OLHAÍ O RAIO DA VACA! - (Contra-contos #3)

OLHAÍ O RAIO DA VACA!

Cocos quebrados, dezenas de sapotis, jaca madura, frutas esparramadas -- esse era o espetáculo aos olhos de quem quisesse ver.

Fazia pensar na passagem de um touro bravo por ali, arremessando tudo para os lados, pisando e quebrando. Gente, não -- ninguém presente.

Se ali houvesse alguém antes, devia ter fugido espavorido a fim de defender a pele e o canastro. Só de ver o ambiente anarquizado dava para sentir medo e os pensamentos iam criando imagens supostas, antevendo suposições e conjecturas sobre o que teria acontecido.

Depois de olhar e notar a porta quase arrancada do caixilho, pareceu que talvez tivesse sido uma explosão -- mas qual, que nada! Não se viam manchas de estouro, nem fragmentos dilacerados de frutas ou objetos.

O vermelho pelo chão podia ser sangue de gente ferida, mas podia ser suco de fruta esparramado. Bem, era examinar melhor e no depósito/loja ao lado o espectáculo era parecido -- só que mais fruta ainda, prateleiras desabadas, mal dava para entrar no compartimento.

Uma revolução passara por ali e passara com tempestuosas ventanias. O próprio dinheiro fora abandonado -- era possível? Quando a gente se preocupa com outra coisa que não o dinheiro, algo muito sério está acontecendo. Logo aqueles, que trabalhavam para ganhar dinheiro, que enchiam o mercado com alarido e obra diária para arrecadar o dinheiro dos fregueses?

Nas lojas seguintes, de verduras e legumes, confusão total ou pior. Alfaces pisadas, tabuleiros derramados e quebrados, cestas espatifadas e espalhadas, o sangue rubro dos tomates maduros pelas paredes e pelo chão, melancías estouradas de dar pena, pimentões, nabos, cenouras e tudo o mais em mistura que nem pra salada servia mais, faltavam azeite e vinagre, e se via que tudo aquilo tinha sido pisado como numa dança de São Guido das mais agitadas.

A mixórdia se estendia a todo o mercado de frutas e legumes, aquela série de lojas lado a lado no edifício novo, construído pela prefeitura em próprio municipal, arrendado aos feriantes e comerciantes. Para as lojas vinham os produtos do interior, trazidos de noite em caminhão, arrumados e vendidos durante o dia.

As portas de ferro pouco se fechavam, aquilo funcionava dia e noite, os feirantes se rodiziavam e muitos dormiam nas próprias lojas, escondidos atrás de caixotes, cestas, engradados de mercadorias.

O prefeito e o chefe de polícia examinaram mais um pouco o triste espetáculo, em silêncio e consternação. Somente quando chegaram ao barzinho, igualmente deserto, é que o Dr. Pureza, delegado e chefe de polícia e homem muito experiente, estendeu a mão e apanhou as duas últimas xícaras de sobra na água morna, serviu dois cafezinhos, abrindo a torneirinha da máquina.

Achar açúcar foi mais difícil, ele entrou no balcão e encontrou um pacote por baixo do balcão. Tomaram o cafezinho morno, o prefeito Democracino a remexer a colher devagar e pensativo, muitas vezes olhando para a máquina como espantado por encontrá-la no lugar ou a querer que ela lhe contasse o ocorrido.

--Foi uma briga geral – disse o delegado. -- Todo mundo brigou com todo mundo. Pelo que me disseram parecia que o próprio diabo baixou neste terreiro e fez todo mundo levar bolacha, sopapo, rasteira, soco e pescoção. Foi um tal de mulher bater em mulher e homem, e homem bater em mulher, homem e criança, e criança bater em qualquer um, até os cachorros apanharam e morderam.

O ceguinho que vende bilhetes deu tanta pancada na baiana de tabuleiro que ela foi parar no hospital. Ninguém sabe como ele enxergou para bater assim. Até parece que não é ceguinho coisa nenhuma.

--Mas como, por quê, de que jeito, qual o motivo? -- perguntou mais uma vez o prefeito Democracino – Essa gente toda ficou maluca? O quê é que eles dizem? Ninguém sabe como começou, ninguém sabe por que bateu e apanhou?

Tomou mais um gole do cafezinho insuportável, desistiu. Em acesso de raiva olhou em volta e viu xícaras quebradas e espalhadas, açucareiro desintegrado, também alí a baderna/loucura imperara. Impaciente, aborrecidíssimo por estar fazendo tais perguntas mais uma vez e sem obter resposta, arremessou a xícara, pires e colher no chão, o tintilar da louça tinha tonalidade musical.

O delegado Pureza olhou-o de soslaio. O prefeito também estava ficando maluco e com vontade de quebrar e brigar?

