O Casamento do Ferreirinha

Ferreirinha é o cabra mais cheio de marmota que conheço, mas o que ele tinha de bonequeiro, tinha de sorte pra arrumar mulher chegou a se apaixonar várias vezes, mas os pais não aceitavam o namoro.

Pra minha surpresa, recebo uma carta dele anunciando que iria se casar.

Tabuleiro do Norte 14/04/1984

Meu irmão e companheiro de aventuras, alegrias e desvios de conduta, Claudo.

Estou lhe enviando essa carta que vai dentro de outra por segurança, se uma não chegar a outra chega.

O que me motivou a escrever pra você é que estou cansado dos desvaríos nos descaminhos da vida, resolvi me aprofundar no destino que todos os de alma libertina fogem. Não julgue meu passado e acredite, meu destino pertence àquela que eu só consigo vislumbrar futuro ao lado dela, a mesma que me tirou do limbo onde me encontrava enterrado. Encontrei a mulher que me faz trocar uma vida desregrada pelo prazer puro de amar. Não consigo mais imaginar minha vida sem ser entrelaçada a dela. Vou casar e virar homem de família.

Nos últimos tempos andamos afastados, mas não consigo imaginar o momento mais importante da minha vida, sem meu melhor amigo ao lado como meu padrinho de casamento.

Desse seu amigo Ferreirinha

Gente, juro pra vocês!!! Se pai quando me batia, não dissesse que se eu chorasse apanhava mais, eu teria me desmanchado em lágrimas.

Cheguei em Tabuleiro no final da tarde, Ferreirinha me aguardava na praça, me abraça e diz que está muito feliz por eu ter vindo. Vamos descendo a Batista Maia até o Bar do Lailson. Peço uma cerveja e início a conversa; Novidade boa Ferreirinha. Sua noiva só pode ser uma pessoa muito especial pra fazer você tomar uma decisão dessa. Ele responde; Muito especial mesmo, não trocaria ela por nada no mundo, pois uma mulher como ela não tem dinheiro nenhum que pague.

Mas Claudo, tou com um problema pra resolver, disso depende meu casamento. Eu já começo a ficar apreensivo, pois problema com o Ferreirinha é caso complicado que só é possível resolver depois da terceira geração.

Perguntei já com medo de me arrepender; Alguma coisa que eu possa ajudar? Ele responde; Na verdade sim, já que você vai ser meu padrinho de casamento, gostaria que fosse meu padrinho de batismo também. Nesse momento estava tomando um gole de cerveja e ela quase pegou o caminho errado. Tentando me recuperar de um quase afogamento golistico, perguntei; Ferreirinha você não é batizado? Ele meio sacana responde; Fale baixo, só quem sabe disso é o padre Heitor e agora você, se a mãe da noiva souber é capaz de nem ter casamento, pois pra namorar com a filha, tive que passar a frequentar a missa junto com a família que é *terrivelmente católica*. Cai na risada e continua; Quando fui marcar o casamento é que descobri ao procurar o batistério. O padre Heitor tá me cobrando um olho dá cara pra fazer um batismo secreto, no mesmo dia do casamento, se você aceitar, ainda vou ter que encontrar uma madrinha que não seja fofoqueira. Olho pro Ferreirinha quase sem acreditar em mais uma que ele me meteu e digo; Tudo bem podemos marcar com o padre, vou chamar minha amiga Nazinha Noronha pra madrinha. Nazinha aceita prontamente mas, em troca quer ser dama de honra que era seu sonho de criança, o que trouxe outra complicação, pois a noiva já havia escolhido todas as damas e pajens, sobrou pra mim resolver, sugeri que Nazinha podia ser madrinha comigo o que ela aceitou de bom grado, mais outro problema, a mãe da noiva escolheu a irmã dela pra madrinha, já que eu não tava casado. Olhei pro Ferreirinha e perguntei; E Agora? Ferreirinha responde; Pode deixar que essa eu resolvo. No mesmo dia a tia da noiva teve um acidente de moto. Quando estávamos indo pro batizado, perguntei pro Ferreirinha se ele teve alguma coisa a ver com o acidente, ele respondeu que o acidente tinha sido apenas uma *providência* divina.

Depois do batizado Ferreirinha já num pé e noutro pra gente ir embora, padre Heitor lhe segura; Ferreirinha, você se batizou, agora tem que confessar seus pecados, só vou dispensar a primeira comunhão e a crisma porque você passou da idade, mas a confissão e comunhão, não dispenso. Ferreirinha meio a contra gosto se ajoelha no genuflexório e me lança aquele olhar de quem não sabe o que fazer. Então eu sopro no ouvido dele; Repita, padre, perdoe porque pequei. Ele repete; Padre perdoe porque pequei. Padre Heitor diz; Filho confesse quais foram seus pecados? Ferreirinha já num visível enfezamento responde; Padre, só nunca matei, o resto pode botar na minha conta, inclusive estou prestes a cometer o único pecado que me falta. Padre Heitor então diz; Reze vinte Pai Nosso e vinte Ave Maria, se arrependa dos seus pecados e não peque nunca mais. Ferreirinha se levanta e diz; Vamos embora Claudo. Eu pergunto; você não vai rezar? Ele responde; O padre não falou que tinha que ser na igreja, além do mais não conheço esse pai nosso e essa véia Maria menos ainda, quanto a me arrepender dos meus pecados, tou pensando que casar vai ser aquele mais vou me arrepender.

Saímos da Igreja direto pro Lailson.

Ficamos lá até próximo da hora do casamento, depois fomos nos arrumar.

Tudo transcorreu normalmente, Ferreirinha foi impecável, até que no sermão padre Heitor perguntou pra ele o que era uma esposa, no que Ferreirinha responde; Esposa, é aquela pessoa amiga e companheira que está sempre disposta a ajudar o marido a resolver os problemas, que ele não teria se fosse solteiro.

Na recepção Ferreirinha me leva até um rapaz e apresenta; Claudo esse é meu amigo Edmilson Providência, lá de Crateús. Aperto a mão dele, enquanto cai a ficha do acidente da tia da noiva, Edmilson me diz; Você parece com um radialista lá de Crateús, o Dideus Sales. Ferreirinha interrompe; Nós três vamos terminar essa noite lá no cabaré da Terciola. Eu argumento; Ferreirinha você acabou de casar, como fica sua lua de mel? Ele responde; Claudo, essa foi antes do casamento. Mas Ferreirinha, cadê o homem que me disse que sua noiva não tinha dinheiro no mundo que pagasse? Claudo, depois de tudo que eu passei pra casar, paguei foi tudo, ainda tenho saldo e esse saldo vou começar a gastar a partir de agora...

Claudo Ferreira
Enviado por Claudo Ferreira em 02/09/2020
Código do texto: T7052577
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