[Original] Ela me faz - Capítulo 15

Capítulo 15 – De você

Dia seguinte...

Lucas acordou naquele domingo pós-festa com a certeza de que seria o pior dia de sua vida. Finalmente tinha entendido o motivo que fazia Rafaela correr dele, e também havia compreendido que não tinha futuro com alguém que sempre apontaria o dedo em sua cara e o culparia por tudo. Sentou-se em sua cama e respirou longamente. Precisava conversar com alguém. Discou uma sequência de números e foi atendido após 2 toques.

Foi um alívio ouvir a voz de seu irmão mais velho.

- Então tu lembraste que tem um irmão. – Lucas tentou ignorar o nó que se formou em sua garganta ao ouvir a familiar e suave voz de Lennon. Era quase como estar em sua casa no Rio Grande do Sul.

- Desculpa não ter ligado antes. – Ele murmurou, dando um risinho sem jeito. – Vamos dizer que a minha vida em São Paulo tem sido atribulada até demais... Tudo bem com você?

- Nossa, até teu jeito de falar tá parecendo o da Isabel quando veio morar em Poa. – Lennon retrucou, o que fez Lucas rir. – Bah, estou bem sim e tu?

- Na verdade não sei se estou mal. Digo, sei que estou me sentindo pra baixo, mas não é muito legal sentir isso, então finjo que to bem, mas você é meu irmão, talvez a única pessoa que realmente me entenda e...

- Última vez que conversei com uma pessoa assim ela estava amando.

-...

- Não é o teu caso... É?

- Hã. Talvez, bem talvez seja o meu caso.

- Não acredito! Tu se apaixonou pela Rafaela, não é?

- E como é que tu sabes?

- Isabel me contou da última conversa que teve com vocês via web. Tu sabes que ela pega as coisas no ar.

- Sei.

Lucas soltou um golfo de ar.

- E tá complicado?

- Eu faço merda, ela é complicada, difícil.

- O que tu fizeste?

- Teve um dia que eu falei umas bobagens dela pra uns guris lá do curso e ela ouviu. Desde aí foge de mim. E pra piorar eu ainda estou namorando uma guria que ela não gosta.

- Espera aí. O que tu disse?

- Nossa, eu não me lembro direito, mas foi algo relacionado a tê-la quando bem queria.

- Bah, Lucas. Que vacilo!

- Foi só para me crescer pros caras, juro, Lennon.

- E agora a guria não confia em tu.

- É. Não confia.

- Bom, levando em conta o fato de que tu fizeste merda, eu te aconselho o seguinte: Primeiramente, paciência. Mulher fica feliz quando admitem que ela tem razão, mesmo que nem sempre tu concordes com isso. Segundo: Ela gosta de ti também?

- Gosta. – Ele se recordou brevemente da noite anterior onde Rafaela se declarou. – Desde a época em que ela foi pra Porto Alegre.

- Como alguém pode gostar de ti por tanto tempo?

- Eu me pergunto a mesma coisa em relação a você e a Isabel, viu?

Lennon riu.

- Se tu gostas e achas que vale a pena, não desista. É um clichê dizer isso, mas acho que não há conselho melhor que esse. Pode ser só uma paixão, coisa que passa com o tempo, mas tu também só vai saber se arriscar. Amar é simples.

- Mas as mulheres complicam...

- É. Eu concordo. Estou há dois dias dormindo no sofá porque, segundo Isabel, eu a troquei por um jogo de futebol.

- E tu trocou?

- Era um GreNal!!! Tu sabes que GreNal é GreNal. – Ele exclamou, como se fosse óbvia a importância do maior clássico gaúcho futebolístico. – Mas tudo bem, Deus tá no comando.

- Bah, ela não entende a importância de um GreNal...

- Não mesmo.

- Então eu não devo desistir, mesmo Rafaela praticamente implorando por isso? Quer dizer... Não tá fácil. E a cada vez que eu penso que as coisas não podem piorar elas pioram.

