[Original] Volver - Capítulo 7

Capítulo 7 – Do que as mulheres gostam.

Demétri Scholz

Cheguei em casa com uma conclusão muito séria.

Jamais chame uma mulher de "imã a problema". Isso ofende e muito. E além de ofender, gera a famosa e entediante D.R. E acredite, D.R não é legal como mostram nos filmes americanos.

Bruna continua braba comigo, disse que eu às vezes me contradigo. Eu ainda tentei amansar a fera puxando-a para um beijo, mas ela me beliscou no braço e disse que estava na hora de eu aprender a leva-la a sério. Eu a levo a sério. Sempre a levei.

À noite com o tédio me dominando e a falta da Bruna me enchendo, tomei um banho rápido e sai para andar pelo centro de Porto Alegre. Eu estava próximo da praça quando encontrei Lucas andando de skate com alguns amigos. Ele estava ficando cada vez mais parecido com o Lennon. E não sei se estou ficando velho, ou se é esse piá que está crescendo demais.

- Ow bonitinho do papai! – Chamei, fazendo-o se virar para mim. Os amigos dele riram. Lucas bufou. – Fica tímido não, vem cá com o pai!

- Bah! Tinhas que ser tu. – Em cima do skate, Lucas se aproximou. – E aí, milagre é esse tu na rua? Achei que estava com a Merten. Teu ar é ela e tal.

- Antes grudado em guria, do que em guri. Sabe como é né? – Dei dois tapinhas em seu rosto. Ele ficou ainda mais brabo.

- Qual foi? Tá engraçadão hoje hein? Me ensina a ser engraçado assim cara.

- Tu ainda fede a leite em pó, quando tu crescer eu te ensino.

- Ahhh, te fode ow! – Ele saiu de cima do skate e sentou-se no banco (mais antigo que minha avó quando usava saia) da praça.

- É sério. Tu ainda tem muito o que aprender. Não sacou, por exemplo, que aquela guria de roxo – Apontei discretamente para uma guria que não devia ter mais que 16 anos e fitava Lucas com um sorriso de canto. – Quer ficar contigo.

- Ahn? – Ele perguntou, pasmo. – Como tu sabe?

- A forma que ela te olha, o jeito que sorri e agora mexe no cabelo... – Lucas não estava me levando a sério. – Bah, ela pode estar olhando pra mim que sou realmente gostoso, mas to velho demais pra pegar guria novinha assim. – Ele franziu o cenho. Estava dividido entre a vontade de acreditar e o medo de eu estar zoando com sua cara. – Mulher gosta de atenção, não esqueça disso. E mais importante: gestos às vezes dizem tudo. Tu tens que saber ler as gurias.

- Ah, tu leu a Bruna? – Perguntou, gargalhando alto.

Atrevido esse irmão do Lennon.

- Ih, qual é?

- Ah, foi mal. Sei lá... Se a guria não chegar, dificilmente chego.

- Tu é a mesma coisa que o Lennon era nessa idade. E olha o resultado disso? Tá praticamente casado com uma paulista.

Ele fez o sinal da cruz três vezes.

E juntos, repetimos a famosa frase que o dito-cujo dizia 1 ano antes.

- “Guria paulista é só pra um pente.”

- Meu irmão é foda.

- Aham, mas então... Aproveitando que eu estou legal pra caramba, vou te ensinar umas paradas antes que alguma guria mercenária te prenda num namoro e te faça virar pai antes de tu viver as melhores coisas da vida.

(...)

- Chega na de roxo e fala o que eu te disse. Ela tem cara que curte um guri inteligente. Tu é, apesar de ter o irmão que tem. – Lucas respirou fundo, ajeitou o boné no cabelo e foi até a guria. Não deu outra, em 10 minutos de conversa eles já estavam rindo. E foi assim pelo resto da noite, dei vários conselhos e dicas ao caçula Dias. Ele conseguiu o telefone de 15 gurias e ainda ficou com outras 4. – E aí?

- Bah... Tu é meu herói, Demétri!

Bruna Merten

- Depois a culpada pelo casal não dar certo é quem? Bruna Merten! – Tão invocada quanto uma mulher que perde uma liquidação, eu entrei em casa fervilhando de ódio de Demétri. – GURI IDIOTA, BURRO E ESTÚPIDO. – Gritei, jogando minha mochila no chão, com raiva. - “Tu é um imã a problemas.” – Repeti, infantilizando sua voz. - E quem ele pensa que é? O santo Demétri que perdoa todos os chifres que recebe?

Ah! Faça-me o favor! Se ser bom valesse a pena já haveria muita gente canonizada a santa.

