"O PALÁCIO DA TANAJURA MALUCA" Peça teatral infantil de: Flávio Cavalcante

O palácio da tanajura maluca.

Peça teatral infantil

De

Flávio Cavalcante.

ROOL DOS PERSONAGENS

Rainha Tanajura

Aranha

Saúva

Sinopse

Muitos pais não se relacionam com seus filhos pequeninos, até por dificuldade de entende-los, mesmo tendo a nítida certeza de que também um dia foi uma criança e passou por aquela fase nos primórdios de suas vidas. Esquecem também depois de adulto que seus pais também não lhe compreendiam e achavam que toda a sua atitude se resumia numa simples fantasia. Não seria mais fácil a compreensão deste mundo tão mágico, se estes pais mergulhassem profundamente nestes mundos pelos menos alguns ínfimos momentos de suas vidas, já que os pequeninos os têm o tempo todo como heróis? Os autores de peças teatrais infantis conseguem os aplauso dos pequeninos, porque também invadem este mundo de ilusão, falando com eles na mesma língua.

O intróito de qualquer trabalho é de primordial importância para a vida dos pequeninos, pois, a nossa responsabilidade ao escrever uma historinha, nos preocupa de aproveitar a inocência de sua ilusão, pra deixar arquivado em sua mente uma boa mensagem, já que a cabeça dos pequeninos funciona como uma fita virgem.

É uma historinha passada num reinado das formigas, onde, lá, existe uma tanajura que é maluca, malvada e maltrata a Saúva por ser uma formiga faxineira do palácio e por isso é humilhada pela sua majestade. Vive em conflito com uma velha Aranha, que fez moradia no palácio. Vive destruindo a casa de teia da velha aranha e a mesma com muito esforço termina reconstruindo, sempre se queixando por estar muito velha. Muitas coisas surpreendentes acontecem deixando muita mensagem para os nossos pequeninos e sinceros espectadores, que também merece todo o nosso apreço.

Flávio Cavalcante.

Cena escura, a sonoplastia libera uma música movimentada, que se funde com trombetas. Em cena está a Rainha Tanajura, tentando colocar os ovos nos alvéolos numa espécie de coreografia. O cenário é um palácio de formigas, onde se vê grandes alvéolos. No palco se vê o trono e alguns adereços de um palácio. Depois de várias tentativas de pôr ovos nos alvéolos, a Rainha Tanajura sai de cena solfejando a música. A cena escurece. A sonoplastia libera uma música movimentada, dando idéia de desenho animado. A luz clareia gradativamente em resistência. Em cena está a velha Aranha tecendo sua casa, mas, demonstrando estar muito velha e cansada.

ARANHA

Ah! Tou muito velha e cansada! Vivo tecendo, tecendo... E o pior é que ninguém nunca reconheceu o meu trabalho! (Sentindo dor). Ai, minhas costas! Estou muito velha mesmo! Ah! Eu sou tão infeliz... (Chora. Entra a Saúva).

SAÚVA

(Amável). Mas por que está chorando, dona Aranha? Eu poderia saber o motivo de seu choro? Tanto tempo que eu faço faxina neste reinado, eu nunca lhe vi tão triste; quanto mais chorando...

ARANHA

Quem ver cara, não ver coração, formiguinha Saúva! Você é que é feliz! Termina sua faxina e vai pra sua casa, viver sua vida em liberdade...

SAÚVA

Dona Aranha, a senhora tem toda razão! Eu trabalho que só uma condenada aqui no reinado... (Transição). Ta certo que eu vou pra casa todos os dias, mas, nem por isso quer dizer que eu vivo esbanjando felicidade por aí...

ARANHA

(Repreende). Não reclame da vida, formiguinha Saúva... No meu caso é muito diferente! Eu não consigo sair daqui pra nada! A minha vida está resumida em fazer tricô de teia! Vivo me mudando o tempo todo! Levo uma vida pra construir minha casinha e depois que eu termino, vem aquela tanajura Maluca e destrói tudo que eu levei uma vida pra construir com tanto esforço... (Transição). Ai, como eu sou infeliz, minha amiguinha... (Chora).

