A Caixa Curiosa

Era tarde, madrugada de segunda-feira, todo o apartamento estava fechado, exceto por uma janela próxima a cama. Uma pequena fresta deixava a singela brisa noturna entrar, fazendo com que a cortina leve de cetim balançasse suavemente. A luz da Lua cheia também tentava invadir o quarto, mas de tão tímida nem chegava até a cama.

Seus olhos começaram a se abrir, lentamente sentou sobre o colchão e esfregou os mesmos. Meio sonolento virou para o relógio, ainda era muito cedo para se arrumar para o trabalho. Resolve tomar um grande copo d’água antes de voltar a dormir, despreocupado pega suas sandálias em baixo da cama e começa a caminhar para a cozinha quando ouve um barulhinho vindo de algum canto do quarto. Ele pára, e novamente o som, era como um sussurro, incompreensível, mas com certeza um sussurro.

Curioso procura a fonte do som, porém não consegue enxergar muito mais que a silhueta de sua cama e a cortina dançando ao luar. Seus dedos procuram com confiança o interruptor, o liga, mas a luz não responde a ordem, o quarto continuava tão escuro quanto antes.

- Que coisa... – Fala chateado enquanto fita a lâmpada apagada no teto.

Mais uma vez o sussurro chega aos seus ouvidos, dessa vez o homem estava atento, e tinha absoluta certeza que o som vinha de algum lugar de seu quarto, quanto a isso não havia dúvida, no entanto a novidade era no tom do sussurro, um timbre que lembrava vagamente uma voz feminina.

Ele sai de seu quarto em busca de uma nova lâmpada ou quem sabe da lanterna de emergência que nunca estava no lugar em que se lembrava. Uma banqueta é pega na pequena cozinha e a lâmpada do corredor é rapidamente removida e colocado no quarto, no lugar da queimada. Novamente vai ao interruptor mais confiante do que nunca, tudo deveria funcionar perfeitamente, mas a teimosa escuridão persistia. “Deve ser algum problema na fiação do quarto...” pensa o homem desconsolado enquanto olha para a lâmpada no teto.

Sem a luz a única opção que lhe vem à mente é confiar em sua audição. Com calma ele se posiciona no meio do cômodo e espera, e espera...

Conseguia ouvir cada ruído, cada rangido produzido no seu quarto e em poucas vezes no apartamento de baixo, mas nada do sussurro, até que, quando já estava perto de desistir ele surgiu. Um pouco mais longo, um pouco mais alto do que das outras vezes que o homem se lembrava, mas, no entanto inconfundível. Vinha de algum lugar próximo ao chão. Para melhor escutá-lo encostou seu ouvido no carpete e esperou novamente.

Dessa vez o som veio com menos demora, parecia surgir de trás de sua pequena cômoda próxima a porta, com rapidez se pôs de pé e começou a afastar o simples móvel da parede. Em muito menos de um minuto tudo que a pequena cômoda escondia fora revelado, não passava de alguns insetos e muita poeira...

Algo estava errado, ele podia jurar que o som vinha dali! Enquanto observava sua decepção em forma de poeira, sente algo lhe tocar o ombro, no momento em que vira seu rosto para ver o que era ouve mais uma vez o sussurro zombar de sua desgraça. Dessa vez o som vinha de algum lugar próximo a cama. Irritado começa a procurar por todos os cantos, seus lençóis são jogados no chão com desprezo, assim como seu colchão, mas não havia nada ali.

Agora conseguia ouvir o sussurro quase como um zumbido preso em sua cabeça. Desesperado para encontrar a fonte começa a vasculhar todo o quarto, roupas são jogadas fora do armário, as gavetas de uma pequena estante seguem o mesmo destino, e, acabam por fim entulhadas em um canto do corredor.

Não havia nenhum lugar do pequeno quarto, do pequeno apartamento que não havia sido investigado por sua insana curiosidade, e de nenhum lugar vinha o sussurro.

Aqui... Aqui... Olhe aqui... Olhe aqui...

O homem pára novamente, por um momento o sussurro incompreensível havia se tornado em uma voz etéria, e lhe dizia para olhar, olhar aqui, mas aqui onde? “Aqui onde?” Se perguntou desesperado, e logo veio a resposta.

A camaaa... Perto da camaaa...

Olhou sedento para a direção de onde vinha o leve balbucio que começava a fazê-lo perder o controle. O som saía de um corte mínimo que havia surgido no carpete próximo à cama, tão pequeno e sutil que não teria sido notado de outra maneira. Sem pensar duas vezes cravou suas unhas na pequena brecha do carpete e o puxou com toda a força que pôde.

Depois de quase uma hora suas mãos estavam completamente ensangüentadas. A cama havia sido colocada entre o corredor e a porta e todo o carpete que ela cobria agora jazia despedaçado entre algumas gavetas e roupas.

O homem em sua desesperada curiosidade não havia notado o que suas mãos machucadas haviam libertado. Onde antes havia carpete e agora deveria haver apenas cimento não passava de um monte de terra, preta como argila. Não se importando com as feridas ele começou a cavar espalhando terra por todo quarto. Quanto mais fundo ia, mais forte a voz em sua cabeça se tornava.

Isso... Isso...! Você está perto... Per...To...

E a voz pára, some de sua mente do mesmo modo que havia surgido. Sem o som em sua cabeça ele volta a si, não sabia onde estava, tudo em volta parecia levemente diferente e pouco familar, só via lama por todos os lados e em suas mãos um estranho objeto, uma pequena caixa.

Obviamente ela estava enterrada na lama em que se encontrava ajoelhado, mas diferente do homem a caixa brilhava. Toda feita de cristal, o homem sentia com as mãos que nela havia muito mais detalhes do que era capaz de ver.

Alguns dias depois quando entraram lá não encontraram nada além de um apartamento revirado, suspeitaram de assalto e muitas outras coisas. Nem eu sei o que aconteceu depois, mas eu sei quem sabe, sim, eu sei quem sabe.

Você sabe o que aconteceu, não sabe?