ELE ME ODEIA - capítulo XI

Na seguinte manhã, tio Ricardo me deu uma carona até o trabalho e seguiu para o seu. Entrei na empresa na expectativa de que fosse um dia bom, ou que pelo menos não fosse tão ruim. Cumprimentei os amigos e me sentei, mas só bastou ver Dante chegar para meu corpo ser consumido por uma corrente elétrica e meus olhos brilharem como uma noite cheia de estrelas. Ele passou por mim, deixando comigo suas palavras pacíficas:

- Bom dia, Iva...

Fiquei estarrecida, nem parecia ser real! Passara do "bom dia" para o "bom dia, Iva", estava eu me perguntando por que não havia planejado nos trancar naquela sala antes. Estava eu sorrindo sozinha e vi Marcelo ir até Dante e lhe perguntar a hora, foi quando percebi que Dante estava usando o relógio dourado que lhe dei de presente de aniversário. Ou eu estava com muita sorte ou, aquele dia estava me sendo muito bom.

- Hello... Terra chamando Iva...

Dizia Paloma, vendo-me com um olhar congelado.

- Oi, Paloma.

- Que foi? Viu um passarinho verde?

- Veja, Paloma, Dante está usando o relógio que lhe dei.

- Puxa, é verdade... Será que ele se confundiu de relógio?

- E não foi só isso, ele novamente me cumprimentou ao chegar.

- Então ele deve estar doente!

Meneei negativamente a cabeça para Paloma e organizei minha mesa, em pura euforia, porquanto Dante me surpreendia.

- E então, conseguiu falar com a tal de Júlia?

Perguntou-me Paloma e eu respondi:

- Consegui, mas ela não acreditou em mim e nem sequer me deixou terminar de explicar.

- Acho que você está fazendo papel de boba, Iva. Onde já se viu? Entregar o amor de sua vida nas mãos de quem nem mais quer saber dele.

- Paloma, eles se amam!

- E quanto ao que você sente por Dante? Não conta? Pensa bem, Iva... Você está querendo ser boa mas estão é te fazendo de burra.

Fiquei pensativa. Paloma poderia ser meio maluca e suas idéias não eram lá as melhores, mas também poderia ser que em alguma parte ela tivesse razão, mas, em qual?

Enquanto eu esperava o táxi para voltar para casa, Dante estava entrando em seu carro e vinha se aproximando de mim um homem com um casaco preto de toca na cabeça e com as mãos no bolso, também usava umas correntes de prata no pescoço e andava de cabeça baixa. Antes que ele chegasse perto de mim, Dante me chamou, dizendo:

- Iva! Vem, te dou uma carona para casa!

Fui até o carro de Dante e, fitando-o com dúvida, perguntei:

- Você quer... Me dar uma... Carona?

- Entra logo!

Ele abriu a porta de frente do carro e eu entrei, no que ele disse:

- Eu estava estranhando aquele cara que se aproximava de você, não parecia ser gente boa...

- Também pensei isso.

- Onde fica sua casa?

- Há uns seis quarteirões daqui.

Dante subiu o vidro da janela do carro, porque estava começando a chover e ligou o para-brisas. Às vezes, eu olhava para o rosto dele, disfarçadamente, e notava como era lindo de perfil e seus olhos me atraíam por demais. Uma vez ele percebeu que eu o observava e limpou a garganta, e disse:

- A previsão é de muita chuva durante toda a noite.

E eu falei:

- Na última vez que disseram isso, Noé construiu a arca.

Dante olhou para mim e deu uma pequena risada, voltando seus olhos para as ruas que já iam ficando escuras, mas as luzes dos postes e das praças iam se acendendo. Acompanhando os pingos de chuva que deslizavam na janela do meu lado, eu disse:

- Estive pensando em pedir aumento ao chefe.

- E por que não pede?

- Humm... Sei lá, algo me diz que ele não vai permitir que eu suba para a presidência da empresa.

Dante meneou a cabeça e sorriu. E passados alguns segundos, ele disse:

- Você é engraçada.

E, impressionada, eu perguntei:

- Sou?

Dante virou o rosto para mim e me olhou por um instante, depois continuou atento na direção do carro e me perguntou:

- Você quer me beijar?

