As três Marias e as vassouras encantadas

Existia sim um casal que morava naquele sítio próximo ao rio. Ele se chamava Chicó da palha, um criativo artesão que transformava palha de carnaúba em bolsas, tapetes, esteiras, jarros, espantalhos, nossa, era tanta coisa bonita que quando ele chegava na feira todo mundo queria comprar as coisas que ele expunha ali. Um senhor risonho, de poucos cabelos e um sorriso largo. Chicó da palha era casado com Dona Mimosa, a melhor fazedora de alfenis da redondeza. No período da quermesse, das festas de São Sebastião, os romeiros compravam aos montes os doces que mais pareciam ser obras de arte.

Era um casal feliz. Tiveram três filhas, a mais velha se chamava de Maria Leocádia, uma menina esperta, de cabelos compridos ruivos, um nariz afilado e sarna nas maçãs do rosto. Gostava de subir em árvores, colecionar insetos e desenhar baratas. A segunda filha se chamava de Maria Leidilandia, uma menina gorducha, cabelos de cachos, muito boa nos números. Gostava de colecionar fotos antigas, dos familiares antigos e de acompanhar a mãe na feitura dos Alfenis só para despistar a mãe e comer mais que o permitido dos deliciosos doces. Morria de medo de insetos e entrava em briga com a irmã porque gostava de rasgar os desenhos das baratas. A terceira filha era a Maria Lucrécia, foi uma gestação difícil, Dona Mimosa foi mordida por um rato e sofreu muito na hora do parto. Maria Lucrécia era uma menina magrinha, cabelos negros lisos e volumosos, olhos redondos e esverdeados. Gostava de unhas grandes e de criar gatos. Aprendeu a ler sozinha, tinha uma mania de tremer os músculos da boca e gostava de roupas escuras. Era gulosa por queijo e não gostava muito quando a mãe lavava as cobertas de sua cama.

A vida ficou difícil, uma seca grande secou o rio, as carnaúbas foram ficando escassas, ninguém mais se interessava pelo pouco artesanato de palhas e alfenis feitos pelo casal. Chicó da palha então teve uma ideia, existia uma carnaúba detrás da casa que fora plantada pelo bisavô do Chicó! Segundo a família, era uma carnaúba encantada, só deveria ser usada em tempos de crise severa. Já sentindo o cansaço do corpo, o peso da idade dele e da amada, Chicó resolveu colher as palhas da carnaúba e fazer três vassouras, uma para cada filha.

Reuniu as filhas, explicou a situação e deu a cada filha dizendo que as palhas daquela carnaúba eram encantadas, deveriam ser usadas apenas em tempos de extrema dificuldade.

As três irmãs já eram moças formadas quando os pais se foram. Maria Leocádia arranjou casamento com um caixeiro viajante, arrumou as coisas, pôs na carroça e se foi, não percebeu que a vassoura tinha ficado em cima das malas e numa curva caiu e ficou para trás! A vassoura ficou de pé, varreu a poeira, transformou a seca em fartura e um lindo lago, uma ponte e uma praça surgiram ali com uma quadra gigante e muita alegria na vida dos meninos e meninas de lá. Pela displicência e não ter cuidado direito da vassoura, mais adiante, o casal foi vítima de saqueadores que levaram as malas, o cavalo da carroça e todos os pertences dos dois. O casal teve de voltar, mas nunca mais encontraram o caminho de volta.

Maria Leidilandia ficou encantada com um circo que chegara na Cidade, engraçou-se com o atirador de facas e apaixonada resolveu ser a mulher que ficava na tábua giratória que apagava as facas do atirador. Casaram-se e ela se foi com o circo. Pegou a vassoura, pôs na bagagem deixando as palhas sobrando. Um elefante ali bem perto comeu as palhas e sem explicação, o elefante quebrou as grades da jaula, passou a voar no céu e num arroto de alegria, saiu de dentro de si uma nova lona para o circo, tão linda, mas tão linda que chamava a atenção de todos. Junto a lona, também vieram bailarinas voadoras que passaram a ser a mais nobre atração do circo e como não bastasse, vieram também dois elefantes malabaristas. Numa mais Maria Leidilandia deu notícias, saiu por aí com a trupe circense.

Maria Lucrécia ficou no sítio , descobriu o livro de receitas da mãe, com dificuldades começou a fazer Alfenis e a vender na porta do circo, também na Praça Nova da cidade nova, vendia também perto da roda gigante. Certo dia, achando o sítio muito sujo, resolveu fazer uma limpeza! Lembrou da vassoura ganha do pai e das palavras dele, usar somente em caso de extrema necessidade. Pegou a vassoura e passou a varrer o terreiro.

Para sua surpresa, a vassoura passou a ganhar força, a querer varrer mais e mais e sem entender, a vassoura foi subindo, subindo e quando voltou a si, estava sobrevoando toda a cidade!

De volta à casa, viu que o sítio da família estava perfeito, o rio de antes, as carnaúbas...

Maria Lucrécia se casou com um lenhador amigo dela desde criança, que passou a fazer vassouras para vender, mas nenhuma encantada igual a de Maria Lucrécia.

Tiveram seis filhas e um filho. Eram felizes, menos na hora de dormir, porque o lenhador tinha um ronco que não deixava ninguém dormir direito.