A bem do fato ele próprio sentira diversas vezes bruta vontade de demolir aquela estúpida máquina de café e pôr abaixo a cigarreira que tinha ainda alguns maços nos escaninhos.

Só mediante esforço e lembrança constante de que estava alí como representante da lei e da ordem conseguira deixar de “inteirar” a arruaça e pôr máquina e cigarreira abaixo. Quando o prefeito jogou a xícara, o impulso quase se sobrepôs e o delegado chegou a armar o braço e o murro para acabar de arrasar o boteco.

--Uma loucura geral -- proferiu as palavras e ficou surpreso, quase pronto a desferir o murro e percebendo que alguém falara por sua boca –Essa gente toda endoidou de repente.

-- E não tem um mês que inaugurei o mercado – suspirava o prefeito Democracino. -- Tive que romper com meu partido, perder amizades, brigar com a mulher e os filhos, ficar na rua da amargura para construir este mercado… e agora acontece uma coisa dessas. A imprensa já veio e fez um escarcéu danado, estão dizendo que o mercado não serve, que está mal construído… Será que a oposição…

Fechava os punhos, erguia o braço aos céus pedindo testemunho ou reagindo a tal injustiça divina – quem sabe?

--Mas é tudo mentira! O mercado é uma obra de primeira, vai durar mais do que eu, que você, que essa gente toda! Só se puserem dinamite nisso tudo. Eu posso ser burro mas não sou safado! Este mercado vai dar uma renda enorme à prefeitura, assim a gente pode contar com renda maior, pode sair da m… miséria de recursos!

O delegado, seu nomeado e auxiliar ex officio, tinha que concordar.

--E é um lugar limpo, higiênico, e não aquela porcaria imunda de antes, lá do matadouro – aduziu, lembrando o lugar onde antes os feirantes e barraqueiros faziam seus encontros, vendas e compras, verdadeiro chiqueiro.

--Pois é! Aqui não tem porco, cabrito, bode e vaca como no matadouro. Tudo limpo e higiênico, não é mais um foco de doença como aquela indecência do mercado livre do matadouro! -- Bramia o prefeito Democracino. E se punha a chorar, lágrimas de homem, capazes de comover qualquer um.

O prefeito tinha esse dom, sabia chorar lágrimas de homem quando o momento indicava. Muitos eleitores tinham sido conquistados desse modo, ele a visitar pedindo seu voto e, sem agüentar, chorando na cara e na casa deles. As mulheres não resistiam, votavam maciçamente.

Os auxiliares se aproximavam, uma porção, rodeados de jornalistas. Na entrada do mercado os policiais impediam a entrada de quem quer que fosse. Delegado e prefeito tinham ordenado, assim podíam examinar os estragos sem populares, feirantes, jornalistas e curiosos aporrinhando. Mas era hora de deixar entrarem.

Aflitos por suas mercadorias e valores, os feirantes começavam a clamar para entrar, estavam colocados no portão prontos a entrar a fim de conferir os estragos e defender o que pudessen salvar – não iam deixar seus bens desamparados, sujeitos à malícia e maldade dos outros – principalmente os próprios colegas feirantes. Se abrissem o portão ia haver invasão e correria, havia muito moleque esperto de olho na situação, querendo entrar e correr para apanhar alguma coisa.

Além disso era hora de abrir os portões porque os próprios fregueses e compradores, as donas de casa, não tardariam a reclamar – não se tinha outro lugar para comprar verduras, legumes e frutas na cidade, depois de inaugurado o Mercado Municipal.

Do portão os gritos tinham sido uma apoquentação constante enquanto prefeito e delegado examinavam os estragos:

“Não mexe no meu chuchu, ó meu!” “Vé lá se vai agradar de minha caixa!” “Esse prefeito é bom mas o delegado não é flor que se cheire!” “Dois sem-vergonhas olhando o prejuíço da, gente!” e comentários menos corteses .

Mas a grita maior era “Deixa entrar, deixa entrar, deixa entrar!” e um vigoroso e estentóreo “Abre essa M…!” na voz inconfundível de Mané do Gancho, vendedor de frutas e homem de força espantosa, com uma sacudida no portão de ferro fizera aquilo tremer como varas verdes.

Os auxiliares se achegaram às autoridades máximas do executivo municipal e ao semi-máximo do judiciário da comarca, aflitos por uma solução para o problema do momento – o povo impaciente no portão, onde o sargento Dionísio mantinha o destacamento de oito soldados – e o portão fechado.

Não se podia deter mais aquela maré, afinal os comerciantes estavam naturalmente aflitos pelos bens deixados lá dentro, pagavam impostos, tinham direito a livre trânsito naquele Mercado Municipal cercado por muro alto, diversos haviam sido repelidos após escalarem a parede externa.