SAÚVA

(Penalizada). Não fique assim, dona Aranha... Não chore não... Do jeito que eu sou muito emotiva, quem vai acabar chorando, sou eu...

ARANHA

Deixe-me chorar... Por favor, formiguinha Saúva... Molhando minha teia de lágrimas, estarei assim extravasando tudo que eu estou sentindo... Veja como eu estou velha! Todo meu corpo dói... Se a tanajura Maluca destruir a minha humilde casinha novamente, eu nunca mais vou conseguir construir novamente outra...

SAÚVA

Não se preocupe, dona Aranha... Eu não vou deixar isso acontecer...

ARANHA

Mas como? Você não vai poder fazer muita coisa, formiguinha! A maluca já entra procurando sujeira por toda parte do reinado...

SAÚVA

Mas eu lhe prometo! Eu não vou deixar ela destruir a sua casinha novamente! Ela não pode ta pisando todo mundo! A senhora é bem mais velha que ela... Porém, merece todo respeito! A tanajura Maluca precisa ter uma lição para aprender a respeitar os mais velhos...

ARANHA

Você é muito gentil formiguinha Saúva... O reinado deste palácio precisa de insetinhos assim como você!

SAÚVA

Fico lisonjeada com as suas doces palavras, dona Aranha... Mas não é tão fácil como se pensa... Eu nasci pra ser faxineira! Eu não tenho nenhuma característica de rainha! Eu sou uma pobre coitada!

ARANHA

Está redondamente enganada! Você tem um poder que nem se deu conta ainda! Eu sei o segredo de como você pode se tornar a rainha deste palácio...

SAÚVA

(Feliz). Sabe?

ARANHA

Claro, que eu sei! Esqueceu que eu sou antiga aqui no reinado? Eu conheço tudo aqui como a palma da minha mão... Eu estou velha... Mas, a minha experiência de vida não conta, não?

SAÚVA

(Surpresa). Quer dizer então, que eu tenho condições de ser uma rainha do formigueiro?

ARANHA

Não só tem como você vai conquistar o trono do palácio da formigas e derrotar de uma vez por todas com essa tanajura maluca e malvada...

SAÚVA

Não... Isso não pode ser verdade! Como eu posso ser rainha se eu não sei nem por onde começar?

ARANHA

Isso não é problema nenhum! Eu vou lhe ensinar tudinho... Confie em mim... (Transição). E pra lhe deixar com mais força, eu tenho um presentinho pra lhe dar... (Dá uma manta de tricô pra Saúva).

SAÚVA

(Radiante). Pra mim? (Transição). Ah, dona Aranha... Eu não posso aceitar... A senhora levou uma vida pra fazer!

ARANHA

Não se faça rogada... Fiz pra lhe dar de presente...

SAÚVA

Muito mimoso! É uma gracinha! É muita honra receber um presente tão belo assim...

ARANHA

Não se faça de rogada, eu já disse... Uma simples e velha aranha não pode presentear a minha futura majestade?

SAÚVA

(Ri sem jeito. Entra a Rainha Tanajura aos berros).

TANAJURA

(Furiosa). Aiiiiiii... Saúva... Saúva... Onde ta você, faxineira incompetente?

SAÚVA

(Sempre amável). Estou aqui... Pra servi a minha ama...

TANAJURA

(Dando um basta). Cale a sua boca, sua formiga atrevida... Você só serve pra fazer faxina mesmo...

SAÚVA

(Chorosa). Mas o que foi que eu fiz dessa vez, majestade? Por que a vossa majestade me humilha tanto?

TANAJURA

(Com raiva e aos berros). Como tem coragem de falar com uma rainha neste tom, formiga Saúva?

SAÚVA

(Meiga). Mas... Majestade... (É atrapalhada pela Tanajura).

TANAJURA

(Aos gritos). Cale esta sua boca imunda, sua empregadinha operária, fajuta, faxineira e preguiçosa... Você nunca vai ser alguém na vida! Nunca ouse dirigir a palavra pra uma rainha sem a devida autorização... Eu não sou uma formiga qualquer, assim como você... Eu sou nobre... Não tenho sangue de barata... Tenho sangue de formiga e sangue de cor violeta, misturado com outras cores... Eu brilho como o arco-íris... Está ouvindo faxineira preguiçosa?

