Nulo da Silva, candidato a prefeito - entrevista - parte 8 de 10 - publicado no Zeca Quinha Nius

Após o senhor Nulo da Silva, candidato a prefeito pelo Partido Extraordinário de Inteligentes Democratas e Eminentes Intelectuais (PEIDEI – mas não fui eu), degustar do lanchinho, e o entrevistador regressar à sala, retomamos, após alguns contratempos, que contornamos não sem dificuldades, a entrevista:

ENTREVISTADOR: Dadas as suas idéias, que são absurdas, acerca da educação, e o seu comentário acerca dos males que os políticos já praticam por outros meios que não os que o senhor propõe, explique-me, senhor candidato, do seu ponto de vista de político tarimbado, como o senhor diz, a política que se promove, no Brasil, política que, diz o senhor, mas não com as palavras que usarei, só está disseminando o mal.

NULO DA SILVA: Uma frase, que resume toda a política brasileira: Os políticos brasileiros, à força, arrancam, com a mão esquerda, o pão das mãos dos brasileiros, e, com a direita, dão-lhes, generosamente, segundo eles, migalhas.

ENTREVISTADOR: Explique-se, senhor candidato.

NULO DA SILVA: Explico-me, senhor entrevistador, e de muito boa vontade. Os políticos, ao cobrar impostos, e muitos impostos, dos brasileiros, tiram-lhes das mãos o dinheiro que eles, brasileiros, ganharam com o suor do próprio rosto.

ENTREVISTADOR: Mas os políticos oferecem direitos...

NULO DA SILVA: Que direitos o quê!? Você não entende de política coisíssima nenhuma, asno.

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Quais direitos têm os brasileiros? Nenhum. A liberdade, que é o maior bem de que os brasileiros gozam, foi conquistada, após muitas lutas, muitas guerras. É fruto do esforço de muita gente, que, nos últimos milênios, sacrificaram a própria vida para conquistá-la. Ela não veio de bandeja, não. Ninguém presenteou os humanos com a liberdade. E os brasileiros não gozamos da liberdade porque políticos ma concederam. A liberdade foi uma conquista. A liberdade não é um direito; é uma conquista, e tem de ser defendida, diuturnamente. Todos que prezam a liberdade de que gozam têm de se manter vigilantes. E quanto aos direitos...

ENTREVISTADOR: E os direitos que os políticos oferecem ao povo não são conquistas? O povo não os conquistou após muita luta?

NULO DA SILVA: Quais direitos?

ENTREVISTADOR: Direito à educação gratuita, direito á saúde gratuita, direito à creche...

NULO DA SILVA: Direitos!? Não são direitos!? Estas idéias, as de direitos que as pessoas têm, são ferramentas, que os políticos manejam para pôr todo o povo no colo deles...

ENTREVISTADOR: Absurdo!

NULO DA SILVA: Absurdo! Se você não tivesse a cabeça cheia de caraminholas e carambolas, e de paçoca, entenderia o que eu disse.

ENTREVISTADOR: Explique-se, então, senhor candidato.

NULO DA SILVA: Explicar-me-ei, senhor entrevistadorzinho de metade de meia-tigela.

ENTREVISTADOR: Senhor, candidato...

NULO DA SILVA: Eu disse, no início da retomada da nossa entrevista, após você, ofendidinho, sair, nervosinho, daqui, bater a porta, irritadinho, e regressar, calminho...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Eu disse que os políticos tiram, com a mão esquerda, o pão das mãos do povo, e, depois, com a cara mais lavada do mundo, entregam-lhe, com a mão direita, migalhas. Ora, o que eu quis dizer com isso? Os políticos cobram impostos, retirando das mãos das pessoas o dinheiro delas, dinheiro que elas ganharam com o suor do próprio rosto, e criam normas absurdas, que dificultam a vida de todos; além disso, disseminam, com as suas políticas, valores que vão de encontro aos mais caros valores do povo. Ouça, atentamente, jornalistazinho de meia-tigela de cérebro de caramujo...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato, seja respeitoso...

NULO DA SILVA: Esforço-me... Esforço-me. É quase impossível respeitar uma pessoa, você, que tem cérebro de muar...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato, não falte com a civilidade...