A situação se tornava claramente insustentável e angustiante. Demorar mais era promover conflito, guerra, assim como em castelos antigos e assediados por bárbaros ululantes. Muitos tinham tentado barrar o caminho à massa humana – em geral com maus resultados.

Vendo a indecisão de prefeito e delegado, o sargento Dionísio não fez por menos:

--Doutor prefeito, doutor delegado! -- gritou de lá, também era dotado de voz forte, só que uma oitava mais alta que a de Manoel do Gancho. -- Não agüento mais o portão. O povo tá querendo entrar, não tenho elemento pra segurar mais tempo!

A aclamação popular do outro lado das grades vinha consagrá-lo, prefeito Democracino e delegado Pureza apressaram-se, acompanhados por auxiliares que falavam sem parar. Lá chegados o perfeito quis falar ao povo, e começou:

--Meus amigos, as providências vão ser tomadas e…

--Cala a boca, burro! -- berraram diversos e a pressão sobre o portão começou a fazê-lo estremecer.

Apavorados, agora, os soldados e o sargento Dionísio encostavam os ombros e os traseiros na parte interna do portão, era visível o esforço que faziam. Pelas grades do portâo veio uma banana que acertou o delegado no peito, em cheio.

--Arreda, doutor! -- berrou o delegado, puxando o prefeito para o lado e interrompendo-lhe o pretendido discurso. -- Pode abrir, pessoal!

Os soldados e o sargento Dionísio ouviram a ordem logo à primeira palavra e como combinados um deles puxou o trinco maior, os demais saltaram como puderam para os lados.

Como uma onda de arrebentação que se alça até a crista mais alta e depois tomba, aquela massa humana se avolumou contra o portão – e abriu.

Foi um despejo de homens, mulheres, crianças, gente em geral correndo para entrar, verdadeira competição de cem metros rasos. Pasmos, delegado e prefeito, soldados e sargento viam passar em carreira por alí gente reumática, calma, sossegada, lenta e lerda mas, naqueles momentos, em carreira desabalada, como a fugirem do próprio capeta chifrudo.

Um ruído inacreditável emanava da massa humana agora em movimento – parecia um urro de onça brava. Lívido o sargento Dionísio arregalava os olhos, colado à parede da casa da guarda, enquanto o soldado 130, um pé no chão e outro no ar, gemia de dor com a batida do portão em sua canela.

Em menos de meio minuto o mercado fervilhava de gente, o alarido se erguia como no dia da inauguração. De onde surgira tanta gente? A cidade parecia estar ali. Prefeito, delegado, sargento e soldados olhavam espantados mas logo se percebia que a multidão se acalmava, só uma ou outra choradeira de feirantes mais nervosas bradando aos céus pela perda de mercadorias.

--Ai, meu Deus! Olha como ficou minha abóbora! -- choramingava alto Dona Joaquina, uma das feirantes mais antigas, especializada em abóboras plantadas em seu sítio na serra.

--Isso não é nada! -- berrou Mané do Gancho. -- Minha mercadoria foi toda pras p… -- ele era reconhecidamente desbocado quando com raiva, uma dama de gentileza quando calmo.

O delegado Pureza resolveu não repreendê-lo pelos palavrões que todos ouviram, fez ouvidos moucos, o homem era forte de fazer medo e a hora não se prestava a uma prisão, podia explodir outra desordem pública.

Os feirantes não estavam para brincadeira, achavam-se unidos agora, unidos contra as autoridades que haviam fechado os portões e expulso todos dali, quando antes tinham trocado projetis, sopapos e pauladas entre si.

--Como foi que começou a desordem, excelência? -- queria saber um rapazinho com tipo de jornalista, um fotógrafo já batia chapas do entrevistado, outros jornalistas se aproximavam às carreiras após localizarem aquela peça rara, importante e até então desaparecida, o prefeito.

Democracino arrumou a gravata, o paletó, adotou ar mais condigno.

--Meu filho – começou a explicar – se eu soubesse, pode crer que lhe contava. Um fato misterioso promoveu em nossa terra sempre ordeira e progressista uma desordem inacreditável, um tumulto, diria mesmo uma convulsão social de proporções inconcebíveis para a pacífica terra de …

--Escuta – fanhou outro jornalista, vindo de fora, atitude pouquíssimo respeitosa, fiado no fato de ser da imprensa. -- Deixa a discurseira pra outra hora, a gente quer saber o que começou a guerra aqui, sabe como é?

Democracino fitou-o com olhar que o teria fulminado e deitado a correr um homem comum, mas jornalista nunca foi homem comum, sabiam ser bem atrevidos aqueles sujeitos. Era preciso pensar nas repercusões, de nada servia antagonizar-se com o sujeitinho.

--Estamos investigando o assunto, o meu auxiliar, o Dr. Pureza, saberá levar o inquérito a uma conclusão esclarecedora – disse, o mais sem raiva que pôde, levando a mão ao ombro do auxiliar.