SAÚVA

(Amável). Desculpa, majestade... Mas, eu não tenho preguiça...

TANAJURA

(Gritando com raiva). Não me corrija quando eu estiver falando...

SAÚVA

Desculpa, majestade Tanajura...

TANAJURA

Saúva faxineira... Que fique bem claro, a sua função aqui no palácio... (Transição com falsidade). Saúva... Me responda uma coisa... (Transição). Você por acaso... Acha que eu sou maluca?

SAÚVA

Por que a pergunta, Majestade?

TANAJURA

Todos os insetos idiotas daqui do reinado das formigas andam falando que eu sou maluca! Aposto qualquer coisa que foi a besourinha Joaninha que andou espalhando por aí... Uma vez ela mesma me disse isso... Na minha cara...

SAÚVA

Ninguém pode julgar ninguém, Majestade... Principalmente sem ter provas...

TANAJURA

Mas eu julgo quem eu quiser... Afinal de contas eu sou a rainha daqui... A maravilhosa... A esplendorosa... A cheirosa... (Transição). Mas não sou maluca... (Transição). Você me acha maluca, Saúva?

SAÚVA

(Assustada). Claro... (É atrapalhada pela Tanajura).

TANAJURA

(Escandalizada). Que sim?

SAÚVA

Que não, majestade...

TANAJURA

E você acha que eu vou acreditar numa formiga desprezível empregada operária e além do mais... Faxineira e preguiçosa assim como você? Eu não vou me prestar pra isso... (Transição). Eu vou perguntar pra criançada... (Com as crianças). Vocês me acham maluca? (Transição). O que? Vocês me chamaram de maluca? (Transição). Eu não sou maluca não, viu? (Transição esquizofrênica). Aiiiii... Eiiii... Iiiii... Oiiii... Uiiii... Que ódio de vocês... Vocês agora me tiraram do sério... Vou prender todo mundo no calabouço do palácio das formigas...

SAÚVA

(Implorando). Não faça isso não, majestade! As crianças não fizeram nada com a senhora!

TANAJURA

(Repreende gritando). Saúva... Não venha defender os pequeninos... (Transição). E quer saber de uma coisa? Só porque você ta defendendo demais essas criancinhas sem graça, eu resolvi botar você na gaiola no lugar deles! Só assim, eu lhe vejo sendo comida pelo tamanduá... (A aranha interfere).

ARANHA

(Chamando a atenção da Tanajura). Majestade... Majestade tanajura...

TANAJURA

(Procurando). O que? Quem está me chamando?

ARANHA

Sou eu...

SAÚVA

(Desesperada). Não fale nada, dona Aranha...

TANAJURA

(Escandalizada). Dona Aranha? Eu ouvi direito o que você acabou de falar, Saúva?

SAÚVA

(Tensa). Eu acho que falei demais, dona Aranha... Perdoe-me, por favor...

TANAJURA

(Com raiva). Eu sabia... Eu tinha absoluta certeza que tinha alguma aranha por aqui... (Transição gritando). Saúva... Sua faxineira preguiçosa! O que anda fazendo que ainda tem a aranha no meu palácio?

SAÚVA

(Defendendo a Aranha). É apenas uma aranha bem velhinha, majestade! Ela não faz mal a ninguém! Ela só quer ficar tranqüila em sua teia, só isso...

TANAJURA

(Com raiva). Eu já disse pra você que eu não quero nenhuma sujeira aqui no meu palácio! E como você desobedeceu as minhas ordens, pode se preparar que você vai fazer parte da alimentação do terrível tamanduá...

SAÚVA

(Implorando com medo). Não faça isso comigo não, majestade! Eu não quero morrer comida por um tamanduá...