Parei no meio da sala e revirei os olhos.

- Bah, o que eu estou dizendo? – Entrei em meu quarto e tirei a roupa ali mesmo. Esse era o lado bom de morar sozinha. A privacidade prevalece. Segui para o banheiro e tomei um longo e delicioso banho. E como banho também é momento de reflexão, aproveitei pra repassar meus últimos dias após voltar com meu ex.

Demétri é um caso sério. Ele fala, insiste e repete que o problema sou eu, mas se avaliarmos a situação atual, o ponto negro da história está sendo ele. Juro que não quero tirar o meu da reta. Sei que sou triste, dramática, maluca, estranha, nervosa, tenho o humor inconstante e um milhão de coisas. Meu digníssimo namorado não vê o meu esforço pra tentar fazer com que nossa relação dê certo. Acho que Demétri me vê como um tipo de vilã fatal. Ama, deseja, quer, tem, mas odeia irrevogavelmente. Sim, ele me odeia. E se formos debater essa história racionalmente, podemos concluir que o que sustenta a nossa relação é o nosso ódio infinito um pelo outro. Quem precisa de irmã psicóloga quando se é possível analisar toda a sua vida durante um banho de espumas, ahn?

Após meu banho, me troquei vestindo uma roupa leve e quentinha. Como não estava com fome, deitei na cama e em minutos cai num sono rápido e intenso.

Dia seguinte

- Bom dia, gurias! – Entrei em minha loja com um sorriso tranquilo. Minhas funcionárias me olhavam surpresas. – O que?

- Bah, chefa, tu está linda!

Muita delas era até mais velhas que eu, mas acostumaram a me chamar de chefa. O que torna a parte de comandar uma loja muito mais emocionante.

- Sério? Também achei isso quando me olhei no espelho. – Falei, brincalhona e verdadeiramente convencida.

Preciso controlar meu ego. Eu sei.

Entrei no corredor dos fundos que dava acesso ao meu escritório e esperei a pontual Maria entrar em minha sala.

- Bom dia! Chefa, tua irmã ligou e disse que é pra retornar... – Suspirei. – E ela parecia levemente agitada.

- Eveline é sempre agitada. – Eu disse, entediada. – Vou ligar. Mais alguma coisa?

Pendurei meu casaco rosa na cadeira.

- Ah, e tem isso também, só 1 minuto. – Maria saiu da sala e voltou 2 minutos depois com um imenso buquê em formato de coração e... Ai meu Deus!! Feito de chocolate. Sacanagem fazer isso com uma chocólatra não assumida como eu. – Tem um cartão dentro.

Estendi a mão e ela delicadamente colocou o presente na mesa. Eu sabia de quem era, claro.

Maria se retirou e eu li o conteúdo do cartão.

“Tu tá braba ainda, eu sei e com razão, eu sei também.

Sou mesmo um idiota, mereci ouvir tudo aquilo que me disse ontem... Mesmo que eu fique debatendo contigo. Acho que me acostumei tanto a sempre estar certo quando o assunto somos nós dois que ainda não aprendi a agir diferente. Vou tentar, assim como tu está tentando lutar pela gente. Eu te amo. Muito.

Obs: Espero que ainda goste de chocolate com pimenta.”

E no cantinho do cartão estava a inconfundível assinatura de Demétri.

- Como tu pegou no meu ponto fraco, admitiu o óbvio e ainda foi gentil, está perdoado. – Falei, como se respondesse diretamente a ele.

Meu dia fora agitado, minha ausência acabou gerando acumulo de compromissos e algumas viagens que eram essenciais para o andamento da loja e preservação dos meus ouvidos (quem tem uma mãe como subchefe entende do que estou falando). Se ela “sonhar” que eu passei o final de semana em Pelotas vai encher meus ouvidos até o próximo natal e ano-novo também.

- Uh... Entrevista na rádio jovem de Porto Alegre. Uh... – Murmurei, analisando minha agenda cuidadosamente feita por Maria. – Achei digno.

Era 20h da noite quando finalmente cheguei em casa e pude me deleitar no prazer de deitar no meu sofá. Só que não me demorei muito porque quando deitei senti uma sensação estranha. Sabe quando tu sente aquele estranhamento dentro do peito, como se algo ruim está ou estivesse prestes a acontecer. Olhei meu celular por um longo tempo. Eu quero ligar para Demétri, mas ao mesmo tempo não quero.

- Deixa ele se martirizar mais um pouco por ter sido tão babaca comigo.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 06/04/2013
Reeditado em 24/01/2017
Código do texto: T4227441
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