Os jornalistas caíram encima do delegado, já tinham fotografado o prefeito, não esperavam dele qualquer explicação, agora era fotografar e cercar o Dr. Pureza. Este embatucou, isso de imprensa era novidade e não sabia se lhe servia, seu velho tato mineiro mostrava como se portar. E já enxergara a saída, não fez por menos – a outro a batata quente.

--A polícia está agindo, os senhores podem acreditar. Já temos algumas pistas e o meu auxiliar, o Sargento Dionísio, está encarregado de levantar o lado externo do ocorrido.

Quebrando a praxe, o protocolo, os costumes, diante da investida esmagadora daqueles jornalistas e fotógrafos, luzes e relâmpagos espocando e turbando-lhe a vista, pôs a mão no ombro do uniformizado e estupefacto sargento Dionísio, que naquele momento ficava sabendo que lhe cabia descobrir o acontecido.

Homem do norte, decidido e cheio de expediente, o sargento Dionísio se viu rodeado pela atenção dos jornalistas, percebeu que tanto o prefeito Democracino como o delegado Dr. Pureza se afastavam o mais discreta e desapercebidamente possível, e se pôs em posição de sentido, após dar ordem que levou os soldados do destacamento a se reagruparem em forma atrás dele.

--A investigação está sendo feita! -- proclamou com sua voz de vogais bem abertas – mas por enquanto não tem nada pra declarar pra não prejudicar o andamento do caso! -- estava sendo terminante e os jornalistas recuavam um pouco, sabiam reconhecer um homem de fibra e decisão. -- Mas eu acho que aqui tem dedo de comunista – aduziu, lembrando-se de que tal expediente sempre lhe servira para encobrir o fato de ter sido membro do partido por alguns meses, em Caruaru.

Loucuras da mocidade. Ele soubera mudar o nome, arranjara registro falso com outro nome, de outro jeito não tinha mais idade para ingressar na Polícia.

Já que mudava de idade, aproveitou para mudar de nome, assim ninguém o reconheceria – e espancara de tal modo o conterrâneo que por azar o reconhecera naquela cidade paulista, que o sujeito sumira dali jurando que se tinha enganado, só pensara que era o Severino dos Anjos lá de Caruaru… ai, não bate mais não, eu já vou embora!

Os jornalistas escrevinhavam furiosamente nos caderninhos, as fotografias estavam sendo batidas, aquele desgraçado Pé-de-Pato 187 ia ver com ele, aparecer em fotografia de jornal com a túnica desabotoada e quepe de lado!

Mas era bom ser fotografado diante do destacamento. Podia até ajudar na promoção. Recusou-se militarmente a prestar mais declarações, manteve o suspense até perceber que prefeito e delegado haviam sumido, os jornallistas que lhe haviam sido hierárquicamente despejados encima eram uns bobocas, ele ajudara prefeito e delegado a descalçarem a bota e as fotografias iam ajudar, ele na frente do destacamento, aparecendo nos jornais…

-- E é hora de agir! - bramiu, voltando-se para o destacamento – destacamento, sentiiiido!

Os oito gatos pingados se perfilaram, logo outra ordem em tom militar:

-- Descansaaar! Fora de forma, maaarche!

Ordenou que se espalhassem pelo mercado, patrulhando o local para evitar novas desordens, diante da insistência dos jornalistas limitou-se a dizer que tinha o que fazer e partiu em marcha militar dura e garbosa na direção do banheiro público, estava quase urinando nas calças, a cerveja exigia saída.

No mictório encontrou 187, o Pé-de-Pato, soldado Adilson.

Olhou-o bem enquanto vertia água e embora o momento não fosse dos mais militares, fez ver sua opinião ao subordinado.

-- Você não tem brio, soldado? Apresentar em público de túnica desabotoada e quepe de banda?

Adilson Pé-de-Pato 187, apoiado na parede, parecia estar vertendo a urina toda do mundo.

--Sargento Dionísio, o senhor viu bem a força que a gente fazia naquele portão dos infernos, o povo todo xingando e querendo entrar. Não deu pra ficar bonitinho, não é?

Dionísio era homem justo, só então se lembrou, de tanto fazer força no portão, ajudando os auxiliares, em determinado momento sentira uma costura da calça se rasgar.

Sem ser percebido, disfarçadamente, levou a mão esquerda (Adilton 187 Pé-de-Pato estava do outro lado) à calça e ali confirmou a pior hipótese. Rasgada fragorosamente de alto a baixo, na parte superior. Bem sentira certo frescor em região anatômica tão condignamente mantida fora de observações e comentários.

-- Foi bom encontrar você aqui – mudava de assunto. -- Vai agora mesmo ao meu quarto e traz de lá uma calça pra mim. E muito de pressa, entendeu? Vou fazer uma necessidade fisiológica no vaso e espero você voltar. Diz aos outros que estou aqui, se houver algum galho.