- É assim com todo mundo. Digo, até por mim que já estou “casado” há um tempo. Tem hora que dá vontade de largar tudo, de não ter mulher nenhuma, mas aí tu lembras que gosta, de que precisa, de que se não ter mais sentirá falta... Sei lá. Relacionamento no geral é muito difícil.

- Eu vou tentar pela última vez.

- Bah, nem diga isso, Lucas.

- Por que?

- As palavras traem o que a gente sente.

Os irmãos conversaram por várias horas. Lucas conseguiu nas palavras de Lennon o conforto que precisava. E também tomou uma importante decisão a respeito de Rafaela.

Rafaela Marchiori

Patrícia entrou em meu antigo quarto com uma expressão tensa. Eu a olhei com o cenho franzido. Ela abriu a boca duas vezes, mas não parecia conseguir falar.

- Você está bem? – Eu perguntei, confusa.

- Sim. Lucas está aqui.

- Não abra a porta. – Respondi rapidamente. E não sei bem porque comecei a mexer no cabelo.

- Ele tá na sala conversando com a mãe.

- Por que você deixou ele entrar?

- Ele disse que era importante. – Respondeu Patrícia, dando de ombros. – E também disse que não iria embora até falar contigo.

Apesar de não estar realmente preparada para uma conversa franca com Lucas, eu sabia que seria pior se fugisse. Mais do que eu já fugi. Claro.

- Fala pra ele entrar... Por favor. – Pedi, respirando fundo enquanto ia em direção a penteadeira do quarto. Olhei-me no espelho e tive vergonha do que vi, mas também não tinha tempo para me arrumar.

Quando vi a figura de Lucas entrar no quarto tive o que parecia ser o início de uma crise respiratória. Me controlei ao máximo, mas a presença dele tinha reações inesperadas em mim. Ele me olhou de maneira séria. O que me fez ter certeza que brigaria comigo.

- Rafaela.

- Oi.

- Oi. – Ele riu, quebrando um pouco a seriedade de sua expressão. – Tu não vai pra casa?

- Vou, mas não agora. Por quê?

- Aquela casa fica silenciosa demais sem você. – Eu quase consegui sorrir, quase. Mas o ar voltou a me faltar quando ele veio em minha direção e tocou meu rosto. – Eu não vim aqui para dizer isso. Vim aqui querendo te dizer várias coisas. A principal é que eu preciso de ti como nunca precisei de guria alguma na vida. E isso me irrita. Tu não é como as outras. Tu é difícil. Maluca. Insuportável. Grossa. Braba de um jeito quase indomável. E eu estou ridiculamente apaixonado por ti, Rafaela.

Esse era o momento em que eu deveria dizer algo à altura, mas não consegui pronunciar uma só palavra.

- Tu não vai fazer nada? – Ele perguntou, ansioso.

- Vou sim.

E então eu fiz o que o meu coração pedia: Eu o beijei. Inicialmente não foi um beijo muito bom porque eu bati meu dente no dele, e então rimos.

- Ai, doeu! – Murmurei, colocando a mão sob a boca.

- Vamos de novo?

- Vamos!

Dessa vez Lucas me segurou com jeito. E devo dizer que poucas pessoas me seguram como ele me segura. Nos beijamos com aquela paixão que parecia nos ligar, manter vivo e todas as bobagens românticas que eu seria capaz de listar se não achasse horrível demais.

- Me desculpa? - Ele pediu em meio ao beijo. – Sério, eu sei que errei contigo.

- Desculpo. E você me desculpa também?

- Desculpo.

- Meu Deus, nós estamos nos desculpando aos beijos. – Observei, sem solta-lo um minuto sequer.

Caímos sob a cama. Ele ficou por cima de mim e me olhou de verdade. Não foi uma olhada simples ou vaga. Lucas me olhou como quem realmente me conhecia. E pela primeira vez eu fiquei feliz por deixar alguém me conhecer de verdade.

- Eu amo você. – Falei, após uma longa respirada. Aquelas que vem lá do fundo da gente. Ele sorriu e beijou a minha testa.

- Eu te amo.

- Sempre soube disso.

- E agora preciso saber de uma coisa.

- O que?

- Posso te pedir em namoro ou tu vais me dar outra fora?

