Deliquente Juvenil

A vida não é nada.

Mesmo que alguns pombos voem sadicamente pelas beiradas dos prédios, a vida ainda é aquela conversa com um político — de longe, você pensa que vai ser legal; de perto, você pensa por que pensou de longe. Mesmo que alguns velhos, reduzidos a homens pombais, alimentem tristemente os mesmos pombos, a vida ainda é aquele pedaço de frango, que você morde com força, e quebra alguns dentes, pois não tirou uns ossos. Mesmo que as crianças se espelhem nos velhos, e deixem o mundo um pouquinho melhor, a vida ainda é aquele banho que, não sabendo que o chuveiro queimou, você o abre rapidamente — sem preliminares.

Na verdade, tenho uma confissão a fazer. É uma confissão diferente da agostiniana. Não. A minha confissão é despojada de poeticidade — pois isso me irrita. Na verdade, na verdade, sou muito burro, embora tenha lido alguns gibis, e uma revista Playboy. Às vezes, um joão-de-barro é mais inteligente do que eu.

Talvez meu dentista tenha razão. Talvez eu precise mesmo de algumas férias na favela da Rocinha — me distanciar do Silêncio Petrificado desta cidade. E ir para o Barulho Flexível daquela cidade. Me tornar um esquimó: viver entre os Polos.

Depois de muito tempo, peguei o restinho de coragem do meu avô, e chamei uma garota do bairro pra sair, mas recebi um belo não na cara. Ela me disse: “Você é muito criança!” Acredita? Ontem, a vi beijando um anão.

Pra mim, a vida é um absurdo. Tudo acontece contra mim. É sério.

Tudo.

dux Cheshire
Enviado por dux Cheshire em 27/07/2019
Reeditado em 30/07/2019
Código do texto: T6705578
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