Trancou-se no reservado e se pôs à espera. De porta fechada, ninguém o veria alí dentro, só os soldados saberiam onde procurar, se fosse preciso. Mas dificilmente sairia antes de receber as calças pedidas. Vida de soldado é apertada, mas ele era homem de expediente para tudo.

Mantinha silêncio, não via motivo para perceberem sua presença ali. Mas no reservado ao lado, que julgara fechado e vazio, alguém fazia barulho.

Em boca fechada não entra mosquito e o Sargento Dionísio (ex-Severino) ficou a imaginar quem estaria no reservado ao lado. Ruído de pés raspando o chão, o outro devia estar ali desde algum tempo. Afinal ouviu a voz tímida:

--Acabou a desordem lá fora?

Quem falava parecia não saber com quem estava falando, só se percebia que estava desesperado, sedento de informações.

-- Acabou – condescendeu Dionísio. -- Tudo em ordem, a polícia botou tudo no lugar. Acho que tá tudo safo.

Seu antigo instinto de detetive lhe falava ao ouvido, ele perguntou:

-- Tá aqui faz muito tempo?

A voz era de homem maduro, até mesmo velho e denotava muito medo, incerteza, aflição e angústia.

--Uai, ora essa! -- respondia surpreso o cidadão. -- Estou aqui desde que a bagunça começou, com o negócio da vaca…

-- Essa é boa! -- o sargento se obrigava a rir e parecer despreocupado. -- Que tem de vaca nessa história toda? A vaca Fortaleza?

-- Não sei, eu não enxergo bem, sou muito míope e perdi os óculos – e com isso o Sargento Dionísio já sabia com quem falava, o velho Capitão!

Chamavam-no assim, era um velhote bondoso e míope como ninguém, antigo na cidade e todos o conheciam, figura estimadíssima. Mas algo dizia para arrancar informações sem se identificar, o Sargento Dionísio sabia trabalhar e farejava uma pista, tinham-lhe dado a incumbência. Uma vaca nessa história?

-- Como é que foi essa bagunça, meu tio? -- usava voz mansa, melíflua, indutora às confissões. Voz de padre em confessionário de viúva bonita e coberta de pecados e predicados.

-- Bem – o velho Capitão parecia hesitar, logo despejava o que sabia, aflito por sair daí após encontrar a solidariedade de alguém que lhe garantisse a saída – Eu vim comprar jiló para meus passarinhos, que eu crio curió, canário, trinca-ferro e corrupião. Eu venho toda sexta-feira, sabe?

-- Ah, é, passarinho precisa de jiló – era dar corda ao velho capitão, a coisa ia correndo bem.

-- Pois então eu fui ao Genésio que sempre tem jiló fresco na sexta-feira e aquela quitanda é meio apertada. Quando saí com o embrulho debaixo do braço tinha muita gente, eu tropecei e deixei cair o embrulho. Aí apanhei no chão, mas quando levantei e fui andando dei de cara com uma coisa qualquer, pensei que era uma senhora e pedi desculpas pelo esbarro. Eu disse: Desculpe minha senhora! E começaram a rir de mim e disseram que eu tinha esbarrado era uma vaca, uma vaca que anda pelo mercado todo porque está costumada a ganhar xepa dos feirantes, desde o tempo da feira no matadouro.

O Sargento Dionísio teria achado graça mas resolveu cerimoniosa e fraternalmente o depoente. Já o identificara, faltava colher o mais que pudesse antes de instaurar o inquérito que o delegado Pureza lhe despejara encima, em público, diante do assedio dos jornalistas, e com certeza despejaria de verdade chegados à delegacia. Poria o abacaxi em suas mãos, como de costume.

-- Pois é – prosseguia o velho capitão – Eu fiquei com vergonha, porque parece que eles tocaram a vaca para alí ou queriam brincar comigo, e fui saindo de qualquer jeito, e nisso esbarrei de novo com força num… numa coisa grande e macia e gorda… pensei que ainda era a vaca e caí a asneira de dizer, fazendo graça: “OLHA AÍ O RAIO DA VACA outra vez!”

Silêncio o Sargento Dionísio se punha a imaginar a cena. Diante do silêncio, incitou o velho capitão, tornando-se solidário a ele, compreensivo e humano. Um dos melhores meios de fazer as pessoas falar, aprendera antes de entrar para a polícia.

-- Ora, muito natural. Devia ser a vaca. Eu também dizia, não tem nada demais.

-- Foi o que eu achei, sabe? -- o velho capitão se animava, sentindo a solidariedade do companheiro do reservado ao lado. -- Só que era uma senhora muito distinta, aquela senhora gorda, casada com o fiscal de rendas, o Sr. Narciso.

