Diálogos indiscretos entre Mi e Má.
- Alô, quem fala? Mi, meu momô você já chegou “na”China?
- Já, Má. Eu saí de fininho depois do golpe.
- Não é tão longe assim não, né Mi? A China fica pertinho da França.
- Má, meu amoreco, a França fica na Europa. A China fica na Ásia. É longinho, bem. São continentes vizinhos, mas é tudo bem longe.
-Ah, é.
- O problema é que aqui é todo mundo igual e não sei se quem conversa comigo é alguém importante ou algum Zé Mané.
- Pergunta, Mi – você é importante ou Zé Mané?
- Não posso, Má. O meu filme já está queimado pelos sete cantos do planeta e então eu tenho que ficar na maciota, tentar ficar meio invisível, não pisar na bola, essas coisas.
-Mi, você levou bola prá jogar aí, mor?
-Não, criatura. É um jeito de falar.
-Mas, Mi, são quatro cantos do planeta e não sete – norte, sul, leste e oeste.
-Má, meu doce, é uma maneira de eu me expressar.
-Ah, bom.
-Mor, agora você vai ter que trabalhar um pouquinho, que é prá não pegar mal.
-Por que, Mi? Justo eu, a bela, recatada e do lar não posso trabalhar.
-Você vai ter uma ação social.
-Como, Mi?
-É assim, Má, você que é bonita, tem que aparecer. Todo mundo gosta de uma mulher gostosa...
- Ai, Mi, repete. Me deu até arrepio no cangote.
- Então, você, que é bonita, gostosona, cheirosa, tem que aparecer. Primeiro para esconder o feio que fiz e vou continuar fazendo. Depois, é prá galera dizer “puxa vida, o velhinho ainda tem lenha prá queimar”...
-Você vai queimar lenha, Mi?
- Má, depois a gente conversa. Então, você vai trabalhar num projeto chamado Criança Feliz.
- Como assim?
-Não tenho a mínima ideia. Depois a gente inventa qualquer coisa prá dizer que eu tenho algum compromisso social. E aí, pelo menos, você aparece .
- Projeto Criança Feliz? Pode cantar?
-Como?
- Criança feliz quebrou o nariz, foi pro hospital, comendo mingau...
- Não, amor. A criança, se quebrar o nariz, não vai pro hospital. Vou tirar 44 bilhões de reais do SUS logo de cara e não vai ter hospital prá pobre, não. Pobre, que me dá comichão, vai ter que morrer mesmo. Até com a Farmácia Popular eu vou acabar.
-Ô, dó.
- E aí você aparece, Má, meu dulcíssimo amor.
- Teu o quê?
-Quer dizer que você é doce.
-“Agora eu fiquei doce, doce, doce, que nem caramelo. Tô tirando onda no camaro amarelo”.
-Amoreco, você não pode cantar música de ralé. Você tem que ter mais garbo.
-O meu avô comprava na Garbo lá na Barão de Itapetininga em São Paulo. Você comprava lá também , décadas atrás, quando era moço, Mi?
-Má, por favor, tente entender alguma coisa. Qualquer coisa. Você vai dar um jeito de fazer bonito, sorrir, dar tchauzinho. Você ainda não tem pelancas no tríceps...
- Pelanca aonde, Mi?
- Olha , Má, tem um chinês aqui me chamando e eu vou tentar dar um jeito de não ficar com o filme mais queimado do que já tá. Beijinho no ombro.
- Mi, fale comigo, Mi, Mi, Mi.
(Demorou um pouco para Má perceber que Mi tinha desligado o Graham Bell. Quer dizer, o telefone).