- Hã... Não. Só que você esqueceu que está namorando a Olívia?

Lucas franziu o cenho. Depois se jogou pro lado e bateu a mão no rosto. Ele tinha esquecido do namoro com a Trentini.

- Bah, eu esqueci. Ela volta amanhã e eu resolvo isso.

- Tudo bem.

- Sério? Tu não vai brigar comigo ou gritar que me odeia?

- Teremos tempo pra isso. Agora eu quero outra coisa. – Sorri de canto.

- Ah, é? – Perguntou, sorrindo também e com muita malicia.

- Sim.

- O que tu queres?

- Uma massagem no pé. - A expressão dele murchou na hora. – Brincadeira!! Eu quero você e agora.

Nós mal voltamos a nos beijar quando Patrícia bateu na porta, abriu e deu um pigarro alto.

- Desculpe atrapalhar o clima de amor no ar, mas a mãe tá chamando você e o Lucas pra comerem.

Eu o olhei.

- Vamos comer?

- Claro.

(...)

E mais tarde, quando finalmente Lucas e eu tivemos um tempo só para nós, confidenciei a ele algumas coisas sobre mim. E o mais estranho é que ele não pediu nada disso. Eu fui contando porque tive vontade. E falei sem pressa de acabar. E ele ouviu sem interrupções.

- Então tu sempre foi assim, arisca?

- Você sabe que quando me chama de arisca eu me sinto um animal?

- Bah e porquê?

- Porque animal que é arisco.

- Não seja boba...

- Cala a boca. E respondendo a sua pergunta... É, na verdade tive que aprender a ser assim. Eu já fui como muitas garotinhas aí que você já viu. Mas teve uma determinada época, mais ou menos entre meus 16, 17 anos que eu mudei. E muito. As únicas pessoas que permaneceram ao meu lado mesmo após minhas mudanças foram Isabel e Iasmin.

- E como foi que tu conheceu Isabel?

- Iasmin que nos apresentou na época da escola. Isabel já estava quase se formando... Já faz bastante tempo.

- Gosto muito da Bel. Quase como se fosse uma irmã.

- E ela sente o mesmo por você.

- Lembra quando ela sofreu aquele acidente?

- Lembro. Você me chamou de vadia escandalosa no telefone.

Lucas arregalou os olhos e depois riu.

- Bah, mas tu gritaste tanto no telefone, mal me deixou falar.

- Eu estava nervosa! Minha melhor amiga sofre um acidente do outro lado do Brasil e eu não podia fazer nada.

- Verdade... Como o tempo passou...

- E você ficou com a Iasmin. – Franzi o cenho, relembrando aos poucos do final de ano no Sul. – Nossa... Como eu te achava detestável.

- Fiquei com ela para fazer ciúmes em ti.

- Sério?

- Sim. – Nós rimos. - Lembra que apostamos quem se apaixonaria por quem?

- Lembro. Éramos tão idiotas.

E recordarmos de várias coisas a respeito daquela época. Lucas conseguiu arrancar de mim que gostei do nosso primeiro beijo. E admitiu que eu o frustrava muito naquela época. E também admitiu que era um idiota, mas como éramos adolescentes tudo foi “perdoado”.

- Se tudo aquilo não tivesse acontecido hoje nem estaríamos aqui. – Lucas concluiu. E eu tive que concordar.

- É verdade.

- Vamos voltar pra casa?

- Você vai ficar chateado se eu voltar só amanhã?

- Bah, porque só amanhã? – Perguntou, sem esconder seu descontentamento.

- Eu quero ficar mais um pouquinho com a minha família.

- Ah, tudo bem. Família é sempre família. - Ele me deu um beijo leve. – Vou embora... Iasmin provavelmente não está em casa, mas tá na minha hora. – E agora Lucas me beijou no pescoço, e deu uma leve mordidinha em meu queixo.

- Vai pela sombra, gaúcho.

- Sempre!

Ele sorriu e eu retribui na hora. Era mesmo terrível estar apaixonada.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 14/06/2014
Reeditado em 26/06/2022
Código do texto: T4844132
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