Socó-boi

“Socó-boi”

De tanto ficar observando as aves eu acabo meio desatenta. Não percebi a silhueta do gavião caboclo no céu. Ele vem descendo como um doido em direção a mim. Saí das flores amarelas dos cambarás e passei direto para uma bosta-de-cabra, sua frutinha é deliciosa, nesta época de setembro. Porém o gavião em vôo picado queria era o filhotinho de socó-boi.

Imóvel, quase sem pena, bem esticadinho o pescoço -tal qual os pais- ele ficou. Naquele ninho de gravetos, no alto da árvore. Sua plumagem era fina e larga, bem diferente do papai e da mamãe, que são iguaiszinhos quando adultos. Eles, não têm dimorfismo sexual. Macho é do mesmo tipo e tamanho que a fêmea. O rasante passou perto.

Este casal é solitário, eu aprecio. Nós dois contra o mundo. Ele grita bem grave, grossão que nem um boi e vai aumentando e depois diminuindo o tom. Ela responde. No período da reprodução eles esticam as notas. São crepusculares e também gostam do dia.

Só conheço o socó-boi ferrugem e o escuro. Este aí é o ferrugem. Bico em ponta de faca, cinza de base amarela. Olho castanho, cabeça e pescoço vermelho-ferrugem. O pescoço parece ser mais espesso do que é, e as duas linhas brancas laterais – só quem já viu o socó de frente sabe que são duas – dão o charme especial. As asas são cinza-azuladas. E os pés em garra, sem palmas. Demoram uns dois anos para ficarem desse jeito. Antes parece uma zebra, mas a listra branca já surge no pescoço.

O gavião continua beirando. Eles sempre dividem o choco e a alimentação. Cadê os pais? Não os vejo em lugar algum. Mas a camuflagem deles é muito boa, talvez estejam bem pertinho com o pescoço esticado. Ou então foram buscar uns peixinhos para o almoço.

Engraçado como essa ave apesar dos 76 cm de comprimento não é muito vista e nem divulgada. O escuro então que é um pouco maior, quase ninguém conhece. Mas tem pra todo lado. Basta prestar atenção. Ai, ai, ai! Ouvi um esturro, será a pintada? O gavião sumiu. Olha lá, que coisa! O grito do socó imitou o da onça e assustou o predador. Que bom.

Em certos momentos o melhor é ficar quietinho e só quando acuados soltamos um grito, uma reação. Aprendi muito hoje com o socó-boi. Discreto no casamento, discreto na educação dos filhos, mas sempre atento. Por isso sobrevive sem maior estardalhaço.

JB Alencastro