Sal

-Chegamos!

Estas foram as primeiras palavras em solo californiano, assim que o carro parava em frente a uma enorme casa em tom de creme, com janelas largas e um jardim na entrada. Claire não conseguia parar de olhar.

O sol brilhava como só na Califórnia se via. Na rua, pessoas desfilavam seus corpos bronzeados e cabelos ao vento. Significava que estavam oficialmente de volta.

Saindo do carro, Claire observa a paisagem local fazendo notas mentais de identificação e reconhecimento. Seu pai sempre teve dinheiro, mas esta seria a primeira vez que viveria em um local como aquele. Parecia saído de um cenário de filme, ou mais precisamente parecia fazer parte de um.

Mais a frente no quarteirão, por onde o carro agora seguia, haviam casas, se é que podiam ser chamadas de casas, aonde deviam morar pessoas que trabalhavam nos filmes. Mas apesar de impressionada com o local, que haveria de se acostumar, Claire não estava deslumbrada com a ostentação e nível hierárquico do local. Estava de volta.

Claire havia crescido naquela cidade e os últimos cinco meses fora foram longos demais. Nunca havia passado tanto tempo longe de seus amigos, apenas com seu pai e Robbie, seu irmão, quase cinco anos mais velho.

A cidade era a mesma, mas o bairro não. Claire crescera em uma região mais retirada, longe do centro e que não era conhecida pela beleza de suas casas. Agora estaria convivendo com outro ambiente, novos vizinhos, novo colégio.

Enquanto traziam a bagagem para dentro da casa, já previamente mobiliada, Claire notava as diferenças com suas habitações previas. O lugar era mesmo muito grande, até demais, e os moveis eram, estranhos. Pareciam intocados, como parte de um museu ou mais precisamente de uma exposição de design para celebridades. Ela balançava a cabeça e via Robbie rindo de sua expressão.

-Não gostou do azul ciano da novíssima linha de moveis...

-Robbie é cedo. Porque você não adianta as caixas lá fora?

Robbie se aproxima dela e pega a caixa que ela carrega quase derrubando, porque fez questão de pegar sozinha, mesmo sabendo que era pesada demais, mas continha seus pertences e ela devia se responsabilizar.

-Pode deixar, eu não vou quebrar.

Eles sorriem e Robbie a ajuda a levar a caixa.

Depois de levarem a maior parte das coisas para dentro e fazerem uma rápida refeição de comida delivery, Robbie se despede e parte em seu carrinho, que não combina com o estilo da casa. Tem aula na universidade no dia seguinte, e o campus fica ha algumas horas da casa em que estão. Nos dias de semana Robbie tem um dormitório lá.

Assim que se despede, Claire olha novamente para a casa e se da conta de como será estranho um lugar tão grande para tão poucas pessoas. Ela cresceu acostumada com a casa cheia e não de funcionários, o que por enquanto não havia nesta casa. Mas a vista era mesmo muito bonita.

A vizinhança parecia tranqüila e quieta demais. Não haviam muitas pessoas nas ruas. Claire sentia falta de seus amigos, estava ansiosa para reencontrá-los. Agora estavam separados por uma quase estrada de cerca de trinta quilômetros. Claire não tinha carro e sua habilitação ainda era provisória.

Assim que terminou de levar suas coisas para o quarto, Claire percebeu uma mensagem em seu celular. Era de Lisa, sua melhor amiga desde os quatro anos e meio. O que já contava quase doze agora. Ela já estava a caminho para encontrar Claire em seu novo bairro.

Uma das coisas que ambas gostavam de fazer, além de zoar pelas ruas com os garotos da vizinhança, treinar beisebol e observar os garotos da universidade do antigo bairro saírem da aula, era tomar sorvete. E Claire já tinha ouvido falar que perto de sua nova casa havia uma ótima e famosa sorveteria.

Quando Claire entrou no local, Lisa já estava aguardando por ela ali. Claire olhou para ela abrindo um sorriso e reparou que seu cabelo já estava mais comprido do que da ultima vez que a vira, era cor de chocolate e ela gostava de deixá-lo ondulado, mesmo para jogar com capacete. Mas naturalmente ele tendia para liso, mesmo que não tanto quanto o da própria Claire, o representava quase uma hora de baby liss antes de sair de casa. Mas Lisa tinha essa paciência.