TANAJURA

Não me venha agora dar uma de coitadinha, Saúva! Eu não agüento mais olhar pra sua cara! Vamos... Entre logo na cela, que daqui a pouco o tamanduá vem ao seu encontro... Ele vai lhe adorar como banquete... (A saúva chora e entra na cela, acompanhada por uma música penosa). Agora você ta no lugar que merece, sua Saúva preguiçosa! (Dá uma gargalhada). O tamanduá deve ta morrendo de fome! (Transição com a aranha). Ah! E quanto a você, sua aranha velha e irritante... Vou agora mesmo providenciar um veneno pra acabar de uma vez por todas com a sua espécie...

ARANHA

(Com medo). Veneno? Como ser tão cruel, majestade? Eu sou apenas uma aranhazinha velha e indefesa... Por favor, não faça isso... Eu não sou má

TANAJURA

Não interessa! A sua presença aqui no meu palácio me irrita profundamente! Eu tenho nojo de aranhas... (Transição). A Saúva eu já eliminei do meu caminho! Falta só a senhora, dona Aranha! Vou envenena-la até a morte... (Ri). Eu sou uma tanajura muito má... Eu sou muito má... Eu sou terrível... (Sai dando gargalhadas sarcásticas).

SAÚVA

Ai, dona Aranha... Salve a sua pele! Desculpe-me se eu falei demais! Não foi minha intenção lhe prejudicar! Não foi porque eu quis...

ARANHA

(Compreensível). Você é uma formiga muito amável, Saúva... Não se preocupe! Deixe-me só desgarrar-me destas teias... (Tenta sair da teia). Pronto! Consegui!

SAÚVA

Tenha cuidado que a rainha Tanajura a qualquer momento pode voltar...

ARANHA

Por isso que nós não podemos ta perdendo tempo! Vamos... Eu vou lhe tentar tirar você dessa prisão... Você precisa virar rainha também...

SAÚVA

Mas eu não tenho condições, eu já disse...

ARANHA

Sem muita conversa! Não temos tempo pra isso! Vamos agir depressa, antes que ela volte...

SAÚVA

Tem que ser depressa mesmo! Se a rainha Tanajura pelo menos desconfiar, nós estamos perdidas...

ARANHA

Então, não vamos perder tempo! (Tenta abrir a cela). Esse troço ta ruim de abrir... (A sonoplastia libera um som dando idéia de que o tamanduá está se aproximando. Transição). Que barulho é este?

SAÚVA

Não sei... (Transição). Sei, sim... (Transição se apavora). Meu Deus! É o tamanduá! Ele está chegando... (Transição desesperada). Vai, dona Aranha... Depressa... Ele já tá chegando! (Uma fumaça inunda a cela. Um facho de luz azul sai de dentro de um buraco na parede dentro da cela. O bico do tamanduá aparece. A sonoplastia libera um som de aspirador de pó e a Saúva começa a ser sugada e se agarra na grade da cela com muita força). Não tem jeito! Sinto chegou o meu fim... (A aranha faz força para tentar abrir a grade).

ARANHA

Não desista! Nós vamos conseguir... Acredite em você... (Consegue abrir a grade. Segura na grade e com a outra mão segura no braço da Saúva. Ambas começam a ser sugadas).

SAÚVA

(Em desespero). Socorro, dona Aranha... Não me deixe morrer... (A Aranha puxa a Saúva para fora da grade).

ARANHA

Fecha a porta agora... (Com muito sacrifício, elas conseguem fechar a grade da cela e o tamanduá vai embora). Ufa! Graças a Deus!

SAÚVA

Graças mesmo! Muito obrigada, dona Aranha! Se não fosse a senhora, agora mesmo, eu estaria no estômago do tamanduá...

ARANHA

Você não tem nada que me agradecer! Até eu fiquei surpresa com a minha vitalidade! Não pensei que com a minha idade eu tivesse tanta força assim...

SAÚVA

Foi a minha salvação... Eu lhe devo a minha vida...

ARANHA

Você não me deve nada! É agora ou nunca, Saúva...

SAÚVA

Agora ou nunca? Mas do que a senhora ta falando, dona Aranha?

