SUTILEZA DE ELEFANTE
        A ausência da fundamental habilidade, na hora de dizer certas coisas ou de responder a determinadas indagações (muitas das vezes, realmente provocativas) é o que tem feito o presidente do Brasil meter-se em polêmicas desnecessárias e a se colocar em posição desfavorável, mesmo quando está em situação vantajosa, no seu confronto quase diário com a esquerda que torce pelo fracasso de sua gestão e com aquela parcela da mídia, que manobra contra o seu governo.

        Quanto a isso, o Bolsonaro tem dois problemas. O primeiro, é que maneja mal as palavras e os argumentos; o segundo, é que o presidente tem o péssimo hábito de falar de improviso e responder por impulso. A sua assessoria de comunicação é quase decorativa e ele, com frequência, diz o que lhe vem à cabeça no momento, diante de câmeras e microfones.

         Com isso, dia sim e outro não, produz um constrangimento, um embaraço, uma dificuldade para o seu próprio governo e um mal estar desnecessário com outras instituições ou com os demais Poderes da República. Não que esteja errado em todas essas ocasiões, naquilo que diz. Mas porque é impróprio na maneira de dizê-lo, no que tem sido acompanhado por alguns dos seus auxiliares mais diretos.

            O resultado primário dessa verborragia presidencial, que afronta a liturgia do cargo que ocupa é que, a cada despautério que pronuncia, a sua torcida mais fiel — e, por vezes, irracional — grita: “Mito!!!”. E os seus adversários contestam: “Mico!!!”. “E la nave vá”... Até quando, ninguém sabe dizer.

            Pois esse “jeito Bolsonaro de ser” me leva a pensar que ele é um capitão, com o poder de um general de cinco estrelas, mas que se comporta, às vezes, como se fosse aquele cabo, de uma história engraçada, que a minha mãe adorava contar.

            Teria ocorrido durante a segunda guerra mundial, quando o coronel que comandava aquele grupamento recebeu, pelo rádio, a comunicação de que morrera subitamente a mãe de um dos seus homens, o Soldado 97, com o pedido de que a triste notícia fosse transmitida ao mesmo.

             Era uma situação complicada, porque o órfão recente não poderia, sequer, ser dispensado para comparecer ao enterro da falecida e nem haveria tempo para isso. Então o coronel, empurrou a árdua tarefa para um major, que era o seu imediato, observando que a notícia fosse dada com máxima habilidade, para que a nefasta informação fosse o menos dolorosa possível.

            Tentando, igualmente, livrar-se da embaraçosa missão, o major a repassou a um capitão que era seu comandado, que também jogou o “abacaxi” nas mãos do tenente, que o transferiu a um sargento e este, para finalizar, empurrou a “batata quente” para que um cabo se desincumbisse da obrigação espinhosa, porém necessária.

            Todos eles, ao delegarem a tarefa aos respectivos comandados, destacavam a ordem de que a notícia fosse dada ao soldado 97 com a máxima habilidade, para que o recruta sofresse o menor impacto possível, pela morte inesperada da sua mãe. E após receber essa mesma observação, o cabo tranquilizou o sargento dizendo que conhecia o jeito próprio de lidar com a tropa. E que assim o faria.

            Em seguida, mandou o corneteiro dar o toque de formatura, no espaço onde sempre faziam isso, ao lado das barracas. E, estando todos perfilados, disse, com a  suavidade vocal de quem iria puxar uma ordem unida:
            — Atenção tropa! Todos os que tiverem mãe viva, deem um passo à frente!

            Quase todos obedeceram ao comando, incluindo o soldado 97. E foi aí que o cabo corrigiu:
            — Você não, soldado 97, que a senhora sua mãe morreu ontem!

            Sutileza maior do que essa só mesmo a de um elefante andando no meio de uma horta de alface. Ou a do Bolsonaro, quando resolve improvisar certas falas.


Ilustração: Google Imagens.