Dionísio arregalava os olhos. Que mancada!

Diante do silêncio o velho capitão não se agüentou. Tinha que botar para fora, nenhum lugar melhor do que o reservado com vaso sanitário.

-- Aí me disseram que era ela, que não era vaca nenhuma, ela se insultou e queria satisfações, eu ia explicar quando alguém me bateu com uma bolsa, fez voar meus óculos… ainda estou sem eles, perdi na confusão. Aí alguém disse “Em meu amigo o capitão ninguém bate!” e era voz de mulher, e começou uma gritaria, um corre-corre, levei dois safanões e perdi o rumo, estava sem óculos, alguém me agarrou pelo braço e me trouxe até a porta do banheiro, disse para eu me trancar aqui dentro que ele ia dar uma porradas naqueles safados e saiu gritando feito um doido.

--Pois é – concordou Dionísio. -- Acho que meu amigo fez muito bem, lhe defendeu direito, o senhor é homem distinto e idoso, merece respeito. E sem óculos enxerga alguma coisa?

--Com licença da expressão, não sei bem com quem estou falando, mas só pode ser homem, nota-se logo… mesmo porque este é o banheiro dos homens, não é? Sem óculos eu não enxergo é m… nenhuma. Fiquei aqui esse tempo todo, o alarido lá fora fazia medo, parecia que o mundo tinha enlouquecido, vinha tudo abaixo. Fiquei aqui até agora, com medo de sair, porque sem meus óculos eu não ando, preciso de quem me ajude, e meu amigo vai me ajudar, não vai? -- estava quase chorando.

Dionísio pensou antes de falar.

A situação requeria tato. O conflito começara entre dois cidadãos de respeito. O velho capitão era estimadíssimo e inofensivo, toda uma vida de sossego e sem passagem pela delegacia, e Madame Narciso uma verdadeira instituição maternal e matronal na vizinhança e toda a cidade, senhora do mais alto respeito. Ele não podia tomar partidos, nem polícia toma partido na desavença entre pessoas da alta.

-- Claro que ajudo o senhor. Aqui quem está falando é o comandante do destacamento policial, o sargento Dionísio.

Um verdadeiro uivo veio do compartimento ao lado. O velho capitão sentia-se pego, preso, processado, encarcerado. Caíra na asneira de abrir o bico com a pessoa errada? Logo ele, que pretendera manter-se discretamente ausente de toda aquela confusão, tumulto, revolução. Não fez por menos, agora chorava francamente, abertamente, lamentosamente.

-- Ai meu Deus! Que desgraça! Por que tudo sai errado comigo?

Passos se ouviram lá fora, o soldado 187 Adilson Pé-de-Pato batia educadamente à porta do reservado onde o superior se encontrava.

-- Sargento…

-- Fala, soldado. Trouxe a calça?

-- Não achei, não senhor. Parece que está na lavanderia.

O sargento Dionísio era homem de expediente. Não fosse e jamais chegaria a sargento. Pensou rápido e na voz mais enérgica determinou:

-- O capitão aqui do lado – o soldado 187 Adilson Pé-de-Pato se confundia e atrapalhava tudo, não sabia de que capitão se tratava, dois superiores em reservado parecia demais – precisa ser levado para casa e é eu que vou levar. Soldado 187!

-- Pronto sargento! -- e 187 Adilson Pé-de-Pato se perfilou ao chamamento, punha-se em posição de sentido.

-- Tira as calças e me entrega aqui – era esquisito, mas terminante.

-- Tirar as calças, sargento?

-- Já falei. Anda com isso.

Adilson 187 Pé-de-Pato, rapaz do interior, não ia discutir ordens superiores. Despiu a calça e colocou-a na mão estendida pela porta do reservado, entreaberta pelo Sargento Dionísio. Este a recolheu, passaram-se alguns segundos e logo ele saía, abotoando a calça que lhe ficava apertadíssima.

-- Fica por aqui, que soldado não anda sem uniforme – ordenou. -- Melhor sentar alí dentro – apontava o vaso sanitário.

-- Tá direito, sargento. Eu tava precisando, mesmo – e Adilson 187 Pé-de-Pato embarafustou pelo reservado desocupado, sentou-se, achou a louça ainda quente.

-- Depois mando trazer sua calça – e o sargento batia a porta do reservado ao lado, o capitão abriu, ele o tomou delicadamente pelo braço foram saindo.

*******

Na delegacia, deixou o velho capitão com o escrivão, sem dizer coisa alguma e foi encontrar calças que lhe servissem. Não tardou mais que minutos e voltava, apresentava-se ao gabinete do delegado Dr. Pureza.

-- Entra sargento – o delegado o fitava com esperança no olhar. Aquele cearense (ou era pernambucano?) de poucas palavras devia ter alguma notícia, pela expressão ostentada em seu rosto largo. -- o que foi?

