Capítulo 7 – Virando amigos

A relação com Gabriela fluiu com facilidade. Ela não tinha pretensão de namoro ou algo parecido, era só sexo casual e não tinha problema algum nisso. No dia que fui até seu apartamento depois de brigar com Lana, tive compreensão e empatia. Gabriela me contou, inclusive, que já tinha passado algo similar, mas a diferença é que não tinha tanto orgulho envolvido. Somente a vida parecia não cooperar para que ela ficasse junto com a pessoa que amava.

Gabriela era uma mulher forte, sincera e bastante determinada sobre o que queria ou não da vida e também das pessoas. Quando estávamos na cozinha de minha casa fazendo lanches para assistirmos a um filme, me perguntei mentalmente por que não podia me apaixonar por uma mulher assim. Fui acordado dos meus pensamentos ao ouvir a campainha tocando.

- Já volto! – Avisei, tomando caminho até a porta. Abri tão rapidamente que esqueci que a visita poderia ser alguém que adora causar um impacto, como por exemplo, Lana Hassenback. Ela deu um meio sorriso. – Lana?

Encostei a porta, evitando que Gabriela pudesse ver quem era.

- Oi, Ander. Podemos conversar?

- Lana... Eu estou com visita. - E para tornar aquela situação ainda mais constrangedora, Gabriela surgiu do meu lado, vestindo apenas uma camiseta minha. – Lana, essa é a Gabriela, minha colega de trabalho. Gabi, essa é a Lana. – As duas trocaram um solene aperto de mãos.

- Prazer em conhecer você, Lana! – Gabriela sorriu, simpática, mas analisando a outra com bastante atenção.

- Oi, prazer!

– Eu vou voltar para a cozinha.

Lana acompanhou Gabriela com o olhar, mas logo seus olhos encontraram os meus. Não era muito fácil ler as suas expressões, mas ela parecia um tanto quanto surpresa e meio desconfortável.

- Desculpe, não imaginei que estava com visita.

- Sem problemas!

- Eu vim te convidar para irmos a um bar assistir nossos times jogarem, mas se você não puder, eu entendo e...

- Eu topo.

- Mesmo?

- Sim. Acho que vai ser legal.

- É, vai sim! – Ela sorriu sincera, e feliz com a minha resposta. – Eu te mando a localização do bar por celular.

- Fico aguardando.

Lana foi embora, parecendo meio desajeitada por ter me encontrado com outra mulher. Talvez ela só esteja surpresa por ver que meu mundo não gira ao redor dela, não sei. Eu não quero pensar nisso agora.

Voltei para a cozinha e encontrei Gabi fazendo café. Ela me olhou com um significativo sorriso de canto.

- A garota é muito bonita, muito bonita mesmo. – Comentou, me passando uma caneca com café. – E aí?

- Ela me chamou para ir a um bar. Acho que quer conversar comigo. É meio difícil entender.

- Entender o que?

- A Lana. – Gabriela assentiu, estudando minhas expressões. – Mas deixa pra lá! Eu estou feliz por estar aqui com você.

Passamos o dia juntos foi totalmente confortável em estar com ela. Não falamos sobre Lana, somente sobre nós dois e o que almejávamos da vida. Por um momento tive vontade de não deixar aquilo acabar, mas bastou Gabriela precisar ir embora que fui acometido por um tipo de ansiedade enquanto lia a mensagem de Lana no meu celular informando o endereço do bar Severino & Chiquinha.

(...)

Sentado no banco da estação do metrô, vi quando Lana saltou do vagão recém estacionado na plataforma. Como o tempo havia mudado, ela vestia uma calça jeans preta, camiseta branca, jaqueta preta e os cabelos amarrados num rabo de cavalo. Ela sorriu para mim e eu sorri de volta, de modo involuntário. Meu Deus, como sou idiota. Eu nem queria sorrir. Simplesmente aconteceu e o pior, por ela estar ali.

- Ei!

- Oi, Lana!

- Vamos?

- Vamos!

A ida ao bar foi cheia de situações meio desagradáveis. Eu tive que criar um lembrete mental que não tínhamos nada e não tinha o menor sentido o incomodo constante que tive ao ver os olhares que ela recebia por simplesmente existir. Pedimos cervejas e alguns petiscos e nos acomodamos numa mesa no meio. O bar estava lotado e o clássico começava com fortes emoções.

No primeiro tempo só deu Flamengo, mas não era muito eficiente, o que deu espaço para o alvinegro paulista se soltar no jogo. Numa jogada de quase gol Lana soltou um imenso palavrão, me fazendo rir alto. No fim do primeiro tempo o maldito Corinthians acabou se aproveitando da preguiça da minha zaga e marcou o primeiro gol. A paulista exibida e orgulhosa fez uma dancinha da vitória e comemorou abraçando um estranho. Bem, o futebol tem dessas coisas. – Pensei, vendo-a me provocar com expressões do tipo “olha como é óbvio o que acontece diante dessa tela”.

No intervalo nos sentamos um lado do outro, meio que abraçados, meio que um tanto altos por causa da cerveja.

- Isso é bom. – Ela falou, de repente. – Digo, é bom estar com você. Você, o Coringão... E o Flamengo perdendo. – Eu belisquei sua cintura, fazendo-a rir. – Poderia ser sempre assim, fácil. – E seus olhos encontraram os meus. Lana tocou o meu rosto e se ajeitou na cadeira, quase me beijando. – Ander.