NULO DA SILVA: Você não fala; você relincha, orneja, zurra...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Não fique nervosinho, mamífero quadrúpede ungulado.

ENTREVISTADOR: Senhor candidato, por favor. Mantenha a compostura.

NULO DA SILVA: Você ouviu-me, atentamente, senhor entrevistador? Eu disse que os políticos disseminam valores que vão de encontro aos valores do povo. Entendeu? Eu disse que “vão de encontro aos”, e não “ao encontro dos”.

ENTREVISTADOR: Entendi, senhor candidato, prossiga.

NULO DA SILVA: Os seus zurros ferem os meus ouvidos sensíveis.

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Estou acostumado a ouvir Mozart, Beethoven, Berlioz, e agora sou obrigado a ouvir um bucéfalo...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Se você fosse descendente do cavalo do grande Alexandre, rei da Macedônia, eu não reclamaria.

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Se Incitatus, senador romano, fosse seu ancestral...

ENTREVISTADOR: Senhor candidato, não me ofenda.

NULO DA SILVA: A história registra os nomes de Bucéfalo e Incitatus, dois nobres e valorosos membros da sua espécie, senhor entrevistador.

ENTREVISTADOR: Senhor candidato...

NULO DA SILVA: Vamos aos finalmentes. Já perdemos muito tempo... Os políticos brasileiros, eu já disse, e repito, empobrecem as pessoas ao cobrarem-lhes impostos, reduzindo-lhes, portanto, o poder aquisitivo.

ENTREVISTADOR: Mas os políticos restituem o que lhe s tirou por meio de impostos...

NULO DA SILVA: Restituem, é, besta quadrada? Em primeiro lugar: Os políticos têm a permissão do povo para lhe cobrarem tantos impostos? Têm? Não têm. Em segundo lugar: O que os políticos restituem ao povo é apenas uma pequena parcela do que lhe tiraram, à força, à força da lei, que oprime, oprime, sim, afinal, quem sanciona as leis? São os políticos. A maior parte do dinheiro que os políticos retiram, à força, das mãos do povo, perde-se a burocracia estatal municipal, estadual e federal. É, ou não é assim? Os impostos, no Brasil, são empregados para se atingir dois propósitos: empobrecer o povo; e elevar o poder dos políticos, que usam do dinheiro que retirou ao povo para implementar políticas favoráveis aos políticos.

ENTREVISTADOR: E os direitos...

NULO DA SILVA: Meu Deus do céu! Você não pensa... Aliás, você pensa com a cabeça de um asno. Existe almoço grátis? De onde os políticos tiram o dinheiro que empregam na oferta de “direitos” ao povo? Do bolso do próprio povo, das mãos do próprio povo, e sem pedirem-lhe permissão.

ENTREVISTADOR: Mas...

NULO DA SILVA: Mas você tem de retirar-se desta sala, usar o pouco que resta a você de massa cinzenta dentro da sua cachola oca, do seu bestunto vazio, e... Diga-me: Como se mantêm creches públicas? Com dinheiro de impostos. Como se mantêm escolas públicas? Com dinheiro de impostos. Como se mantêm hospitais públicos? Com dinheiro de impostos. Como se... Entendeu? Não preciso apresentar outros exemplos, preciso? A opressão, só para encerrar esta etapa da entrevista, e eu quero fazer outro lanchinho, a opressão, dizia eu, não se faz com canhões de tanque de guerra apontados para a cabeça de todos os cidadãos, não, senhor perguntador. Se faz emburrecendo e idiotizando os cidadãos. E onde se idiotiza e emburrece os cidadãos? Nas escolas públicas, e não apenas nas públicas. Os políticos brasileiros oprimem os cidadãos brasileiros, perguntadorzinho de araque. Enfie isto não sua cabeça, asno.

Nota: O senhor Nulo da Silva levantou-se, altivo, da cadeira, e caminhou, como um guerreiro romano após uma batalha vitoriosa, e foi até a sala de refeições. Enquanto isso, o entrevistador, estupidificado, fitava, como um tolo, o vazio...

Ilustre Desconhecido
Enviado por Ilustre Desconhecido em 28/10/2020
Código do texto: T7098202
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