-- A investigação vai bem, doutor Pureza. Já sei como começou a desordem.

O Dr. Pureza fitou-o com mais atenção. Que o homem era bom, não duvidava. Mas seria tão ótimo assim? Pouquíssimo tempo decorrido e já sabia como começara o tumulto?

-- Olha aqui, sargento, eu não acredito no que vai dizer. Não deu tempo para investigar direito. Se me vier com alguma besteira mando tirar ponto da sua folha, entendeu?

Perfilou-se o Sargento Dionísio e teve o descaramento de rir, mesmo perfilado. Ao mesmo tempo disciplinado militar e debochado, cheio de si.

-- E se for verdade, o Dr. Delegado manda botar pontos na milha ficha?

O Dr. Pureza coçou o queixo, a proposta pereceu justa. Nada tinha a perder, o cearense (ou pernambucano?) sim, o risco era do subordinado, não dele.

-- Está combinado. O que descobriu?

-- Com licença, doutor – e o Sargento Dionísio se retirava, logo voltava trazendo pelo braço aquele pitosga de todos conhecido, criador de passarinhos e chamado Capitão por todo o mundo, nem lhe sabiam o nome verdadeiro.

*******

Tanto o delegado, Dr. Pureza, como o Comandante do Destacamento, Sargento Dionísio, caíram em campo em seguida, após terem levado o velho Capitão para casa, sem jiló dessa vez, no carro da Delegacia e em meio aos agradecimentos do velho míope.

No mercado conversaram com estas e aquelas pessoas, mas passaram antes pela casa do Fiscal de Rendas, Dr. Narciso, onde conversaram longamente com Madame Narciso.

Esta confirmou o incidente e aduziu muito mais, do seu ponto de vista nada míope – tinha assistido melhor o ocorrido, subira numa mesa para ver melhor a batalha campal, depois levara um tombo que a deixara descadeirada (estava de cama) quando dois homens engalfinhados haviam esbarrado naquela mesa, ela a bater com a bolsa na cabeça do seu desafeto o Toninho, “aquele cachaceiro sem-vergonha que amigou com a mulher do vendedor de tomates, e... ”.

Assim reconstituíram a questão.

A maior parte dos feirantes, fregueses e demais circunstantes não sabia do início da coisa, tinham pego a briga sem saber e entrado nela sem querer, quase todos haviam sido assaltados pelo pânico e diante de um empurrão ou pessoa que avançava em sua difreção, correndo ou gritando, tinham sido agredidos ou haviam também sentado o braço.

A briga lavrara como fogo em palha seca, logo todos corriam e batiam ou apanhavam.

Mulher brigara com vizinha ou desconhecida, homem com rapaz, menino com outro, qualquer um com qualquer outro, levados por desesperado pânico que os transformara em galos e galinhas de briga, assim como tripulantes de um navío que vai a pique depressa – cada um por si, sálve-se quem puder.

A influência de filme assistido por toda a cidade naqueles dias, mostrando o pavor de um afundamento clássico, havia por certo deixado todos com os nervos à flor de pele, sem o perceberem, e as visões de pânico a bordo haviam preparado qualquer um para enfrentar com valentia aquele que se aproximasse gritando e cheio de agressividade.

De positivo ficara o começo.

De fato o velho Capitão, pitosga como ninguém, esbarrara numa vaca e pedira desculpas ao ruminante.

De fato a vaca Fortaleza, habituada ainda a aproveitar a xepa dos feirantes de frutas, legumes e verduras, que pacificamente soubera transferir suas andanças do antigo matadouro para o novo Mercado Municipal, estivera presente ao conflito desde o começo – e fora mesmo seu motivo causador.

Os fregueses e feirantes lhe queriam bem, não a enxotavam, davam-lhe de comer.

O velho Capitão pedira desculpas à vaca Fortaleza, pensando tratar-se de uma senhora. E Madame Narciso, próxima, assistira aquilo e caíra na risada e debochara dele, juntamente com outras mulheres e pessoas – mas algumas outras não tinham gostado da sua atitude e quando o velho Capitão esbarrara aflito na gorda Madame Narciso e se saíra com o segundo comentário “OLHA O RAIO DA VACA outra vez!”, a turma que tinha rido na primeira parte sentiu-se ofendida, a turma que não gostara da primeira parte tinha caído na risada.

Com isso, Madame Narciso desfechara uma bolsada no velho Capitão, arremessando-lhe os óculos ao chão (tinham sido achados intactos, e devolvidos ao dono em sua casa). Diante de tal atitude, uma senhora desferira tremendo sopapo em Madame Narciso, outra tomara as dores da primeira, homens tinham entrado para desapartar e outros para brigar mais, o xarivari se estendera pelo mercado todo, logo estavam brigando por toda a parte, feirantes jogando tomates e ovos nos que brigavam, para se divertir e sendo em seguida atacados por seus alvos lambuçados – só o primeiro bolo de gente soubera do início e seu motivo, o resto fora incêndio lavrando sozinho.