- Oi, Lana.

Sua testa encostou na minha e as respirações cheias de expectativas viraram uma coisa só.

- Eu quero muito, mas muito mesmo... – Sussurrou, me abraçando.

- O que? – Fechei os olhos, meio que entregue a sedução dela.

- Cerveja.

Franzi o cenho, ainda de olhos fechados. Quando os abri, Lana me olhava com um sorriso maroto no rosto. Eu não acredito que caí nesse golpe.

- Cerveja? – Perguntei, zonzo. Ela assentiu. – Certo. Cerveja... Vou pegar...

E assim começamos o segundo tempo.

No fim, o alvinegro paulista venceu o jogo, eu e os torcedores do Flamengo presentes no bar tivemos que aceitar a zoação dos rivais. Quando voltei do banheiro, encontrei Lana conversando com um torcedor do Flamengo. Os dois riam e pareciam estranhamente à vontade. Tentei e com muito esforço não sentir ciúme daquilo e falhei.

Me aproximei dos dois, sem jeito e toquei o ombro de Lana.

- Ei, vamos? – Ela se levantou, ficando ao meu lado. – Lucas, foi um prazer imenso te conhecer, viu? – Disse, simpática. Na mesma hora um outro rapaz surgiu. – Digo o mesmo para você, Pedro! Vocês são lindos! – E os dois trocaram um selinho.

Estou me sentindo um imbecil? Sim, estou.

- Vocês também!

Lana me olhou de lado, mas com um sorriso todo encantador.

- O que foi? - Ela segurou a minha mão e seguimos rumo a saída do bar. – Está triste pela derrota do urubu?

- Ah, estava meio que previsto. – Dei de ombros, reflexivo. – Infelizmente, conheço o meu time bem demais.

- Nossa aquela jogada do segundo gol foi linda! – Exclamou, empolgada. – Meu Deus, que jogo!

Eu não sentia muita vontade de falar, mas era gostoso ouvir a voz melodiosa e empolgada de Lana. Era um tom meio suave, doce, parecia uma música daquelas que você podia ouvir sem cansar. Aquilo tudo poderia ser normal se eu me esforçasse para tornar normal. O grande problema é que não tenho ideia de como anular o amor para ser apenas o amigo.

- Ah, não! – Ela exclamou, quando passamos pela catraca do metrô. – Eu conheço essa sua cara, Ander. É a cara que você faz quando não está me ouvindo!

- Foi mal.

- O que foi? – Lana me encostou na parede, ao lado dos bancos da plataforma do metrô. – Eu fiz algo agora?

- Não, claro que não.

- Ah, sei lá! – De repente deitou a cabeça no meu peito e entrelaçou os nossos dedos. – Hoje foi muito bom. Por um momento nem parecíamos nós.

- Estou tentando me acostumar com isso.

- Com a nossa amizade? – Perguntou, me olhando agora preocupada. – Por que? Eu acho que nós podemos ser amigos.

- Sim, podemos ser amigos, mas ainda é um pouco estranho.

- Ander... – Ela tentou se afastar, mas a puxei de volta para os meus braços. – Eu te coloquei numa situação extremamente difícil e não sei como sair disso, mas não consigo ficar longe de você. - Sua declaração me surpreendeu, mas resolvi não a interromper. – Eu vou me casar e você sabe, eu sei... Só que... – Ela respirou fundo e me olhou. – Com você é tudo tão simples. É tudo tão... Nosso. Estar contigo é...

- É...?

- É como estar num lugar seguro depois de um dia muito difícil e cansativo. Eu sentia isso quando falávamos à distância e me sinto da mesma forma desde que te vi no Rio de Janeiro pela primeira vez. Podemos mesmo ser amigos, Ander?

- Sim, podemos.

Eu a abracei apertado e dei um beijo em seu rosto. Lana colocou uma mão livre em meu rosto e a outra em minha cintura.

- Você nunca tinha falado dessa forma. – Brinquei, fazendo-a rir. – Posso ficar surpreso, não é?

- Nós temos vários problemas, e um deles com certeza é você se apegar muito a palavras e não a atitudes.

- Você sabe que pode me confundir em ambos os lados, Lana.

- É, eu sei. – Ela balançou a cabeça, assentindo. – Não quero você longe da minha vida, Ander. O meu lado egoísta parece ter um tipo de obsessão por você, e acho que você disso. Bem, mas também um direito seu não querer ficar ao meu lado com as minhas “regras”.

Eu puxei sua mão, entrelaçando nossos dedos. Ela sorriu, olhando nossos dedos se unirem numa coisa só. Era bom sentir o toque dela no meu. Ela sempre me tinha muito fácil.

- Acho que isso diz tudo, não é? – Perguntei. A cena inevitavelmente romântica – à lá Lana e Ander – foi interrompida por seu celular.

Ela tirou o celular da bolsa com a mão livre e ao visualizar a tela, sua expressão tornou-se nervosa.

Como eu já sabia quem era, soltei a sua mão e a deixei se afastar.

- Oi amor! Vim num bar com um amigo... Você está em casa? Certo, assim que eu chegar, te mando mensagem. Estou morrendo de saudades também!

A última frase foi dita me olhando com aquele olhar misterioso e profundo, tipicamente Lana Hassenback de ser.

- E aí, parça, “vambora”?

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 22/11/2020
Reeditado em 18/01/2024
Código do texto: T7118237
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