Saíra-sete-cores

“Saíra-sete-cores”

Existem dias em que estamos mais felizes do que o normal. Uma excitação toma conta do ar. Tudo brilha e a mata revela uns raios de luz aqui e ali fazendo refletir nas asas dos pássaros a poesia que a Natureza oferece. Aí eu lembro da saíra-sete-cores. Pela primeira vez que a vi -eu estava conversando com uma preguiça num pé de embaúba e coçava minhas costas na folha lixenta dela- fiquei boquiaberta. Uma criança alada!

A testa era turqueza. Eu não conheço o mar do Caribe, mas ele me disse que a cor é igual. Do tamanho de um pardal, toda ágil e serelepe. Menino tem que ser assim também, colorido. Sete cores de brincar, arco-íris de rodar. Encantei.

O pescocinho verde, meio degradée. Piava baixinho, mas o canto não era lá essas coisas. Tem gente que é melhor de se ver do que de falar. Sua carinha safada mirava o outro lado da mata. Especulando depois, soube que era pra procurar as quaresmeiras da serra, lá de Minas. Era setembro e elas estavam em flor.

A borda da asa que levantava lépida e fagueira era de um azul-marinho profundo. De acordo com o ângulo da luz, brilhava. Criança brilha de qualquer lado, depois que cresce é que somente algumas prosseguem assim, lindas. Uma pena, mas as penas dessa saíra eram demais!

Nas costas um lilá tão suave que parecia um sorvete derretendo no final da tarde. Daqueles de se lambuzar. O melzinho daquele arbusto, a amélia, bem semelhante à erva-de-rato é delícia. Os humanos usam para dor-de-cabeça, para coceira. E até como diurético. È porque tem ácido tânico, disse o meu sabichão.

Descendo um pouco mais o dorso laranja forte. Aí juntaram um monte delas. Confesso que não identifiquei todas. Já que existe a saíra-canário, a de rabo-preto, a de chapéu-preto, a viúva... Essas ele já viu em Goiás. Mas as mais comuns aqui são a cabocla e a de cabeça azul. Elas se misturam como numa aquarela, fiquei tontinha.

O amarelinho quase no final das costas lembrou-me dos ovos. Assim de cor córnea, uns pingos escuros misturados com umas manchas amarelo-pardas. Legais. Pequeninos, no máximo em número de três. Botados no final do ano, nascem 17 dias depois. Nas chuvas de novembro até fevereiro. Só a fêmea choca. O ninho é bem rasinho, como tigela.

Faltou o preto que é o arremate dos contornos dela. Nem no meio das folhas de bananeira, onde gostam de fazer ninhos, ou nas proximidades dos gravatás – parente do abacaxi – elas são discretas. Sempre se movimentando, sempre trazendo alegria.

Eu vou dizer, não existe passarinho mais bonito do que a saíra. Ele vai falar que nunca viu uma delas em Goiás. Mas o cerrado não é só neste estado, assim como o arco-íris nunca aparece no mesmo lugar. O legal é saber pintar as sete cores dele e da saíra. Que tal fazermos isso num papel?

JB Alencastro