ARANHA

Não me faça pergunta! Aja como o seu coração mandar! Você vai ter que ser a rainha do palácio das formigas...

SAÚVA

Mas é impossível! Isso só se eu comer a geléia real e isso não é permitido! É crime e pode dar até cadeia... Muitas formigas já tentaram, brigaram com a majestade, perderam e depois foram expulsas e humilhadas perante todo o reinado... E se eu fizer uma coisa dessas, vou estar violando as leis das formigas...

ARANHA

Tem outra opção?

SAÚVA

Pra dizer a verdade, não...

ARANHA

Então coma a geléia real... Confie que você pode...

SAÚVA

A rainha tanajura vai me matar...

ARANHA

Ou você vai matar ela... E também pra todo efeito, ela já lhe matou, esqueceu? Pegue os potes de geléia e coma até se estufar... Vá logo, antes que ela volte e seja tarde demais...

SAÚVA

Eu já vou... Eu já vou... Vou comer, mas, eu sei que não ta certo! Se eu comer a geléia real, vai crescer minha traseira... Eu vou ficar com a traseira bem grande, assim como a da majestade!

ARANHA

Claro! Você vai ser rainha também...

SAÚVA

Mas não pode ter duas rainhas num mesmo formigueiro! Vai ter que ter a briga mortal entre nós duas...

ARANHA

Eu sei... Você briga mortalmente com ela...

SAÚVA

Brigar mortalmente com a rainha tanajura? A senhora ta maluca, dona Aranha?

ARANHA

Não tou não... Quem vencer não passa a ser rainha?

SAÚVA

É... Passa...

ARANHA

Então você vai vencer e se tornar a rainha do palácio das formigas... (Ouve-se as gargalhadas da tanajura maluca). Ela está vindo aí... Corra, vá para os alvéolos e coma toda geléia real que você puder... Coma até inchar... Vai dar tudo certo, confie... (A Saúva sai de cena). Espero que tudo dê certo mesmo... (Transição com a platéia). Vamos ajudar a Sauvinha, não vamos criançada? Ela vai comer a comida da rainha e vai crescer o traseiro, assim como o dá rainha chata! A Saúva vai precisar da grande torcida de vocês... (Entra a tanajura maluca com um enorme spray).

TANAJURA

(Olhando para o interior da cela. Transição com expressão de felicidade). Dona aranha... Uh, uh... Trouxe um presentinho pra senhora... (Transição). Cadê a Saúva? Já foi sugada pelo tamanduá? Foi muito rápido! O coitado devia ta faminto mesmo... Mais uma para o meu caderno... (Dá uma gargalhada). Há esta hora, ela deve ta trituradinha no estômago do tamanduá... Eu sou muito cruel! Eu sou muito terrível! Um a zero pro tamanduá... (Dá outra gargalhada).

ARANHA

Quem ri por último ri melhor, tanajura maluca...

TANAJURA

(Espantada). Maluca? (Com ironia). Dona aranha... Lhe destruir vai ser mais fácil do que se possa imaginar... Olhe o produto que eu trouxe... (Expõe o spray). O antídoto que tem aqui é tão poderoso, que nunca mais vai existir aranha em lugar algum do meu reinado...

ARANHA

Não aplique sua maldade em ninguém, majestade tanajura... Isso não constrói nada! Às vezes destrói a sua própria vida... (A Tanajura ri zombando).

TANAJURA

Quem é você pra ta dando ordens, sua Aranha velha e descascada? Esqueceu que eu sou uma tanajura muito maléfica? Adoro fazer maldades! E esse veneno vai destruir a sua vida, não, a minha...

ARANHA

Não esteja bem certa disto!

TANAJURA

Ora... Por que?

ARANHA

Ora digo eu, majestade... Às vezes o feitiço cai em cima do feiticeiro...

TANAJURA

(Irônica). Você deve ta brincando comigo... Eu já destruí aquela saúva antipática e intrometida... Agora é a sua vez...

ARANHA

Não esteja bem certa disso! (A saúva entra).

SAÚVA

(Aos berros). Antipática? Eu?

