PONTO DE INTERROGAÇÃO

Nós dois já seguimos nossos próprios caminhos. Criamos histórias e viramos a página. Mas eu confesso que às vezes me pego lendo a página do dia em que lhe conheci. Foi um dia inesquecível, mesmo que não pareça. Foi especial para minha antiga eu, pequena, frágil e sem saber do que o mundo e as pessoas eram capazes de fazer. E eu aprendi muito cedo sobre a maldade das pessoas a minha volta.

É triste crescer quando a inocência que antes te fazia formar desenho nas nuvens vai desaparecendo até chegar o dia em que estás andando sozinha na rua e escuta-se passos atrás de você. Neste momento você deseja do fundo do seu coração que o máximo que possa acontecer é um assalto e nada mais.

O medo de ser mulher às vezes domina e sempre me vem à cabeça um sinal de alerta até ao mínimo movimento. Estou sempre carregando pontos de interrogação nas linhas do meu livro, desejando que eu consiga sobreviver à descoberta da existência de pessoas tão cruéis.

Lembro do dia em que parei de te ver como um pai e percebi que você era pior do que os monstros que moravam debaixo de minha cama. Indefesa e frágil, eu confiava em você, mas é como dizem: não devemos confiar em praticamente ninguém.

Você ativou pontos de interrogação por todo o meu corpo e alma e somente o céu sabe o quão miserável eu me senti por tantos anos. Eu me senti assim por muito tempo, até conhecer uma pessoa que me amou de verdade e que eu amei também, que me ensinou diversas coisas sem precisar falar muito e foi então que eu percebi que nem todo mundo é tão ruim assim. Que nem todo mundo só quer o que está debaixo das minhas roupas, mas sim, o que está dentro do meu coração.

Os pontos de interrogação não sumiram, mas agora eu sei diferenciar os momentos em que devo por ele em prática, afinal, nem todo mundo é um ponto de interrogação. A todos que me fizeram querer por um ponto final eu desculpo, mas esquecer será difícil, pois um depois de arrancado um prego pregado para sempre será marcado. Aos que me deram uma vírgula, agradeço. Talvez eu estivesse precisando somente de uma pausa memo.

Obrigada por serem empáticos e cuidarem de mim, no fim das contas, uma página nunca vai ser o suficiente para todas as virgulas, exclamações, reticências, parênteses ou aspas. Não esperem de mim um ponto final, porque a vida só para quando a gente parar. Mas antes, não me peçam que eu deixe de usar em minhas mal traçadas linhas, um ponto de interrogação.

Julia Gabriely Wesolosky Sattler
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 28/11/2022
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