Nesse momento senti aquela sensação estranha de como quando você acha que escutou errado, mas bem sabe o que escutou. Então perguntei, em timidez:

- O-o que você... Disse?

Dante sorriu de lado e falou:

- Estou brincando com você.

Relaxei no banco e recuperei a respiração, até que chegamos de frente à minha casa e Dante parou o carro.

- Está entregue.

- Obrigada pela carona. Ah, eu me esqueci de te dizer uma coisa...

- O quê?

- Ontem eu falei por telefone com Júlia.

- Você fez o quê?

- Eu te disse que ia tentar!

- E por acaso você acha que Júlia vai querer te escutar, se ela não dá nem ouvidos à mim!?

- Bom...

- Afinal, o que foi que ela disse?

- Ela... Pensou que estívessemos noivos...

- Disso eu já sei, mas obrigado por me lembrar! E, que mais?

- Não conversamos muita coisa, porque ela não quis mais me ouvir...

- Foi o que eu disse. Por acaso você acha que eu já não tentei explicá-la? Sim, muitas vezes! Mas é inútil...

- Eu só quero tentar...

Dante me fitou com um olhar desesperançoso e ligou o carro, no que eu saí e falei:

- Até amanhã.

E num tom frio, ele disse:

- Até.

Corri da chuva até a porta de casa e bati. Meu tio abriu a porta, todo aconchegante com um casaco grosso e vestindo meias com as sandálias.

- Nossa, Iva, você está ensopada!

- Por que de-demorou tan-tanto para abrir?

- Eu estava cochilando.

Entrei a tremer e com os lábios tilintando. Tio Ricardo me trouxe uma toalha e me sequei, ele também me ofereceu um pouco de seu chocolate quente e depois de beber um gole, perguntei:

- Não foi trabalhar?

- Me dispensaram.

- Por quê?

- Sequestraram a sra. Michelle.

- Sequestraram? Mas o senhor não deveria estar a protegendo?

Ele começou a caminhar de um lado para o outro, com um olhar aflito, a explicar:

- Eu só deixei ela sozinha por um instante na beira da piscina e fui ao banheiro e, quando voltei, o mordomo cor de rosa estava gritando: "help! Help! Moço, rápido, sequestraram a sra. Michelle! Oh, my God!" mas resolveram chamar a polícia, então reclamaram que eu fui um inresponsável e tal...

Eu ria de como o tio Ricardo se expressava ao descrever a cena e como imitava os gritos do mordomo. Depois fui tomar um banho, ou melhor dizendo, outro banho e deci para o jantar. Quando terminamos de comer, lembrei-me de tentar falar mais uma vez com Júlia, porém, eu precisava de algo que me ajudasse a facilitar o problema e imaginei que tio Ricardo me pudesse ajudar. Então o perguntei:

- Tio, o que o senhor faria se tivesse que convencer alguém de que tudo foi um mal entendido?

- Depende de quem seja esse alguém e de que mal entendido você esteja falando.

- É que uma amiga minha, sem querer, acabou causando impressões erradas à namorada, ex namorada... Sei lá... De um cara que ela gosta, no que agora a namorada, ex, dele pensa que minha amiga e o cara estão namorando, mas na verdade não estão! E agora minha amiga precisa convencer a ex, ou namorada, do cara a voltar para ele.

- Humm...

- Entendeu?

- Hããã... Não.

- Então, mudando a pergunta, o que o senhor faria para recontistar o amor de uma mulher?

- Bem, eu nunca precisei me preocupar com esses tipos de coisa, todas sempre foram loucas por mim, hehe... Mas, que tal uma prova de amor?

- Prova de amor? Tipo... Se jogar na frente do carro dela ou pular de um avião, segurando um enorme cartaz escrito "te amo, demais! Por favor, me perdoa" sem o paraquedas?

- Não é bem isso. Falo de algo romântico, algo que toque o coração da moça, algo que prove que o infeliz tem a melhor das intenções.

- Entendo... E o que me sugere?

- uma serenata? Bom, é melhor do que o cartaz.

Eu não conseguia imaginar Dante fazendo uma serenata, mas talvez não fosse uma má idéia.

Continua...

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 01/11/2015
Reeditado em 03/11/2015
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