TANAJURA

(Tomando o maior susto). Ué! Você não pode ta aqui... Eu já lhe destruí! Eu já lhe destruí...

ARANHA

(Debochada). Não destruiu não! E pra sua surpresa, a Saúva agora é rainha também...

TANAJURA

(Dando um basta). Nunca! Vocês me traíram... Vocês me traíram... A única rainha aqui do palácio... Sou eu... Aqui não pode ter duas rainhas...

SAÚVA

(Com ironia). Não acha que temos algo em comum não, Majestade? (Expondo o seu grandioso traseiro).

TANAJURA

(Escandalizada). O que? Você comeu a minha geléia real? Você traiu? Traidora! Como teve coragem de trair sua própria rainha? Saúva... Quem diria... A faxineira preguiçosa... Querendo me roubar o trono! Eu não vou admitir uma coisa dessas... Eu vou mandar todos os guardas do palácio acabarem com vocês duas... Agora mesmo antes que isso se torne uma tarefa difícil...

ARANHA

(Debochada). Não adianta, majestade... Não ta vendo que a Saúva deixou de ser aquela simples formiga faxineira e preguiçosa e agora virou rainha também? Os guardas não podem atacar uma rainha...

TANAJURA

(Furiosa). Malditas! Malditas são todas as saúvas do reinado das formigas... Eu não devia ter dado confiança pra nenhuma delas... Todas as saúvas estão no olho da rua... Inclusive você...

SAÚVA

Não tem mais jeito! Não adianta resmungar... Bem que poderíamos unir as forças e reinarmos juntas... Pela primeira vez em toda história do reinado das formigas, vai existir um formigueiro com duas rainhas no comando...

TANAJURA

(De salto). Nunca! Dividir o meu reino? Nunca! E você está despedida! Fora do meu reino...

ARANHA

Você não pode despedir uma rainha também... Ela também reina...

TANAJURA

Você acha isso correto, Saúva? Querendo subir na vida, puxando o tapete dos outros? Isto não acenta pra você...

ARANHA

Não dê ouvido a ela, saúva...

TANAJURA

Você não entende nada de reinado... Tem uma população imensa que depende de mim, que modéstia parte já tenho experiência suficiente... Afinal de contas eu tenho anos de reinado... Você só sabe fazer faxina... Não administrar um reino como este...

SAÚVA

(Amável). A senhora tem razão, majestade... Eu não quero atrapalhar ninguém... Realmente eu agi errado... Eu vou embora... É melhor assim... (Faz menção que vai sair). Se eu pudesse reverter o quadro! Eu queria ser saúva novamente...

ARANHA

(Desesperada). Não faça isso, saúvinha... Ela está tentando lhe derrubar emocionalmente...

SAÚVA

Eu vou embora... Me desculpa, dona Aranha, mas, não foi essa educação que eu recebi... Eu não sei puxar o tapete de ninguém pra subir na vida... Adeus...

ARANHA

Eu não estou lhe entendendo, Saúva... Lembre-se que agora você também é rainha... Não volte atrás... Você não vai fazer uma coisa dessas... Este reinado precisa de formiga com bom coração, assim, igual a você!

TANAJURA

(Aos berros). Eu já mandei sair...

ARANHA

(Desesperada). Não vá... Por mim... Não vá...

SAÚVA

Não, eu não posso ficar... Por favor, entenda, dona Aranha... O palácio já tem rainha! Eu estou morrendo de vergonha! Desculpe, majestade... (Chora e vai saindo).

ARANHA

(Chorando). Não se vá, majestade... Não se vá... (Com a criançada). Meus amiguinhos peçam pra ela não ir... Por favor... Todos pequeninos tão querendo que você fique...

SAÚVA

Amo a todos vocês, meus amiguinhos... Do fundo do meu coração... Mas eu não posso fica... Adeus... Estou indo... Vou aproveitar que as minhas asas estão desenvolvidas e vou pra bem longe daqui... Adeus! (Sai em prantos).