Elas se abraçaram por longos três minutos e logo parecia que os cinco meses nem tinham existido. Lisa puxou de leve a orelha esquerda de Claire e falou sorrindo.

-Da próxima vez que você nos abandonar, vai precisar de mais que sorvete!

E em seguida puxou Claire pelo braço ate uma mesa aonde estavam sentadas sete pessoas, todos antigos conhecidos das duas, incluindo Joe, o irmão mais velho de Lisa e também amigo de Claire ha anos. Eles pediram seus extravagantes sabores de sorvete, com nomes divertidos que nenhum deles tinha ouvido antes. Todos vinham com pedaços de frutas ou castanhas, confeitos e misturas diferentes e eram adoçados com ingredientes listados em índices de revistas de moda, das quais seus novos vizinhos pareciam ter saído.

Lisa e Claire trocavam olhares constantemente em referencia a quantidade de maquiagem das garotas, plástica de suas mães e a preocupação excessiva com a forma de todos se vestirem. Sua mesa era definitivamente o chamariz, por serem os mais diferentes do estabelecimento, com seu visual street, alguns com cabelos bagunçados, ninguém com roupa de marca e as garotas com pouca maquiagem, exceto por Sally, a garota roqueira com sua super sombra preta, marca registrada.

Assim que terminaram suas maravilhosas taças de sorvete, que substituiriam o jantar facilmente, a maior parte do grupo se despediu prometendo se ver em breve e Lisa acompanhou Claire ate sua nova casa, a pé. Passaria a noite ali. As duas se divertiam observando o bairro, que não visitavam desde a infância, mas que sem duvida era bonito, super arborizado e com uma bela vista para uma praia pacifica.

-Bem diferente do antigo, hein! – Lisa diz empurrando suavemente a amiga.

Claire a empurra de volta dizendo.

-Você ainda nem viu o interior da casa, com os moveis de catalogo de celebridade.

Elas se aproximam da casa de Claire e vêem passar um grupo de garotos em um conversível. Ouvem som alto e riem, desaceleram um pouco ao passar por elas, jogam uma lata de cerveja no chão e depois saem cantando pneus.

-Essa vizinhança é estranha, Claire, parece pior que --------------------.

-Imagina como deve ser o colégio.

Elas vão andando devagar,parando para observar detalhes da paisagem. Lisa então revela.

-É sobre isso mesmo que eu queria falar com você. Acho que vamos continuar a ser colegas de colégio.

-Mas Lisa, você tem noção do valor da mensalidade do lugar! Nem meu pai vai pagar integral pra mim.

-Pois é Srta. Riquinha, mas não foi só você que consegui bolsa por aqui.

-Mas porque você ia querer ir pra lá? E não diga que é pela minha companhia... o que você aprontou? Foi expulsa do publico finalmente? Se o Ben não foi, não ia ser você...

-Nada disso. Eles estavam oferecendo bolsas, por conta do programa para entrar na universidade e minha mãe se empolgou com a idéia de você ir para o colégio chique e me sugeriu, bom forçou levemente a fazer o teste e eu passei, parece que minha tia tinha um contato que me passou a data da prova e eu fiz.

Essa noticia aliviava muito para Claire. Ser a novata em outro colégio ate não era um desafio tão grande, mas em um lugar tão diferente e por tempo indeterminado podia ser qualquer tipo de experiência. O que significava que tinha grandes chances de não ser positiva. E uma das coisas na qual ela não era boa era em ser sozinha, ainda mais em um colégio sem time de beisebol e tendo que voltar para uma casa vazia, gigante e vazia, porque seu pai era desligado e esquecera de contratar alguém para limpar ou cuidar do jardim. Comida não seria um grande problema, pois ela sabia se virar na cozinha.

Logo a suposta ultima semana antes das aulas começarem estava no fim. Claire tinha terminado de desempacotar a maior parte das coisas e já estava se familiarizando com o novo ambiente, aprendendo a se locomover por ali, a pé, por mais que possuísse uma carteira de motorista, recém adquirida.

