Mas, ermão Raimundo, quem eram esses homens? Diga, pois assim o senhor poderá perdoá-los – disse o pastor.

Nessa hora, vi uma meia dúzia de marmanjo suar frio.

– Aii pastóóór – começou o irmão Raimundo. – Tem o Irmão Paulo, o Irmão Valdo e o Israelzinho.

A cada nome que o irmão dizia, - a plateia - o povo se alvoroçava. Mas no fundo, todos já sabiam disso. Nessa hora, entrou um bêbado na igreja. Fedia igual à cambambá de painho. Pudemos notar que se tratava do irmão Jeremias.

– Se eu pudesse, eu matarra mil! Que eu sou cabra homi!

– Tá amarraaduu! – gritou o pastor. – Em nome de Gezuis!

– É o que? Venha cá?

Foi aquela roleta. Crente correndo pra tudo que era lado. Por causa da confusão, os irmãos responsáveis pelos hinos de louvor começaram a batucar. A musica parecia uma junção entre a banda do Chaves e o Massacration. E o pastor rolando no chão brigando com o bêbado.

– Sharabacantaxerautoperasdeoposeaaaaaaaa!! – gritava o pastor. – Sai desse corpo!! Arreda, Satanás!!

Depois dessa demonstração de sanidade intelectual, minha mãe e eu fomos pra casa. Pense numa vida sofrida essa de pobre nordestino. Voltamos para nosso (barraco) lar. Depois de jantar as sobras do almoço, que consistia em sobras de uma galinha de capoeira que mainha tinha matado. Em seguida, fomos aproveitar a maior diversão de que um pobre pode dispor: uma televisão com antena parabólica.

Assistimos ao chaves enquanto comíamos rapadura e em seguida vimos o Jornal Nacional.

– Boa noite – disse a apresentadora.

– Boa noite – respondeu mainha.

Pense num pantin miserável que pobre tem, é responder aos apresentadores de telejornal. Passa uma vergonha danada se estiver em outro lugar. A apresentadora falou a manchete do dia.

– Fudunço em igreja evangélica em cidade de Alagoas causa morte e deixa duas pessoas feridas. Vamos para o local com nosso repórter, Jacinto Pinto Aquino Rêgo. Boa noite, Jacinto.

O repórter, por incrível que pareça, era nosso vizinho.

– Boa noite, Patriça. É isso mesmo, foi um tremendo cú de boi aqui na igreja, viu? Tudo começou no culto, que estava indo muito bem, até um bêbado, entrar no recinto e começar a baderna. Alguns dos presentes afirmam que o bêbado estava possuído por um encosto. Acontece que o pastor partiu pra cima do pobre e os dois se engalfinharam no tapa. A briga foi tão feroz que até metade do teto caiu. A morte que aconteceu foi a de um bispo, que tentou aproveitar o pega pra capar que estava acontecendo e fugir. No entanto ele tropeçou em um menino que estava agachado roubando as carteiras que estavam vazias, pois já tinham dado seu dinheiro ao pastor. Ao tropeçar, o bispo Marcivaldsoney caiu e bateu com a cabeça no chão e teve morte imediata.

Parece que foi sorte mesmo. Por pouco a gente escapamos. Mas parecia que nossa aventura estava apenas começando, pois uma câmera de segurança mostrou eu e mainha correndo. Eu quase que era arrastado por mainha, já que no desespero de sair dali eu nem prestava atenção no caminho. Por causa de minha aparição no jornal, no outro dia eu seria uma celebridade na escola. Foi assim, então, a minha maravilhosa jornada ao templo (satânico) evangélico. Se alguém se sentiu ofendido, peço que entre em contato comigo. Assim eu poderei mandar foder-se.

(Texto com erros propositais)