TANAJURA

(Com ironia). Muito boazinha, a sua amiguinha, dona Aranha... (Dá uma gargalhada de zombaria. Transição com a criançada). Ta vendo? Meninada chata? Ela se foi como um passarinho... Agora eu vou reinar sozinha... A boazinha foi embora... (Dá outra gargalhada sarcástica. Transição). Agora... Eu não posso falar a mesma com a senhora, dona aranha... (Transição com raiva). Agora sim, eu vou destruir! De uma vez por todas eu vou lhe eliminar da minha vida pra sempre... Aliás, por que não lhe dar de presente para o tamanduá??

ARANHA

(Com medo). Para o tamanduá? Não, não vai dar certo... Eu já tou velha, majestade... Pode dar indigestão no bicho...

TANAJURA

E o que eu tenho a ver com a sua velhice? E vamos acabar com isso logo! Entre na jaula...

ARANHA

Eu? Entrar na jaula? Mas...

TANAJURA

Não tem mais nem menos! Entre depressa que eu não posso perder mais tempo...

ARANHA

Eu não quero entrar... O tamanduá vai sugar...

TANAJURA

É exatamente isso que eu quero! Ver-la sendo sugada pelo tamanduá...

ARANHA

(Em desespero). Socorro... Saúva... Salve-me por favor...

TANAJURA

Ninguém poderá lhe ouvir! Vamos entre logo que o tamanduá já está chegando...

ARANHA

(Chorando). Eu não vou... Estou muito velha pra ser comida por um tamanduá... Ele pode ter indigestão...

TANAJURA

(Irritada). Entre logo nesta jaula, antes que eu perca o pouco de paciência que ainda me resta...

ARANHA

(Relutando). Eu já disse que não vou entrar!

TANAJURA

(Empurrando). Ah, vai...

ARANHA

(Tentando reagir). Não vou... (Gritando). Socorro... (Transição com a criançada). Meus amiguinhos da platéia... Chamem a saúva por favor... Ela quer me matar... Socorro... Chamem rápido... (Entra a Saúva).

SAÚVA

(Gritando). Solte a dona Aranha, sua formigona velha e malvada... Ouvi a chamada dos meus amiguinhos pequeninos...

ARANHA

(Aliviada). Saúva? (Aplaude a saúva). Que felicidade... É muito bom lhe vir novamente...

TANAJURA

(Espantada). Você novamente? Fora do meu palácio... Saúva intrometida! (Alucinada). Guardas... Guardas... Soldados... Onde estão estes guardas irresponsáveis?

SAÚVA

(Debochada). Eles não vão lhe obedecer... Afinal de contas, eu também sou rainha e não sou maluca...

TANAJURA

(De salto e com raiva). Maluca? Que desacato! Não tem problema... Vão morrer... As duas...

ARANHA

(Feliz). Vai, sauvinha... Mostre pra ela que você também é rainha...

SAÚVA

A única! Por isso que eu resolvi voltar... Não pode ter duas rainhas no mesmo formigueiro... Eu fui saindo do palácio e observei que todo reinado está parado... E me informaram que só volta a funcionar quando uma rainha for eliminada... Eu não vou deixar esse trono! Estão esperando o resultado da briga mortal... Estou preparada, majestade...

TANAJURA

Briga mortal? Eu não sou de brigar com ninguém... Faz muito tempo que eu não sei o que é isso... Quem manda no palácio ainda sou eu... Eu não vou perder o meu trono pra você... Nunca!

ARANHA

Não tem outro jeito, Tanajura... Se não quiser brigar, o trono já está nas mãos da saúva... Para alegria de todo formigueiro... Eu posso ser a Juíza da luta... (Começa a luta como se as duas tivessem num ringue. As duas começam numa luta coreografada, acompanhada de uma música. Ao terminar, a rainha acaba sendo derrotada, mas não aceita a derrota, apertando o pescoço da saúva).

TANAJURA

Eu não vou perder assim facilmente! Você nunca mais vai querer roubar trono de nenhuma rainha...

SAÚVA

(Quase asfixiada). Eu tou morrendo, dona aranha... Essa desgraçada ta me enforcando...