Chamado a depor, o dono do bar-café só soube explicar que estava atendendo fregueses quando um chuchu viera pelos ares e lhe derrubara meia dúzia de garrafas de pinga na prateleira.

Os fregueses se assustaram e ele também, e um deles saíra para dar bolacha no sujeito que arremessara o chuchu, seu velho desafeto, outros lá fora cercaram e ele estava perdendo, ao que seus companheiros no bar-café foram ajudar, em pouco o bolo de gente entrava no bar-café… ele nem sabia por que a gritaria começara e o desgraçado viera jogar o chuchu em sua pinga.

Prefeito, promotor, juiz e delegado ouviam os depoimentos, tomados verbalmente porque não havia sentido em tomar por escrito o que claramente foi uma briga boba qualquer – já havia gente rindo – que se espalhara ninguém sabia por quê.

Tanto o pobre Capitão Juvêncio (agora sabiam-lhe ao menos o primdeiro nome) como Madame Narciso davam o caso por encerrado.

Os prejuízos tinham sido dos comerciantes e de quem levara pancada, mas ninguém se fora medicar no hospital ou posto de saúde, apenas correra o boato de que todos os leitos haviam sido tomados por feridos.

Era gente sabida demais, tratavam-se em casa e nas farmácias, os contundidos. E quem mais se envolvera soubera prevenir aos demais que, abrissem o bico, eles também abririam.

Era preciso chegar a alguma conclusão e adotar uma atitude.

Tendo em vista que o Capitão Juvêncio recuperara os óculos e presumivelmente a visão de que ainda era dotado, e por certo não cometeria outro engano daqueles; tendo em vista que Madame Narciso não queria apresentar queixa contra cidadão tão distinto e de reconhecida deficiência visual; tendo em vista que os prejuízos dos comerciantes não podiam ser imputados a pessoas determinadas, que se pudesse pegar pelos nomes; tendo em vista que a vaca Fortaleza fora uma das causas principais do ocorrido, mesmo sem saber o que fazia – animais irracionais são assim, todos estavam de pleno acordo sobre essa questão – que decisão final adotar, que satisfação oferecer ao público?

No uso de sua autoridade o prefeito Democracino determinou, após conciliábulos com as demais autoridades do Judiciário e do Legislativo, que doravante à vaca Fortaleza e qualquer outro animal maior do que o porte de um cachorro fosse barrado a entrada no Mercado Municipal.

Para não parecer discriminação contra o animal, aliás querido por feirantes, fregueses e toda a população da cidade, um dos pontos de atração e tradição do antigo mercado do matadouro e do novo, a portaria municipal proibia simplesmente a entrada de animais no recinto do novo mercado – isto é, de animais de porte superior ao de cachorros, a não ser devidamente encaixotados, amarrados e contidos – pois ali se vendia cabritos, porcos e outros bichos. Os cachorros não se podia proibir, nem os gatos.

O Sargento Dionísio teve retrato publicado em jornal da capital, apresentou-se em televisão e num short cinematográfico.

O incidente fora encerrado, mas serve ainda de comentário na cidade e a frase célebre “OLHAÍ O RAIO DA VACA!” ainda aparece nas ocasiões propínquas.

Uma semana depois a vaca Fortaleza voltava a entrar no Mercado Municipal e logo vinha a gritaria alegre e geral “OLHAÍ O RAIO DA VACA outra vez!” todos caíam na risada, os forasteiros ficavam intrigados e era um prazer relatar o ocorrido.

E os encarregados da ordem faziam vista grossa à presença da vaca, sempre podiam dizer que não estavam vendo o pacífico animal, agora muito mais bem tratado do que antes.

Até o prefeito Democracino, alertado pela zelosa esposa quanto à presença da vaca Fortaleza no Mercado Municipal, mudava de assunto e deixava de lado a portaria que lhe parecia cada vez mais ridícula.

Nenhum cabo eleitoral chegava aos pés (aliás patas) de Fortaleza, a quem ele próprio fez questão de passar a dar uma boa cenoura todos os domingos.Era quando havia mais gente no Mercado Municipal – aos domingos.

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870610-791113 Valpii.

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OLHAÍ O RAIO DA VACA!

Forma parte da Coletânea

CONTRA-CONTOS, de Affonso Blacheyre, (1928-1997),

cuja biografia está publicada no RECANTO..

Trata-se do terceiro dos contos da coletânea,.

(editado por Gabriel Solis.)

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Affonso Blacheyre
Enviado por Gabriel Solís em 02/11/2023
Código do texto: T7922914
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