MEU FRACO É PASTEL OU É DE GORDO QUE EU GOSTO

Sempre fui fissurado em pastel.

Confesso que costumo procurá-los em todas as feiras. Em quiosques, quermesses, bares, lanchonetes e até em pastelarias. Mas, invariavelmente, termino desapontado.

Porque são poucos os profissionais sérios e competentes que se dedicam a fazer algo digno. Ao contrário quase todo mundo pensa que é a coisa mais simples do mundo prepara-lo.

A impressão que tenho é que quando o sujeito já tentou exercer todas as atividades ao seu alcance e, por ser ignorante ou incapaz nada deu certo, resolve dedicar-se a fazer pastel.

Como nunca foi do ramo começa por improvisar qualquer gororoba. Apesar de horripilante consegue vendê-la aos incautos de toda hora. E começa a ganhar bem.

Então, porque é inepto, termina por comprometer ainda mais o produto passando a prepará-los engordurados, murchos, azedos, frios, sem sabor, amarrotados, tortos, crus ou queimados.

Constituem os legítimos pastéis estuporados.

É algo triste para um pai de família que ardorosamente anseia por degustar um singelo pastel num descontraído dia de domingo.

Por isso mesmo, visando minorar os sofrimentos, próprios e alheios, vou permitir-me tecer alguns comentários sobre o desventurado pastel de todo dia.

Primeiro a massa. Ninguém poderá questionar sua importância. Mas se você não tiver máquina apropriada para abri-la na espessura correta, não titubeie. Compre-a pronta, em qualquer supermercado, que sua feitura não envolve grandes segredos.

Preocupe-se com o recheio, este sim a merecer toda sua atenção.

Carne magra de boi, grosseiramente moída e com todos os temperos a realça-la. Qualquer neófito culinário sabe prepará-la. Não faça economia tola mas empregue uma boa quantidade de recheio para fugir do famigerado pastel de vento. Acrescente sempre uma azeitona inteira, sem caroço e, ovo cozido, se gostar.

Palmito picado, algum tomate e um toque de amido de milho a conferir ao conjunto a textura corrigem. Mais uma vez disponha de uma generosa porção. Talvez uma colher de requeijão cremoso se for do seu agrado.

Um bom pedaço de queijo fresco. Sem nada a contaminá-lo, que mais não será preciso.

Use, agora sua criatividade. Creme de bacalhau, camarões, frutos do mar, carne seca, ricota com espinafre e tudo o mais que sua imaginação ditar. Pode acreditar que tudo aquilo que serve de cobertura para pizza, teoricamente também irá ficar bom para rechear um pastel. E, às vezes fica até melhor.

Agora o grande segredo.

O pastel para ser bom, bonito e satisfativo tem de ser gordo, ou seja, estonteantemente estufado.

Mas como fazer isso?

Em primeiro lugar é preciso que esteja bem fechado. E, não se apresente amassado, quebrado ou com furos indignos a comprometê-lo.

Em segundo lugar, a temperatura do óleo deve permanecer entre cento e setenta e cento e oitenta graus centígrados. Milho ou canola, preferentemente e nunca menos que cinco a seis litros.

Em terceiro lugar você deve mergulhar o pastel, por cerca de quinze segundos no óleo quente, dando-lhe um banho de imersão. E, retirá-lo, permitindo que volte a esfriar.

Esta prática não é simpatia. Mas objetivamente permitirá sejam seladas todas as diminutas imperfeições que acarretam a perda dos vapores internos que logo mais se formarão e que poderiam comprometer o alegre estufar da peça.

Recoloque-a no óleo quente. Vire-a com regularidade acompanhando seu magnífico desabrochar.

Retire-a no momento certo, quando ganhar um colorido levemente dourado e faça-a repousar, ereta, numa superfície permeável onde o natural excesso de gordura possa suavemente escorrer.

Observe sua obra. Quente, crocante, colorida, gorda e super apetitosa.

Algumas gotas de uma boa pimenta e talvez um modesto molho vinagrete serão complementos necessários para coroar uma degustação concentrada e silenciosa.

Outro dia pensava com meus botões. Pastel é paixão nacional. Nossa legislação deveria contemplar uma pena severa para quem o vilipendia. Que tal castração? Os delinqüentes que o maculam, pelo menos, não deixariam descendentes.

Dedicado à magra Viviane.