ARANHA

Isso é que é roubo... Tanajura você está desacatando as leis do jogo... A vencedora é a Saúva... (Tenta salvar a saúva das garras da tanajura). Solte a Saúva, sua majestade perdedora...

TANAJURA

(Empurra a aranha). Sai pra lá, aranha velha... (A aranha cai. A Saúva se revolta).

SAÚVA

Na vovó aranha, não... (Empurra a tanajura. Abre a porta da Jaula).

ARANHA

Dê uma lição nela, Saúvinha... Afinal de contas você também é rainha...

SAÚVA

Agora dê adeus as suas maldades, sua majestade fajuta... (Faz menção que vai acionar um botão).

TANAJURA

(Aos berros). Não toque neste botão, Saúva faxineira intrometida...

SAÚVA

(Com a dona Aranha). Se segure em algum lugar, dona Aranha... (Aciona o botão. A sonoplastia faz um barulho de aspirador de pó e a iluminação faz efeito de luz dançante em várias cores. A rainha tanajura é sugada para dentro da jaula. A dona Aranha fecha a jaula no cadeado. Tudo volta ao normal).

TANAJURA

Não vai adiantar nada... Eu acho melhor vocês me libertarem... O tamanduá já é meu conhecido! Ele jamais vai me atacar...

SAÚVA

Não esteja bem certa disso, majestade derrotada... (Com a criançada). Vamos meus amiguinhos... Vamos eliminar o mal de uma vez por todas... Vamos chamar o tamanduá... (Incentivando as crianças). Tamanduá... Tamanduá... (A tanajura solta uma gostosa gargalhada).

TANAJURA

(Gritando e com raiva). Eu vou arrebentar estas grades... (Fica batendo na grade dando idéia que ela vai conseguir sair).

ARANHA

Se prepare pra chorar depois, tanajura... (Com as crianças). Vamos chamar o tamanduá mais rápido, meus amiguinhos, antes que ela saia da jaula... Tamanduá... Tamanduá... (A sonoplastia libera o som de tensão. A iluminação joga fachos de luz em várias cores. A rainha tanajura se desespera. O bico do tamanduá aparece. A tanajura consegue abrir a porta da jaula, fazendo um barulho enorme). Agora eu vou mandar todas vocês para o inferno... (A sonoplastia libera um som de aspirador de pó. Rainha é sugada aos berros pelo tamanduá). Nãããããooooo... Maldiçããããoooo... (Tudo volta ao normal).

SAÚVA

Foi contra a minha vontade, dona Aranha...

ARANHA

(Feliz). Que felicidade, Saúva... Que felicidade! Quer dizer... Majestade! Finalmente pela primeira vez, este palácio não pertence àquela tanajura maluca... Agora sim... Só falta agora o seu vôo nupcial para a sua fertilização...

SAÚVA

Eu tou com medo, dona Aranha...

ARANHA

Medo de que, Majestade saúvinha?

SAÚVA

Não sei... Acho que é por ser a primeira vez...

ARANHA

Aja com o coração! Deixe as coisas acontecerem de forma natural... (A sonoplastia libera um som de muitas abelhas). Escute! Os zangões já estão lhe esperando para a fecundação... Precisa ir agora... Ao voltar o reino inteiro irá lhe coroar... Você será definitivamente a nova majestade do palácio da tanajura...

SAÚVA

(Se cheirando). Estou com um cheiro muito forte... Acho que vou passar mal...

ARANHA

Ferormônio sexual... Perfume que a realeza libera para atrair os machos... Agora vá... Não perca tempo... (A saúva bate as asas. A sonoplastia libera uma música, dando idéia de fecundação da rainha. A saúva faz uma bela coreografia e no meio da música é coroada pela Aranha). Viva a nova rainha, majestade Saúvinha... (Continua a coreografia para apresentação dos atores, chegando assim, o fim da peça. “O PALÁCIO DA TANAJURA MALUCA”).

- Fim -

Peça: O palácio da Tanajura Maluca

Autor: Flávio Cavalcante

Mês: Junho

Ano: 2003

Flavio Cavalcante
Enviado por Flavio Cavalcante em 01/12/2015
Código do texto: T5466199
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