Depois dos primeiros dias de cansaço extremo, ainda do vôo e da mudança, conseguiu finalmente uma carona e foi ate seu bairro antigo. Lá reencontrou mais amigos e outros membros de sua família, como sua mãe. Elas costumavam ter um relacionamento tranqüilo, mas como Claire não sabia o motivo exato que levou seus pais a se separarem quando ela era um bebe, não sabia como sua mãe se sentiria quanto a mudança.

Chegando na rua, Claire já reconhecia pessoas, que acenavam e sorriam. A casa estava exatamente igual a como Claire se lembrava. Dois andares, cor de terra com tijolos pintados de marrom e um telhadinho típico das casas do bairro. Era razoavelmente menor que sua nova habitação.

O encontro com a mãe ocorreu tranqüilo, se abraçaram. Tinham mantido contato durante os últimos meses e sua mãe esperava que passasse a noite ali. Mas Claire teria aula no dia seguinte, então ia retornar com Lisa para a casa de seu pai. A visita não foi longa, mas sua mãe pediu que ela voltasse em breve, e perguntou algumas vezes se não queria voltar a morar ali. Claire cogitaria voltar ao bairro, mas com o novo colégio iniciando as aulas e ela vivendo bem com o pai, iria manter a situação como estava por enquanto.

Quando já estava quase se despedindo, entrou fazendo barulho com seu salto alto e milhares de acessórios, Sam, irmã mais velha de Claire. Ela largou as coisas na mesa da sala, notou Claire e lançou um seco oi. Não parecia nem um pouco motivada com a idéia de tê-la de volta para dividir o quarto. Não tinham gostos muito parecidos e Samantha tinha oito anos de diferença com Claire, mas desistiu da faculdade no inicio de seu primeiro ano e fazia agora curso em uma comunitária perto de onde vivia. Gostava de trazer seus namorados para casa e ouvir musica em alto volume, jogando suas roupas por ai a não se importando muito com o espaço dos outros moradores da casa.

O reencontro entre irmãs não foi muito caloroso e logo Sam subiu para o quarto, que era só dela no momento, mal se despedindo após poucos instantes de conversa. Não era novidade para o relacionamento da duas. Claire já estava atrasada para encontrar Lisa e voltarem para sua casa. Despediu-se da mãe dizendo que voltaria no final da semana.

Quando Claire chegou na casa de Lisa, a três quadras da sua, ela não estava na frente esperando. Claire toca a campainha e é Joe quem abre a porta.

-Oi, Claire. Ela ta terminando de pegar as coisas. Quer entrar?

-Valeu. Vai demorar?

-Acho que não...

Eles sentam em um banco que fica na entrada da casa. A casa de Lisa não é muito diferente da casa da mãe de Claire no tamanho, mas é azul e o jardim da frente é maior e com maior variedade de flores. O banco de madeira sempre esteve ali.

Faz um pouco de sol e o raio refletido na direção da casa atinge exatamente os olhos verdes de Joe, que se afasta ficando mais próximo de Claire, enquanto tira mechas de seu cabelo escuro e bagunçado que caiam em seu rosto. Ele não era muito parecido com Lisa fisicamente, mas sempre se deram muito bem, ele tinha dois anos a mais que as meninas e Claire o conhecia a praticamente tanto tempo quanto à Lisa.

Eles conversavam sobre o novo colégio das meninas e o ultimo ano de Joe no colégio publico. Ia ser estranho irem para novos lugares, ele pensava em universidades.

-E pra onde você pretende ir?

-Não tenho certeza... parece tudo muito estranho, sabe?

-Sei. Mas acho que o Robbie ta bem. Não reclama.

Eles riem.

-Sei lá. Ir pra longe, sem grana... me formar, muito distante.

-Meio irreal, eu sei. Mas pelo menos você fica livre do colégio.

-Não sou eu que vou pro elite com meus novos amigos bilionários. Ah não, eu sou um dos novos bilionários!

Ele interpreta e Claire empurra ele rindo. Lisa chega pronta para sair.

sonhadora insone
Enviado por sonhadora insone em 22/06/2011
Código do texto: T3051579
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